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Memorial do Holocausto em Paris expõe o inferno dos homossexuais na Europa nazista

LGBTs faziam parte do grupo dos chamados ‘degenerados’, perseguidos intensamente pelo regime de Adolf Hitler

Regime de Adolf Hitler perseguia minorias sociais.
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Surrados, deportados, estuprados coletivamente e cobaias de experimentos nazistas. Degradados até a última instância do regime de Adolf Hitler, os homossexuais e lésbicas conseguiram, no entanto, ao longo do tempo, transformar o triângulo rosa invertido que os identificava nos campos de concentração em símbolo máximo da resistência do movimento LGBTQI+ no mundo.

Grande parte dessa história, ou melhor, dessa memória, é contada numa exposição especial em cartaz no Memorial do Holocausto de Paris.

A diretora de atividades culturais do Memorial do Holocausto de Paris, Sophie Nagiscarde, lembra que os homossexuais e lésbicas faziam parte do grupo dos chamados “degenerados”, perseguidos intensamente pela ideologia nazista.

“Já havia alguns anos que queríamos abordar essa temática, sobretudo porque trabalhamos com o Holocausto, que é a nosso principal foco de estudo. Mas entender como e por que chegamos ao Holocausto é também compreender a ideologia nazista”, resume Nagiscarde.

“No centro da ideologia nazista, os judeus são evidentemente a primeira obsessão racial, em particular de Adolf Hitler, mas existem outras vítimas de primeira hora como os portadores de deficiência e os homossexuais”, lembra a diretora.

No entanto, Sophie Nagiscarde sublinha que homossexuais e lésbicas já eram perseguidos muito antes do advento do Nazismo.

“Os homossexuais já eram visados pela lei antes da chegada do regime nazista ao poder na Alemanha porque desde 1871 o Código Penal alemão reprimia a homossexualidade através do famoso parágrafo 175”, considera. “Mais foi verdadeiramente durante o período nazista que vimos uma aceleração das perseguições extremamente significativa, perseguições que continuaram depois da guerra, uma vez que esse parágrafo 175 só foi abolido na República Democrática Alemã depois de Maio de 68, e em 1969 no leste da Alemanha”, diz.

Para a diretora do Memorial do Holocausto, é interessante notar também as reações poderosas ao nazismo demonstradas pelas personalidades da época.

“O que achei particularmente interessante foi o surgimento, a partir do fim do século 19, início do século 20, das primeiras associações em defesa dos direitos dos homossexuais que irão, naturalmente, tentar acabar com o parágrafo 175, com a participação de uma personalidade famosa como Magnus Hirschfeld, diretor do Instituto de Sexologia que existia na época em Berlim, mas também através da arte, do espetáculo, conhecemos, por exemplo, toda a militância dos artistas do Cabaré berlinense; havia um aumento da visibilidade homossexual, mas que continuava, é claro, marginal, porque a sociedade continuava hostil em sua maioria”, detalha.

Do triângulo rosa invertido dos campos de concentração nazistas ao triângulo rosa do Orgulho Gay, presente em grupos históricos de resistência e luta homossexual, como o Act Up [da luta contra a AIDS nos anos 1980 e pela visibilidade LGBTIQ+], a exposição mostra também a transformação do símbolo nazista em imagem de resistência.

“Vimos na Alemanha do pós-guerra que a homossexualidade continuou a ser perseguida, o que significa que se poderia ir para a prisão, mesmo que não se tratasse mais de um campo de concentração. Demoramos enquanto sociedade quase 100 anos para mudar isso”, diz Nagiscarde.

“Somente nos anos 1960 e 70 conseguimos mudar a lei, sendo que, na França, mesmo se a homossexualidade era descriminalizada desde 1791, mas havia um parágrafo incluído durante o período da Ocupação nazista que aumentava para 21 anos a idade da maioridade sexual entre pessoas do mesmo sexo. As associações francesas lutaram para retirar esse parágrafo da lei, o que finalmente aconteceu em 1982”, lembra a diretora.

“Me marcou também essa ambiguidade sexual das imagens homoeróticas produzidas por gente como Leni Riefenstahl, e esses grupos masculinos como os da Juventude Hitlerista, e também a presença de homossexuais notórios dentro das tropas nazistas”, destaca a programadora. “Acho muito interessante também o fato de que, na ideologia racial ariana, de um povo eleito, ser homossexual ou lésbica não entrava nos planos do regime nazista. O homossexual era considerado degenerado de um ponto de vista médico da raça ariana”, aponta.

A exposição Homossexuais e Lésbicas na Europa Nazista fica em cartaz no Memorial do Holocausto de Paris até 22 de maio de 2022.

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