Paulo Artaxo

Cientistas e pesquisador do Centro de Estudos Amazônia Sustentável da USP.

Opinião

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Agenda prioritária

Os debates da COP30 devem concentrar-se em cinco pontos essenciais. Convém estar atento a eles para avaliar, depois, se houve ou não avanços

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O presidente Lula e o governador Pará Helder Barbalho em um evento preparatório para a COP30, em Belém. Foto: Ricardo Stuckert/PR
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Chegamos a novembro. Belém faz os últimos preparativos para sediar a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. Antes da abertura dos trabalhos, é oportuno destacar os temas prioritários que devem constar no documento final e orientar as resoluções da COP30. Espero que as discussões se concentrem em cinco eixos essenciais: 1. Promover uma transição justa e acelerada dos combustíveis fósseis para fontes de energia sustentáveis, estruturando economias de baixo carbono em escala global. 2. Erradicar o desmatamento das florestas tropicais até 2030 e fortalecer mecanismos de preservação. 3. Ampliar o financiamento climático, garantindo que os países em desenvolvimento possam realizar suas transições energéticas. 4. Implementar políticas sociais e econômicas de adaptação às novas condições climáticas em todas as nações. 5. Reafirmar o multilateralismo, pois somente com sólida cooperação internacional será possível enfrentar esse desafio.

Cada ator tende a concentrar seus esforços em um desses pontos. No caso do Brasil, o combate ao desmatamento e a preservação das florestas certamente estarão entre as prioridades. As nações europeias, pressionadas pela crise financeira decorrente do aumento dos gastos em defesa, buscam afastar-se ao máximo do tema do financiamento climático, já que serão cobradas pelos países em desenvolvimento. Os produtores de petróleo, por sua vez, devem tentar obstruir as discussões sobre o fim da exploração e do uso de combustíveis fósseis. Por isso, a tarefa que temos diante de nós não é apenas difícil, mas quase uma missão impossível.

Vivemos um momento singular na luta contra as mudanças climáticas. Observam-se avanços notáveis na produção de energias renováveis, na eletrificação do setor de transportes e na redução do desmatamento em escala global. O custo da geração de energia solar e eólica já é, em muitos casos, inferior ao da queima de combustíveis fósseis, o que impulsiona uma transição energética em ritmo sem precedentes. Também se verifica uma desaceleração nas emissões de gases de efeito estufa, com tendência à estabilização nos próximos cinco a dez anos. Países como China e Índia crescem a taxas superiores ao aumento de suas emissões, evidenciando um progressivo desacoplamento entre o PIB e os gases de efeito estufa.

No entanto, as novas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) ainda projetam um aumento médio global de temperatura de em torno de 2,7 °C, muito distante da meta do Acordo de Paris de limitar o aquecimento a 1,5 °C até o fim deste século. Esse cenário pode levar o Brasil a enfrentar um aquecimento entre 3,5°C e 4°C, acompanhado de queda significativa na precipitação. As consequências seriam graves: redução da produtividade agrícola, forte degradação florestal na Amazônia e risco de o Nordeste brasileiro tornar-se uma região árida. Além disso, eventos climáticos extremos tendem a intensificar-se e ocorrer com maior frequência, enquanto os 8,5 mil quilômetros de costa do País deverão sofrer com a elevação do nível do mar – um desfecho que precisamos evitar a qualquer custo.

A principal tarefa da COP30 é inequívoca: pôr fim à exploração e ao uso de combustíveis fósseis e voltar-se para as fontes de energia do futuro, de baixas emissões de gases de efeito estufa. O Brasil, com seu vasto potencial de geração eólica e solar, tem uma oportunidade única de se tornar uma potência energética, combinando baixo custo e sustentabilidade. O País pode liderar essa transição. Os cinco pontos elencados no início deste artigo sintetizam as questões centrais que devem ser enfrentadas com urgência, respeitando as particularidades de cada nação.

É alentador constatar que o Acordo de Paris continua sendo uma realidade. Ele não apenas se mostra viável do pon­to de vista técnico, como também eco­no­mi­ca­men­te exequível. As tec­no­lo­gias necessárias para des­car­bo­nizar a maior parte dos setores eco­nô­micos já existem, estão consolidadas e, em muitos casos, mostram-se com­pe­titivas em termos de custo.

A crise climática é um sinal de que a humanidade atravessa uma nova transição, assim como em outros momentos decisivos da história, a exemplo do fim do Feudalismo, da Revolução Industrial e das duas guerras mundiais. É evidente que estamos ingressando em outra etapa, agora rumo a um mundo orientado pelos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), mais justo e resiliente. As próximas décadas não serão fáceis, mas não há alternativa: o modelo econômico atual é insustentável, mesmo a curto prazo. Cabe a nós trabalharmos pela edificação dessa nova sociedade, começando de forma decisiva na COP30. •

Publicado na edição n° 1386 de CartaCapital, em 05 de novembro de 2025.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Agenda prioritária’

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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