Opinião

Agrotóxicos recorde

‘Trata-se de, em parte menor, necessidade real, e de outra, costume entranhado por acomodação na agricultura brasileira’, escreve Rui Daher

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Não é de hoje que o Brasil é a alegria das multinacionais fabricantes de agrotóxicos. São herbicidas e defensivos inseticidas, fungicidas, bactericidas, acaricidas.

Trata-se de, em parte menor, necessidade real, e de outra, costume entranhado por acomodação na agricultura brasileira. Pior, são moléculas e produtos químicos dolarizados e de altos custos, que só permitem boa rentabilidade quando as commodities agrícolas estão em patamares elevados e o câmbio favorável às exportações. Em muitas culturas voltadas ao mercado interno, acabam inviabilizando os produtores rurais, sobretudo os que pertencem à agricultura familiar.

Somos campeões mundiais de compras e consumo de pesticidas. Mais de US$ 10 bilhões. Disto, muitos aqui se orgulham. Apesar de fortes em vários itens de exportação, com altas produções e produtividades, ainda não temos a hegemonia da produção agrícola mundial, o que torna desproporcional o consumo de agrotóxicos diante de nossa produção.

No início de dezembro de 2020, a Anvisa, subordinada ao ministério da Saúde, e barreira interposta pelo governo federal na tarefa de retardar o uso de vacinas imunizantes para Covid-19, publicou no Diário Oficial decisão que mantém o uso do glifosato na agricultura. Desde 2008, os técnicos do órgão reavaliavam seu uso. Em março de 2019, com toda a certeza que Deus lhes deu, mas a ciência não, publicaram parecer assim: “a substância não apresenta características mutagênicas e carcinogênicas”.

Torçamos, mas não é exatamente o que constata a Organização Mundial de Saúde e os numerosos processos que sofreu a norte-americana Monsanto, hoje herdados pela alemã Bayer, quanto ao desenvolvimento de câncer.

Ao aprovar o uso do glifosato, a Anvisa se escuda no fato de estar impondo certas restrições. Quais? Para reduzir em 50% a deriva (invasões em outras lavouras), doses acima de 1,8 mil gramas por hectare, assim como recomenda margem de segurança de cinco metros em plantações perto de distritos, casas e escolas.

Uma pergunta: como será feita a fiscalização se essas restrições serão cumpridas?

Fato é que no ano passado foram liberados registros para 493 pesticidas. Número mais alto da série histórica, e que vem crescendo desde 2016, por não estranho que possa parecer. Por óbvio, o ministério da Agricultura coonesta as decisões da Anvisa para o glifosato, o agrotóxico mais vendido no planeta.

Como esta não é a primeira vez que trato do tema, conheço a reação mais frequente: “Sem o uso de agrotóxicos seria impossível obter produtividade e atender a necessidade de alimentar a população mundial”.

Primeiro que não atendem, por distribuição precária e desigual. Basta pesquisar dados da FAO, Organização das Nações Unidas para a Alimentação e para a Agricultura.

Depois, a diminuição das aplicações de agroquímicos, quando combinadas com tecnologias naturais e orgânicas, aumenta a produtividade das lavouras.

De forma nenhuma defendo aqui a completa extinção dos agroquímicos das lavouras brasileiras, mas sim a redução de suas doses, perfeitamente doadoras de produtividade e saúde ambiental e humana, quando combinadas com tecnologias menos agressivas. Para quem toma como decisão pessoal se alimentar de forma mais saudável, completamente isenta de agroquímicos, há grande crescimento da agricultura orgânica.

Na próxima semana, volto ao assunto, com tecnologias alternativas comprovadamente eficazes.

Inté.

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