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Obama sai fortalecido da ONU

Na Assembleia Geral, presidente americano consegue agregar apoio ao discurso de que o “Estado Islâmico” precisa ser destruído, uma mudança de rumo na política externa até então defendida pelos EUA

O presidente dos Estados Unidos Barack Obama, na Assembleia Geral da ONU
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Apenas quatro meses após defender abertamente uma nova visão de política externa em favor da diplomacia e avessa à intervenção militar, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, agora mostra outra disposição. Diante da Assembleia Geral da ONU, ele afirmou que o mundo encontra-se, no momento, no “cruzamento entre a guerra e a paz”.

Enquanto o presidente discursava em Nova York, aviões de guerra americanos atacavam, a milhares de quilômetros dali, alvos do autoproclamado “Estado Islâmico” (EI) no Iraque e na Síria. Os ataques, segundo o presidente dos EUA, tornaram-se inevitáveis. “A única linguagem entendida por assassinos como esses é a da força”, justificou.

O tom usado em Nova York mostra uma guinada no antes cauteloso discurso, quando Obama ainda usava termos como “pressionar” ou “combater” o EI. Desta vez, o presidente americano não mediu as palavras e foi além até mesmo de recentes declarações sobre “degradar e destruir” a organização extremista.

Do pronunciamento feito em maio passado na academia militar de West Point, apenas um tema parece ter sido mantido pelo presidente: a importância de não agir sozinho. “Os Estados Unidos vão trabalhar com uma ampla coalizão a fim de desmantelar essa rede de morte”, disse o presidente. “E hoje eu conclamo o mundo a se juntar a nós nesses esforços.”

A Casa Branca calcula contar com mais de 40 parceiros na coalizão contra o “Estado Islâmico” no Iraque. No fim do dia, pelo menos mais um país pareceu propenso a também aderir aos ataques contra os islamistas: pelo Twitter, o primeiro-ministro britânico, David Cameron, declarou que iria convocar o Parlamento para debater a questão.

Ele ainda afirmou diante da Assembleia Geral da ONU que o Irã pode ser “parte da solução”. Cinco países do Golfo Pérsico estão atualmente participando dos ataques na Síria.

“Não estamos agindo sozinhos”, destacou Obama. “É uma questão central de nossa era global: se vamos resolver nossos problemas juntos, em um espírito de interesses e respeito mútuos, ou se vamos cair em rivalidades destrutivas do passado”.

Para Tom Wright, analista estratégico da independente Instituição Brookings, em Washington, esse foi um momento revelador da fala de Obama. “Em discursos anteriores, ele parecia pensar ser inevitável que a resposta para a questão seria a cooperação. Neste agora, ele parece estar preocupado que a resposta sejam rivalidades antigas”, afirma Wright. “Acho que ele está correto agora, e estava errado naquela época.”

Para Obama, as “antigas rivalidades” são uma constante no Oriente Médio. Ele conclamou para uma “ampla negociação”, na qual “os grandes poderes possam resolver suas diferenças de maneira direta, honesta e pacífica, sentados à mesa com outras partes, e não por meio de representantes de arma em punho”.

O crescente risco de atritos no Pacífico asiático – onde disputas territoriais entre a China e países vizinhos vêm deixando a região em alerta – recebeu apenas uma breve menção no discurso de Obama. O presidente pediu que “todas as nações cumpram as leis e resolvam suas disputas de maneira pacífica e consistente com a lei internacional”.

Mas em nenhum outro lugar no mundo o risco de retorno das “antigas rivalidades” é maior do que no Leste Europeu, onde, segundo Obama, a agressão russa à Ucrânia “relembra os tempos em que os grandes países esmagavam os menores seguindo suas ambições territoriais”.

Ucrânia. Depois da luta contra o Estado Islâmico, a crise no leste ucraniano foi o segundo tema que tomou a maior parte do tempo do discurso de Obama. Ele apresentou a questão como além de uma simples queda de braço que definirá o futuro de um país: segundo o presidente americano, trata-se de um desafio para toda a ordem pós-Segunda Guerra Mundial.

“Em discursos anteriores, Obama tendeu a minimizar o que aconteceu na Ucrânia. Desta vez, porém, ele não fez isso”, avalia Tom Wright.

Já Brett Schaefer, da conservadora Heritage Foundation, não se mostra convencido: “Obama quer que a Rússia mude o curso, mas não cobrou qualquer atitude da UN – uma admissão implícita de que o sistema internacional foi incapaz de tomar alguma ação nesta questão”, afirma.

Apesar de condenar a Rússia pelo que considera uma ameaça à cooperação global, Obama obteve o apoio de Moscou em um elemento importante em sua luta contra o EI e o terrorismo de maneira geral.

Essa foi a segunda parte do grande dia do presidente americano. Ele presidiu um encontro especial do Conselho de Segurança das Nações Unidas e conquistou apoio unânime em uma resolução que trata de impedir a adesão de estrangeiros junto aos grupos de combatentes no Iraque e na Síria.

Em seu rápido pronunciamento após o voto, o chanceler russo, Sergei Lavrov, ressaltou a habilidade do Conselho de Segurança – que durante anos enfrenta impasse com relação a temas relacionados à Síria – de conseguir um acordo sobre grandes questões. E isso apenas um dia após Lavrov ter condenado os EUA por terem dado início a ataques aéreos contra o EI na Síria sem a permissão expressa de Damasco.

Não é apenas Moscou que tem suas dúvidas com relação à legalidade dos ataques aéreos na Síria. O jornal The New York Times publicou um contundente editorial na quarta-feira (24/09) registrando receio com a “mudança errada” na política de Obama, argumentando que o Conselho de Segurança deveria ter votado sobre a questão.

A Casa Branca, porém, defende que está atuando em defesa do Iraque, que tem feito reiterados pedidos de ajuda contra a ameaça dos radicais islâmicos. Além disso, segundo Washington, o governo sírio vem se mostrando incapaz de agir, perdendo o controle sobre diversas partes de seu próprio território.

Muitos críticos, porém, classificam o argumento legal como “distorcido”. Tom Wright não acredita que os EUA levarão o caso ao Conselho de Segurança. A Rússia, afirma o especialista, iria condicionar seu apoio a condições que os americanos não iriam aceitar –como cooperar com o regime de Bashar al-Assad.

Pelo menos por enquanto, a Casa Branca garante que não vai trabalhar com Assad e insiste que o ditador sírio perdeu completamente sua legitimidade no poder após os três anos de guerra civil.

Há um ano, Obama afirmou à Assembleia Geral da ONU que seu país estava deixando para trás o caminho de uma “guerra perpétua”. Neste ano, porém, alguns veem o risco de os EUA estarem caminhando na direção oposta.

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