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Para diplomata, a Inglaterra foi símbolo de modernidade durante o reinado de Elizabeth II

Sergio Amaral, ex-embaixador do Brasil em Londres, diz que a Rainha tinha prestígio social maior que o do governo inglês

A Rainha Elizabeth II. Foto: Andy Buchanan/AFP
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O diplomata Sergio Amaral, que foi embaixador do Brasil em Londres nos últimos anos do governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), descreve a Rainha Elizabeth II como alguém de imagem amena, suave, mas que mostrou uma visão política de peso sobre a Grã-Bretanha. Nas vezes em que esteve com ela, conta Amaral, percebeu uma líder bem informada, com análise crítica e de bom senso de humor.

“Durante o reinado da Elizabeth II, a Inglaterra foi um país de transformação e modernidade”, define o ex-embaixador, em entrevista a CartaCapital.

Para o diplomata, a monarca tinha um prestígio social maior até do que o governo inglês, sobretudo nas últimas gestões de Boris Johnson e Thereza May. Mas, na comunidade internacional, a sua discrição pode ter impedido que sua fama fosse maior e até mesmo apagado um pouco de suas qualidades.

A morte da Rainha Elizabeth II, aos 96 anos, foi comunicada nesta quinta-feira 8 durante a tarde. Lideranças políticas de diferentes países se pronunciaram sobre o acontecimento, inclusive o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Confira os principais trechos da entrevista.

CartaCapital: Quais os pontos-chaves da trajetória da Rainha para a entender sua importância política?

SA: O que é interessante é que ela sempre teve uma imagem amena, suave, mas nos grandes momentos ela mostrou que tinha uma visão da Grã-Bretanha e peso no processo político.

Ela teve uma grande influência na vida política do Reino Unido, dentro dos limites que cabem à monarca. Ela não extravasou os seus limites. Dentro deles, ela teve um papel muito importante, que pode ser entendido se pensarmos que, de um lado, a Grã-Bretanha é um país voltado para o futuro e a mudança. Veja bem que a Inglaterra liderou muitas das transformações da sociedade inglesa, a música, a moda, a arte.

Durante o reinado da Elizabeth II, a Inglaterra foi um país de transformação e modernidade. Mas talvez possa ter mudado muito porque, de outro lado, havia o elemento de continuidade dado pela Família Real. Esse papel foi muito funcional para a democracia inglesa e a sociedade inglesa, tanto que ela é muito respeitada, contrariamente ao que você vê no caso do governo inglês.

Um analista político importante fez o seguinte comentário: a nova primeira-ministra vai ter um desafio muito grande, porque os três últimos foram cada um pior que o outro. Há uma imagem crítica do governo inglês, se comparado com o grande respeito que a sociedade inglesa tem pela sua Rainha.

CC: Como o senhor descreveria a relação dela com outros países?

SA: A Rainha foi subestimada. Talvez por causa do seu estilo discreto, e talvez porque o papel dela não é de ter realmente uma liderança no processo político. Mas, nas vezes em que estive com ela, ela demonstrou ser uma pessoa muito bem informada, com uma análise crítica e um bom senso de humor. Talvez a sua discrição tenha impedido que fosse mais conhecida e apagado um pouco das qualidades que demonstrou ao longo de seu reinado.

CC: O senhor enxerga alguma diferença marcante entre a Rainha Elizabeth II e o agora Rei Charles III?

SA: É muito difícil uma resposta a essa pergunta, porque, pela natureza da monarquia inglesa, o Rei é a figura central, e ela foi a figura central. E exerceu plenamente essa condição. Então, não temos uma ideia muito clara de quem vai ser o Rei Charles. Sabe-se que ele tem algumas predileções, uma delas muito positiva, a questão ambiental. Há algumas atividades de caráter social. Mas é tudo. Quem aparecia era ela, e ele na verdade não foi testado. Embora ele tenha 76 anos, pouco se conhece sobre ele e como reagiria diante de uma situação mais delicada.

CC: É possível observar alguma crítica ao papel executado pela Rainha?

SA: Eu morei em Londres por um período razoavelmente longo como embaixador e tenho toda uma formação inglesa. Eu nunca vi essa crítica. Eu ficaria surpreso, porque ao longo de seu período de reinado, a Rainha se manteve dentro dos limites que cabem a um soberano inglês.

Ela tinha uma personalidade afável, invariavelmente gentil e amável. Mais do que tudo, ela é a representante de algo de que a sociedade inglesa gosta muito e respeita, que é a monarquia.

A monarquia tem um papel muito mais importante na sociedade inglesa do que pode parecer, porque ela faz esse equilíbrio de um país que muda muito rápido, mas que tem uma âncora. Esse contraponto é a monarquia, justamente porque ela se manteve dentro dos limites que são fixados dentro da democracia inglesa.

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