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Quem é quem na cúpula direitista das Américas
Patrocinado pelo bolsonarismo, o encontro no Paraná reúne de fã de ditador assassino a senadora que nega matança em seu país

Às vésperas do início do governo de extrema-direita de Jair Bolsonaro, o Brasil será palco de uma Cúpula Conservadora das Américas, a primeira do gênero, uma iniciativa bolsonarista que tentará aproximar reacionários do continente para ações políticas conjuntas. A “fauna” a se reunir no sábado 8 em Foz do Iguaçu, no Paraná, será variada e terá como estrela bolsonarista o filho caçula do ex-capitão, Eduardo, uma espécie de chanceler paralelo do futuro governo do pai.
À beira das cataratas, estarão um presidenciável chileno admirador de Augusto Pinochet, ditador conterrâneo de 1973 a 1990, um exilado cubano acusado de terrorismo nos anos 1980 e uma senadora colombiana que nega ter havido um fato histórico reconhecido por historiadores de seu país, a matança de camponeses grevistas em 1928.
Também da Colômbia, falará, mas por videoconferência, um ex-presidente que renunciou ao Senado neste ano por acusação de suborno e fraude e depois voltou atrás na renúncia, embora o processo contra ele siga na Suprema Corte. Trata-se de Álvaro Uribe, presidente de 2002 a 2010, que participará de debate sobre segurança, um dos quatro temas do evento.
O chileno fã de Pinochet, cuja política econômica neoliberal estará presente no governo Bolsonaro com o Chicago Boy Paulo Guedes, futuro “superministro” da Fazenda, é José Antonio Kast. Ele estará na mesa redonda sobre política.
Na eleição presidencial chilena de 2017, Kast ficou em terceiro, com 8%. Era o favorito das viúvas da ditadura Pinochet. “O governo de Pinochet foi melhor que o de Sebastián Piñera (2010-2014) para o desenvolvimento do país”, dizia ele, “se (o general) estivesse vivo, votaria em mim”.
María Fernanda Cabal Molina é a senadora colombiana que nega um fato histórico trágico que completou 90 anos na quinta-feira 6, um episódio conhecido em seu país como “Massacre das Bananeiras”.
Em 1928, lavradores colombianos da multinacional norte-americana United Fruit Company entraram em greve por melhores condições de trabalho. Depois de um mês, o governo colombiano mandou o Exército pôr fim àquilo. Não há um número exato sobre os assassinados, mas as estimativas mais aceitas apontam algo como pelo menos 1,8 mil mortos.
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Em novembro de 2017, enquanto Kast defendia Pinochet na eleição chilena, María Fernanda, que vê comunismo por toda a parte, a exemplo do clã Bolsonaro, escreveu no Twitter que o massacre era um “mito histórico da narrativa comunista”.
O exilado cubano acusado de terrorismo nos anos 1980 é Orlando Gutierrez-Boronat, catalogado na cúpula como “representante dos exilados cubanos nos EUA”.
Ele participará de uma mesa redonda sobre cultura, juntamente com o guru bolsonarista Olavo de Carvalho, este por videoconferência.
Quem considerava Boronat terrorista era o governo de Cuba, por ele pertencer a um grupo extremista anti-Fidel Castro chamado Organização para a Libertação de Cuba, de um famoso terrorista cubano, Ramón Saúl Sánchez Rizo. Olavo de Carvalho acha o contrário: que Boronat é um guerreiro da liberdade e que terrorista é o governo cubano.
Eduardo Bolsonaro, o chanceler ‘paralelo’ (Foto: ABr)
O chanceler de fato
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A principal cabeça da cúpula da extrema-direita é o deputado federal Eduardo Bolsonaro, o mais votado da história brasileira. Seu pai escolheu como ministro das Relações Exteriores um diplomata com visão ideológica igual, o embaixador trumpista Ernesto Araújo, mas este terá de disputar protagonismo com o caçula do chefe.
Em fins de novembro, Eduardo foi aos Estados Unidos e se reuniu com algumas autoridades do segundo escalão do governo Donald Trump, tentativa de apertar laços com o atual presidente dos EUA.
Aproveitou e conversou também com o uruguaio Luis Almagro, secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), entidade sediada em Washington. Almagro foi chanceler do governo de esquerda de José Mujica, no Uruguai. Hoje, Mujica o considera, porém, um “perigo” para o continente, devido à posição de Almagro contra o governo de Nicolás Maduro na Venezuela.
Almagro foi uma das poucas personalidades a saudar a escolha de Ernesto Araújo como chanceler de Bolsonaro. Recompensa: Araújo anunciou apoio do Brasil à reeleição dele, em 2020, para o comando da OEA.
Almagro anunciou na quinta-feira 6 que tentará a reeleição. “Embaixadores da Colômbia e dos EUA me transmitiram que há um conjunto de países expressando apoio à minha candidatura para reeleição como secretário-geral da OEA. Decidi aceitar tal responsabilidade”, escreveu no Twitter.
A citada Colômbia também foi visitada por Eduardo Bolsonaro recentemente. Ele esteve em 3 de dezembro com o atual presidente de lá, o direitista Ivan Duque, no cargo desde agosto. Duque está decidido a combater Maduro, inclusive propõe que países latino-americanos retirem embaixadores da Venezuela quando o presidente de lá tomar posse de um novo mandato, em janeiro.
Derrubar Maduro será a principal “agenda” de Eduardo Bolsonaro, o chanceler paralelo do pai.
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