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Redutos da extrema-direita na Alemanha são zonas mais afetadas pela Covid-19

Grupos resistem em utilizar máscaras e comparam com burcas

Redutos da extrema-direita na Alemanha são zonas mais afetadas pela Covid-19
Redutos da extrema-direita na Alemanha são zonas mais afetadas pela Covid-19
Christof STACHE / AFP.
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As zonas mais afetadas na Alemanha pela segunda onda da pandemia na Alemanha são redutos da extrema-direita, contrárias às medidas de restrição e adeptas de teorias da conspiração.

 

“É surpreendente constatar que as regiões mais afetadas são aquelas em que o voto no partido AfD (Alternativa para Alemanha, extrema-direita) foi mais elevado nas últimas eleições legislativas, de 2017”, resumiu o comissário de governo para os estados que integravam a ex-Alemanha Oriental, Marco Wanderwitz, que é da Saxônia.

O estado-região é o caso mais emblemático. Registrava a taxa de incidência mais elevada da Alemanha, com 319,4 casos por 100.000 habitantes na terça-feira, quando a média federal é de 114,2, segundo o Instituto Robert Koch.

Em 2017, o estado deu 27% dos votos para o AfD, melhor resultado do partido de extrema-direita no país.

Uma equipe do Instituto para a Democracia e a Sociedade Civil, com sede na região vizinha Jena, publicou um estudo sobre “a correlação estatística forte e muito significativa” entre o voto no AfD e a intensidade da pandemia, anunciou seu diretor, Matthias Quent.

“Podem existir fatores que expliquem os altos resultados do AfD e, ao mesmo tempo, valores de incidência elevados, sem que a correlação seja o único fator explicativo”, adverte o pesquisador.

A proporção de pessoas idosas e de famílias numerosas, a presença de trabalhadores transfronteiriços e até mesmo a organização de um sistema de atendimento, diferente de acordo com os estados, também influenciam o dinamismo da pandemia.

“Burka para todos”

Entre os partidos alemães, o AfD é o único que expressou publicamente seu ceticismo e inclusive oposição às medidas de restrição.

Seus deputados relutaram a usar máscara no Parlamento, comparada com uma “burka para todos” por um deles.

Uma pesquisa recente do instituto Forsa mostrou que 56% dos eleitores do AfD considera excessivas as medidas restritivas.

E há muitas conexões com o movimento alemão dos “livre pensadores”, que reúne em manifestações frequentes um grupo heterogêneo de opositores das vacinas, defensores de teorias da conspiração e simpatizantes da extrema-direita.

Quase um terço dos manifestantes expressou o desejo de votar no partido AfD em 2021, segundo um estudo publicado pelo jornal FAZ.

Na Saxônia, a situação de saúde é tão grave que as autoridades anunciaram na terça-feira uma série de medidas drásticas, que incluem o fechamento a partir de segunda-feira de escolas, creches e várias lojas.

Em cidades como Görlitz, ou Bautzen, onde a extrema-direita tem a simpatia de 25% dos eleitores, a taxa de incidência se aproxima de 400.

Na maior cidade do estado, Leipzig, onde a esquerda lidera, a taxa de incidência é próxima da média federal, com 140,1 na terça-feira.

“Coronaceticismo”

Nesta região, berço do movimento islamofóbico Pegida, o “coronaceticismo” tem espaço, inclusive entre profissionais da saúde e economistas.

Em Bautzen, Jörg Drews, executivo de uma empresa de construção, financiou publicações de teorias da conspiração, segundo o canal público ARD. A Saxônia não é a única afetada por este fenômeno.

O distrito de Regen, na Baviera, registrou na terça-feira a maior taxa de incidência da Alemanha, 578,7. Há três anos, o local deu o melhor resultado à extrema-direita na região, com mais de 16% dos votos.

Na Renânia do Norte-Westfália, a cidade de Gelsenkirchen, onde a sigla registrou a melhor votação no estado, a incidência é três vezes maior que na localidade próxima de Münster (169 contra 56).

Ao mesmo tempo, as circunscrições com as menores taxas de infecção, a maioria situadas em Schleswig-Holstein (norte), votam em menos de 8% na extrema-direita.

“A conexão entre os adeptos de teorias da conspiração e a extrema-direita é, lamentavelmente, lógica, porque compartilham muitas teses. Para ambos, uma pequena elite controla secretamente os acontecimentos em detrimento dos ‘alemães'”, explica à AFP Miro Dittrich, pesquisador da Fundação Antirracista Amadeu Antonio.

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