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Os sete de Pequim

Xi Jinping cercou-se de experientes e fiéis burocratas para garantir a permanência no poder

Os sete de Pequim
Os sete de Pequim
Clube. Jinping (de mãos cruzadas) escolheu com cuidado os integrantes do Politburo, centro das decisões chinesas. Suas ambições se confundem com as ambições do país - Imagem: Noel Celis/AFP
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A espera acabou. Os rumores são história. Agora temos os sete integrantes do novo Comitê Permanente do Politburo, a autoridade máxima de tomada de decisão da China, liderada, sem dúvida ou desafio, pelo secretário-geral do Partido Comunista, Xi Jinping.  Para todos que lidam com o ­país, no governo, nos negócios e em think tanks, especialmente no Brasil, é essencial conhecer esses líderes, suas origens, cargos e portfólios. Todos começaram em postos na base do sistema e subiram a escada político-administrativa. Cinco administraram províncias ou grandes municípios, com tamanho proporcional, em habitantes e PIB, a países inteiros.

Os integrantes em potencial eram mais diversos e menos conhecidos do que nos congressos anteriores, o que indicava um controle mais apertado do aparelho do partido. Quando me pediram para prever, disse que, quando os homens entrassem no palco, então seria possível “fazer engenharia reversa” de cada nome e explicar por que cada um estava lá. Isso pode soar como retrospectiva óbvia, mas tem poder probatório e dá uma visão especial.

Tenho duas observações abrangentes. Primeiro, cada um dos escolhidos tem conhecimento e longa experiência na gestão de setores críticos do governo chinês. Segundo, o grupo é altamente coeso no apoio a Xi Jinping. À luz das preocupações de Jinping, é compreensível que tenha exigido uma equipe na qual possa confiar, em todos os sentidos do termo “confiar”. Conheço pessoalmente há muitos anos três dos nomeados. Com meu parceiro de longa data, Adam Zhu, tive reuniões privadas, conduzi entrevistas, trabalhei em projetos, nem todos no registro público.

Comecemos, claro, pelo secretário-geral do PCC, Xi Jinping. Ele é o “núcleo” do comitê central e coloca sua autoridade acima de todas as outras combinadas. Jinping e suas filosofias e políticas foram o foco de meus artigos anteriores sobre a “mensagem profunda”, então não preciso acrescentar mais nada.

O segundo é Li Qiang, provável primeiro-ministro do Conselho de Estado no Congresso Nacional do Povo. Foi governador da província de Zhejiang, quarto maior PIB da China e berço do empreendedorismo. Exerceu ainda a função de secretário do partido na província de Jiangsu, segundo maior PIB da nação, e do município de Xangai, principal centro comercial. O PIB combinado, caso se tratasse de um país independente, seria o quinto maior do mundo. Quando Jinping era secretário em Zhejiang, Qiang era secretário-geral do comitê do partido, em essência chefe de gabinete de Jinping.

O secretário-geral enxerga desafios imponentes pela frente

Em uma de minhas reuniões com Qiang, enquanto pesquisava e filmava as inovações ambientais de Zhejiang, em maio de 2016, discutimos os programas pioneiros da região. Ele tinha a inovação e o empreendedorismo em sua mente e dizia que a “geração inovadora” é a chave para a transformação industrial. Qiang é aberto, caloroso, acessível, pé no chão. Ao entrar em uma das reuniões, disse com um sorriso: “É bom que o doutor Kuhn e eu sejamos velhos amigos, para que eu não tenha de usar roupas formais”.

O terceiro é Zhao Leji, futuro chefe do Congresso Nacional do Povo, o mais alto órgão legislativo. Antes, Leji foi chefe da comissão central de inspeção disciplinar e secretário do partido em duas províncias, Qinghai e Shaanxi, esta última uma área de relevância para Jinping e sua família. Depois aparece Wang Huning, indicado para a chefia da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, o mais alto órgão consultivo,com crescente influência nas políticas e programas estatais. Anteriormente, um distinto professor de política internacional e direito e, mais recentemente, primeiro-secretário responsável pela ideologia, Huning é um sofisticado pensador político e geopolítico, conhecido por sua criatividade em teoria política e insights em assuntos internacionais. Notavelmente, apoiou três gerações de líderes da China e tem sido figura de peso na equipe interna de Jinping. Quando recebi a Medalha de Amizade da Reforma da China, em 18 de dezembro de 2018, enquanto todos os líderes, liderados pelo presidente Jinping, passavam, Jinping olhou para mim e, com brilho nos olhos, perguntou, em inglês: “Você se lembra de mim?” Nós dois sorrimos.

Cai Qi vai supervisionar as operações diárias, incluídos os departamentos de Organização e Publicidade e ideologia. Exerceu funções no partido e nas províncias de Fujian e Zhejiang, sobrepondo-se a ambos com os períodos de liderança de Jinping. Recentemente, ocupou o posto de secretário do PCC de Pequim.

Ding Xuexiang será o vice-primeiro-ministro-executivo. Foi diretor do Escritório Geral, portanto, chefe de gabinete de Jinping, com quem sempre viaja. Engenheiro de formação, Xuexiang teve vários papéis de liderança em Xangai, de ciência e tecnologia a assuntos políticos e jurídicos, outro período em que trabalhou com Jinping. Por fim, temos Li Xi, que dirigirá a Comissão Central de Inspeção Disciplinar, cuja função é combater a corrupção. Foi secretário do partido nas províncias de Liaoning e Guangdong, com conexões especiais com Jinping.

No último congresso, Jinping apresentou sua visão a respeito do rejuvenescimento da China, juntamente com uma avaliação sóbria das “lutas” (uma nova palavra favorita) que estão por vir. Por isso, ele optou por uma equipe sênior, na qual cada integrante esteja bem preparado para o trabalho e mantenha com ele um estreito relacionamento. Aqueles que no Brasil lidam com a China vão lidar com funcionários e executivos que se reportam a essa equipe. Quando se sabe quem são eles, aumentam as chances de uma relação de respeito e produtiva. •


*Robert Lawrence Kuhn é conselheiro dos líderes da China e de corporações multinacionais.

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1236 DE CARTACAPITAL, EM 30 DE NOVEMBRO DE 2022.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “Os sete de Pequim”

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