Educação

A defesa da educação é uma tarefa imposta às forças progressistas

Para o deputado federal Glauber Braga (PSOL), o bolsonarismo acena para um futuro frustrado em que educação não é sinônimo de resistência

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O golpe de 1964 legou-nos uma ditadura que logo ficou conhecida como ‘revolução dos caranguejos’, de tanto que caminhava para trás, condenando-nos ao obscurantismo. Em artigo antológico publicado no Correio da Manhã, Carlos Heitor Cony dizia que o golpe que pretendia ser chamado de “revolução” ignorava a marcha da história e tentava regredir à República Velha. Assim rasteja o novo regime brasileiro, modelo arcaico de populismo autoritário, ameaçando-nos com políticas retrógradas em todos os campos da experiência humana.

Em pouco mais de seis meses, retrocedemos nas políticas externa, ambiental, educacional, científica e tecnológica, bem como nos conceitos de nação, independência e mesmo de defesa. O novo regime renunciou ao desenvolvimento e às políticas de compensação social, em um país no qual quase 14 milhões de cidadãos não dispõem de emprego e outros tantos vivem à margem do mercado de trabalho.

Desfeitas as esperanças de um presente digno, o bolsonarismo destrói o nosso futuro. Para o projeto de subalternidade econômica, militar e estratégica de nosso país aos interesses dos EUA e de suas empresas, é fundamental que persistam nossos atuais índices de pobreza e atraso industrial-tecnológico.

O bolsonarismo transformou a estagnação econômica em recessão, o PIB vem caindo mês a mês e já aponta para um crescimento negativo.  A máquina pública está parada, a União não investe e cresce o endividamento das famílias e do governo, mandando às favas o tal de saneamento fiscal que tudo pretende justificar. 

Da recessão caminhamos para a depressão, aumentando o fosso que nos separa de outras nações. A resposta do governo é desnacionalizar, vender os ativos de nossas empresas na bacia das almas, ameaçar o País com um ciclo irresponsável de privatizações que começa com a Eletrobras e não se deterá mesmo na Petrobras, já em processo de liquidificação com a irresponsável venda, a preço de banana, de seus ativos mais rentáveis. 

Se não for detido, o bolsonarismo inviabilizará a atividade industrial-manufatureira ainda sobrevivente, embora em crise profunda.  Por primarismo ideológico e carência cognitiva, colocam-se em risco as exportações de commodities, último setor positivo da balança comercial. Pari passu com a destruição da economia, o neoliberalismo arcaico investe na eliminação das conquistas dos trabalhadores, começando por demolir a Previdência pública, para melhor servir ao sistema financeiro e a uma “elite” suicida.

Destruído o presente, o bolsonarismo acena com a frustração do nosso futuro, pois essa é a consequência inevitável de suas políticas de educação, ciência e desenvolvimento tecnológico. A educação, sabem principalmente os países que se desenvolveram antes de nós, é o mais importante meio de assegurar a transição do atraso para o desenvolvimento. O investimento maciço e sistemático em ensino, pesquisa científica, tecnologia e inovação é o único meio de promover o progresso, quando o mundo se divide entre detentores de conhecimento e importadores de conhecimento.

O Brasil, que perdeu a marcha da História, que nunca chegou a ter um desenvolvimento industrial pleno, corre o risco de levar rasteira na revolução tecnológica que avança entre os desenvolvidos a passos largos. Seu alvo mais recente é o BNDES, principal agência de desenvolvimento, que descapitaliza para preparar sua extinção. 

A crise da educação é um projeto político da elite, alertou Darcy Ribeiro, tragicamente premonitório

Nesse afã antinacional, o novo regime corta drasticamente os recursos destinados à educação e à pesquisa, esvazia as agências de desenvolvimento, desmonta a Finep (voltada para a inovação tecnológica), esvazia o CNPq e a Capes (que fomenta o sistema de pós-graduação), corta bolsas de estudo e inicia um criminoso combate à universidade pública, aquela que investe na pesquisa, forma quadros e possibilita o acesso dos mais pobres ao conhecimento.

Um só dado para ilustrar o papel social desempenhado pela universidade pública: 64,7% dos alunos da Universidade Federal Fluminense são oriundos da escola pública, 50,8% são filhos de pais e mães que não tiveram acesso ao ensino superior, 51,2% são negros, 70,2% têm renda per capita menor que 1,5 salário mínimo.

A UFF não é um acaso, é a regra. Por isso, a universidade pública e gratuita tornou-se alvo da antipatia governamental, movida pela loucura ideológica e articulada mobilização de interesses econômicos. Grandes conglomerados, nutridos por fundos estrangeiros, estão ávidos pelos negócios milionários que a destruição do ensino público prenuncia. É uma batalha também cultural, mas sobretudo econômica.

Enquanto o governo que aí está investe contra o conhecimento, a Alemanha anuncia a aplicação de 14,6 bilhões de euros anuais em tecnologia. Em 2018, os EUA aplicaram 476,5 bilhões de dólares e a China, 370,6 bilhões de dólares em pesquisa e desenvolvimento. Os dois gigantes, juntos, somam 62% do investimento global. E não estão sós: o Japão investiu 170,5 bilhões e a Coreia do Sul, 73,2 bilhões de dólares. E o Brasil?

Destruído o presente, o bolsonarismo acena com a frustração do nosso futuro

Por aqui, Bolsonaro efetuou um corte geral no custeio das universidades federais da ordem de 40% ao mesmo tempo que impôs um corte de cerca de meio bilhão de reais no orçamento do Ministério das Comunicações, Ciência, Tecnologia e Inovação. 

Esses números explicam, ao mesmo tempo, tanto o desenvolvimento dos países líderes em ciência e tecnologia quanto o nosso atraso. Eis o outro lado desta moeda: enquanto nossa perspectiva de PIB para 2019 é algo em torno de 0,8% em face de 2018, a China teve um crescimento de 6,9% e a Índia, de 6,6%.

O mestre Darcy Ribeiro, sábio e patriota, foi tragicamente premonitório quando afirmou que “a crise da educação no Brasil não é uma crise, é um projeto da elite para o povo não estudar, porque, se o povo estudar, o povo não aceitará mais ser escravo”.

É exatamente essa “elite” atrasada que se faz representar pelo governo do capitão. Defender a educação e derrotar o governo, para salvar o País, é a tarefa que se coloca para as forças progressistas em todos os campos de luta. Um deles é o Parlamento, mas seu poder de fogo depende da organização popular. Na verdade, dela depende o futuro deste país.

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