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A volta das férias de William Waack e o Racismo Estrutural

Retorno de Waack à TV está como um retorno das férias no país que precisa muito discutir racismo estrutural

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No livro “Racismo Estrutural” (editora Pólen), o filósofo, professor e advogado Silvio Luiz de Almeida explica como a chave para compreender o racismo se encontra não na esfera da moral, mas em seu caráter sistêmico. O ato discriminatório, assim, não representa apenas uma prática discriminatória aleatória fruto da individualidade de quem o cometeu, mas o resultado de um processo no qual as condições de subalternidade e privilégio se reproduzem histórica e cotidianamente na esfera da política, da economia e das relações do dia-a-dia. Identificar as estruturas que sustentam esse sistema, ensina Almeida, é o que torna possível enxergar a atmosfera que naturaliza o racismo ao ponto de sermos unânimes em concordar que vivemos em uma sociedade racista mas, ao mesmo tempo, resistirmos em reconhecer que somos sim potenciais vetores do racismo ao qual dizemos combater.

Em 2017, o jornalista William Waack foi demitido da Globo após ter sido flagrado ao vivo fazendo um comentário discriminatório quando acreditava que a câmera estava desligada. “É coisa de preto”, disse ele ao seu interlocutor depois de se queixar de uma buzina que atrapalhava a transmissão. Em resposta à repercussão negativa, o apresentador seguiu o roteiro e respondeu que “existe racismo no Brasil, mas não sou racista”.

Hoje, Waack se tornou âncora da CNN Brasil, recém-criada filial do gigante canal norte-americano.

Seus novos empregadores certamente sabiam do flagra em que fora pego há pouco mais de dois anos. Desta vez, no entanto, o âncora se viu livre do repúdio que naquela época ajudou a deixá-lo desempregado (o que nos leva a ter alguma ideia de qual será a linha editorial da CNN Brasil). O fato dos motivos de sua demissão não terem gerado incômodo ao ponto de, em tão pouco tempo, ser recebido de braços abertos em um novo emprego comprova o traço estrutural do racismo de que trata Almeida em sua obra.

A verdade é que a contratação de Waack foi um retorno das férias. Da mesma forma que o jornalista Gustavo Negreiros – também demitido após vociferar misoginias na rádio ao dizer que o problema de Greta Thunberg era falta de sexo – foi readmitido tão logo as reações enérgicas aos seus destemperos se diluíram e a poeira abaixou. Para seus patrões, o problema de suas declarações foi o mesmo de Roberto Alvim e sua imitação de Goebbels: a indiscrição.

É certo que no mesmo pacote em que está o racismo de Waack estão o lavajatismo de Moro (o próprio jornalista integra a linha de frente da imprensa chapa-branca lavajatista), o neoliberalismo de Paulo Guedes, a homofobia de Bolsonaro (cuja eleição foi considerada por Waack uma “profunda transformação positiva”), o fundamentalismo de Damares e, sobretudo, o terraplanismo onipresente em todo o elenco ministerial. Todos passageiros do Uber bolsonarista, coluna onde inevitavelmente converge a agenda reacionária e obscurantista que hoje ocupa o Palácio do Planalto.

Por isso a condescendência da CNN Brasil com Waack é um bom indicativo de onde se deve estar se há de fato o comprometimento em enfrentar o racismo e o balaio de valores que traz consigo. É ingenuidade achar que há meio termo nesse enfrentamento. “Numa sociedade racista não basta não ser racista. É necessário ser anti-racista”, ensina Angela Davis. O resto é passação de pano típica do bolsonarismo envergonhado.

No livro “Racismo Estrutural” (editora Pólen), o filósofo, professor e advogado Silvio Luiz de Almeida explica como a chave para compreender o racismo se encontra não na esfera da moral, mas em seu caráter sistêmico. O ato discriminatório, assim, não representa apenas uma prática discriminatória aleatória fruto da individualidade de quem o cometeu, mas o resultado de um processo no qual as condições de subalternidade e privilégio se reproduzem histórica e cotidianamente na esfera da política, da economia e das relações do dia-a-dia. Identificar as estruturas que sustentam esse sistema, ensina Almeida, é o que torna possível enxergar a atmosfera que naturaliza o racismo ao ponto de sermos unânimes em concordar que vivemos em uma sociedade racista mas, ao mesmo tempo, resistirmos em reconhecer que somos sim potenciais vetores do racismo ao qual dizemos combater.

Em 2017, o jornalista William Waack foi demitido da Globo após ter sido flagrado ao vivo fazendo um comentário discriminatório quando acreditava que a câmera estava desligada. “É coisa de preto”, disse ele ao seu interlocutor depois de se queixar de uma buzina que atrapalhava a transmissão. Em resposta à repercussão negativa, o apresentador seguiu o roteiro e respondeu que “existe racismo no Brasil, mas não sou racista”.

Hoje, Waack se tornou âncora da CNN Brasil, recém-criada filial do gigante canal norte-americano.

Seus novos empregadores certamente sabiam do flagra em que fora pego há pouco mais de dois anos. Desta vez, no entanto, o âncora se viu livre do repúdio que naquela época ajudou a deixá-lo desempregado (o que nos leva a ter alguma ideia de qual será a linha editorial da CNN Brasil). O fato dos motivos de sua demissão não terem gerado incômodo ao ponto de, em tão pouco tempo, ser recebido de braços abertos em um novo emprego comprova o traço estrutural do racismo de que trata Almeida em sua obra.

A verdade é que a contratação de Waack foi um retorno das férias. Da mesma forma que o jornalista Gustavo Negreiros – também demitido após vociferar misoginias na rádio ao dizer que o problema de Greta Thunberg era falta de sexo – foi readmitido tão logo as reações enérgicas aos seus destemperos se diluíram e a poeira abaixou. Para seus patrões, o problema de suas declarações foi o mesmo de Roberto Alvim e sua imitação de Goebbels: a indiscrição.

É certo que no mesmo pacote em que está o racismo de Waack estão o lavajatismo de Moro (o próprio jornalista integra a linha de frente da imprensa chapa-branca lavajatista), o neoliberalismo de Paulo Guedes, a homofobia de Bolsonaro (cuja eleição foi considerada por Waack uma “profunda transformação positiva”), o fundamentalismo de Damares e, sobretudo, o terraplanismo onipresente em todo o elenco ministerial. Todos passageiros do Uber bolsonarista, coluna onde inevitavelmente converge a agenda reacionária e obscurantista que hoje ocupa o Palácio do Planalto.

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