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A casa de Trump caiu?

Se até Donald Trump pode cair, o que dirá suas cópias malfeitas, ainda mais desengonçadas e desastradas?

Donald Trump (Foto: Shealah Craighead)
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Quando anunciaram que o Congresso norte-americano iniciaria o processo de impeachment do Trump, a minha primeira reação foi de ceticismo cauteloso.

Apesar de todas as denúncias e suspeitas já levantadas contra Trump – de conluio com os russos para hackear as eleições dos EUA, de ter pago 130 mil dólares para dar um “cala a boca” na atriz pornô Stormy Daniels com quem Trump teria mantido um caso, de obstrução de justiça ao requisitar lealdade do diretor do FBI James Comey durante a investigação de conluio com os russos –, aparentemente o presidente dos EUA acaba saindo ileso ou fortalecido no final.

Pelo que tudo indica, pouca coisa tem poder para abalar o apoio do eleitorado trumpista e, o que talvez seja o mais surpreendente, o jugo que ele conseguiu impor a todo o Partido Republicano, um partido que desde há muito se arrogava um conjunto de valores morais e patrióticos e que, neste momento, vê-se obrigado a blindar um presidente que representa o oposto destes valores.

Portanto, embora o impeachment provavelmente passe na Câmara norte-americana, onde os democratas têm maioria de votos, é difícil conceber que a oposição consiga os dois terços de votos necessários no Senado para remover o presidente, pois aí sim necessitaria o apoio de republicanos dissidentes, o que, até agora, não se delineia como um cenário dos mais plausíveis.

Mas qual foi a acusação que está motivando este processo de impeachment?

Um informante protocolou uma denúncia formal sobre uma conversa entre Trump e Volodymyr Zelensky, o presidente da Ucrânia. Neste diálogo por telefone, Trump teria solicitado ajuda ao chefe de Estado de outro país para encontrar material comprometedor contra seu provável maior rival democrata, Joe Biden, nas eleições norte-americanas de 2020, já que o filho de Biden atou na diretoria de uma empresa de gás na Ucrânia.

Resumindo: Trump estava usando de sua posição para, com o auxílio de um país estrangeiro, influenciar o resultado das próximas eleições. Esqueçam a Rússia, o negócio agora é a Ucrânia!

Imediatamente, como era o esperado, parlamentares republicanos vieram, em quase sua totalidade, em defesa do presidente. A velha alegação foi jogada na mesa: esta é mais uma narrativa democrata para derrubar o Trump.

No entanto, o próprio presidente contribuiu para a escalada da crise ao autorizar a publicação de uma transcrição da conversa entre ele e o presidente na Ucrânia. Ao fazer isto, ele simplesmente confirmou a denúncia apresentada pelo informante, embora, em sua defesa, Trump alegou que não havia nada de errado naquele diálogo. Quem está acompanhando a Vaza Jato já conhece esta história: diálogos totalmente antiéticos e possivelmente criminosos entre procuradores da República e juiz, mas, para os envolvidos, são conversas normais e nada comprometedoras. É a velha tática da distração – provem que o crime é crime!

Então, Trump, que parecia inatingível, aos poucos demonstra mais uma vez todo o seu destempero e já se especula que ele pode, sim, sofrer impeachment. A queda de Trump, se eventualmente ocorrer, transformará completamente o cenário para as próximas eleições norte-americanas, jogará um balde de água fria neste ciclo político global de ascensão da extrema-direita – que já tem sofrido alguns revezes pelo mundo, como na Itália – e, por fim, caso os democratas retornem à Casa Branca, isto abalará terrivelmente as relações do governo Bolsonaro com o seu mais caro aliado de hoje.

O desenrolar do impeachment de Trump não terá avassaladoras consequências apenas para os EUA, mas afetará diretamente a desastrosa política externa bolsonarista, que vê em Trump um ideal a ser seguido. Um péssimo referencial, mas que talvez possa servir de prenúncio.

Trump, que chegou a dizer durante a campanha eleitoral que poderia dar um tiro em alguém em plena Quinta Avenida que ainda assim não perderia votos – e isto parecia bastante verdadeiro até poucos dias atrás -, tornou-se uma representação das democracias em colapso e do populismo barato capaz de levar ao poder figuras toscas e evidentemente autoritárias.

Se até Trump pode cair, o que dirá suas cópias malfeitas, ainda mais desengonçadas e desastradas, que vivem à sombra do Império Americano em declínio? O que será do Trump dos Trópicos então?

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