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O impasse sobre a adesão da Suécia à Otan e a ruptura da histórica neutralidade do país

Finlândia e Suécia apresentaram candidaturas na mesma data; entenda os dilemas e os motivos da renúncia à neutralidade de Estocolmo

Foto: Håkan Dahlström/Flickr
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Logo após a Organização do Tratado do Atlântico Norte, a Otan, oficializar a entrada da Finlândia na aliança, o presidente do país nórdico, Sauli Niinisto, afirmou que trabalhará “incansavelmente” para garantir que a vizinha Suécia siga o mesmo caminho.

“A adesão da Finlândia não está completa sem a adesão da Suécia. O trabalho para a adesão antecipada da Suécia continua incessantemente”, declarou o presidente.

A aceitação da Finlândia na Otan e a tentativa de acordo para a entrada da Suécia são movimentos geopolíticos estratégicos no contexto do prolongamento da guerra entre Rússia e Ucrânia. Abaixo, CartaCapital explica o que motiva a entrada de um país historicamente neutro como a Suécia na aliança militar e o status das negociações para a adesão.

Neutralidade sueca sob risco

No início de 2022, devido ao tensionamento escalonado pelo conflito entre Rússia e Ucrânia, tanques do Exército da Suécia começaram a patrulhar ilhas no Mar Báltico, em resposta a atividades militares da Rússia na região. Era um dos primeiros indicativos de que Estocolmo poderia começar a abrir mão de uma postura neutra em relação a questões militares, com o objetivo declarado de defender o próprio território.

A Suécia manteve uma neutralidade militar desde as guerras napoleônicas, há mais de duzentos anos. Além de questões puramente estratégicas, o modelo demonstrou enraizamento cultural na população e nas instituições democráticas. O país manteve-se neutro, por exemplo, durante a 2ª Guerra Mundial e a Guerra Fria. Em 1995, aderiu à União Europeia, o que exigiu uma renúncia formal à neutralidade. Na prática, o país não se envolveu, desde então, com conflitos militares e chegou a recusar propostas de ingressar na Otan.

Tudo isso mudou depois de a Rússia invadir a Ucrânia, em fevereiro do ano passado. Vale destacar que a Suécia não faz fronteira diretamente com a Rússia, mas, com a ambição do Kremlin de direcionar críticas ao Ocidente como um todo, limites territoriais passaram a ter outra dimensão.

Em maio de 2022, a Suécia enviou, em conjunto com a Finlândia, um pedido de adesão à Otan. No início de julho, os membros da aliança deram início ao processo formal de adesão dos países.

Para se ter ideia da mudança de percepção dos suecos sobre o tema, as pesquisas nacionais apontavam, nas últimas duas décadas, que o apoio público à adesão à Otan era minoritário na população. Em janeiro deste ano, porém, segundo a rede Al Jazeera, 63% dos suecos se disseram satisfeitos com a decisão de aderir à aliança. No caso dos finlandeses, o número chegou a 82% em fevereiro, de acordo com a agência AFP.

O fato de a Suécia ter se mantido neutra durante a 2ª Guerra Mundial e no curso da Guerra Fria e de abrir mão dessa condição na guerra entre Rússia e Ucrânia fala tanto sobre as mudanças em curso na própria Suécia, quanto sobre os significados do conflito atual. Marcada por incertezas no longo prazo, a guerra na Ucrânia convenceu a comunidade internacional do seu poder de redefinir a correlação de forças políticas no globo.

As negociações para a entrada da Suécia

Para a Suécia aderir, finalmente, à Otan, dois entraves precisam ser resolvidos: a aceitação por parte da Turquia e uma sinalização positiva da Hungria, outros dois países membros da aliança.

Em março, o presidente da Turquia, Recep Erdogan, e o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán – ambos de extrema-direita -, pediram, após meses de negociação, que a candidatura da Finlândia à Otan fosse ratificada. Por outro lado, adiaram a candidatura sueca.

Do lado da Hungria, há queixas sobre as críticas que a Suécia faz ao primeiro-ministro, cuja atuação política vem deteriorando os arranjos democráticos. O caso da Turquia, por sua vez, é mais complexo.

Desde que a Suécia apresentou o pedido de adesão, a Turquia vem negando atender à demanda. Para que um país passe a compor a Otan, é necessário que todos os Estados-membros da aliança aprovem a iniciativa.

A Turquia acusa a Suécia de extraditar cidadão turcos, já tendo ameaçado processar o país por terrorismo. As acusações são de que a Suécia estaria oferecendo refúgio para membros do Partido dos Trabalhadores do Curdistão. Em janeiro deste ano, as negociações foram suspensas, após manifestantes terem queimado o Alcorão em Estocolmo.

Ao comentar a formalização da adesão da Finlândia à Otan, o ministro das Relações Exteriores da Suécia, Tobias Billströn, afirmou que a medida “fortalece a segurança da Suécia, por isso estamos todos muito satisfeitos”.

“No entanto, ainda não conseguimos a ratificação da Hungria e da Turquia”, lamentou.

Até o momento, não há previsão de votação nos parlamentos da Turquia e da Suécia sobre a questão. Enquanto isso, o presidente da Otan, Jens Stoltenberg, vem afirmando que a entrada da Suécia é uma prioridade.

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