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Lula vence o 1º tempo, mas o jogo com Trump é longo e sujo

Embora o clima hostil tenha sido revertido na Malásia, ainda é cedo para falar em amizade

Lula vence o 1º tempo, mas o jogo com Trump é longo e sujo
Lula vence o 1º tempo, mas o jogo com Trump é longo e sujo
Donald Trump e Lula na Malásia, em 26 de outubro de 2025. Foto: Ricardo Stuckert/PR
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva venceu o primeiro tempo do jogo com seu homólogo norte-americano, Donald Trump. Não foi achincalhado em público, como ocorreu antes com dois outros chefes de Estado supostamente aliados dos EUA – o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, que, em março, teve até suas roupas criticadas no meio do Salão Oval da Casa Branca; e o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, confrontado, em maio, nas frentes da TV, com a absurda acusação de que promove ou pelo menos tolera um suposto “genocídio” contra os brancos na África do Sul.

Trump não teria pudor em atropelar Lula com os mesmos disparates, como fez com os outros, especialmente depois de ter publicado, em 9 de julho, em suas redes sociais, uma carta abertamente inamistosa, na qual anunciou a imposição de 50% de taxa sobre produtos brasileiros e disse que os processos contra o ex-presidente Jair Bolsonaro seriam uma “vergonha internacional”. O tom, que já não era bom, escalou e se espalhou negativamente por toda a América do Sul – uma zona sabidamente de influência e interesse do Brasil –, com o assassinato de mais de 30 pessoas nos mares do Caribe e a chegada do maior porta-aviões da esquadra norte-americana à região, além das ameaças diretas feitas aos presidentes da Venezuela, Nicolás Maduro, e da Colômbia, Gustavo Petro — membros da mesma esquerda à qual Lula pertence, apesar das muitas nuances.

Mesmo com tudo isso, o encontro em Kuala Lumpur, no domingo 26, não apenas ocorreu sem as extravagâncias grosseiras às quais Trump gosta de se dar, como ainda produziu imagens de descontração e simpatia, com Lula demonstrando estar muito à vontade, numa linguagem corporal solta e segura de si – o que, se bem não chega a transcender internacionalmente, enquanto imagem, é eficiente o bastante para o consumo interno. Ainda mais diante de um bolsonarismo que vinha contando vantagem, como se tivesse nas mãos o apito que fazia os cachorros da Casa Branca avançarem contra o presidente brasileiro quando bem quisessem.

Reunião entre Donald Trump e Lula na Malásia, em 26 de outubro de 2025. Foto: Ricardo Stuckert/PR

Só que o jogo com Trump é longo e sujo. Para vencer, Lula terá de conseguir reduzir as tarifas e derrubar as sanções que foram impostas contra autoridades judiciais brasileiras. Além disso, precisa afastar a ameaça militar americana contra a Venezuela e tem de refrear as agressões à Colômbia. Não porque Maduro e Petro sejam figuras exemplares, mas porque não se pode tolerar o tipo de hostilidade que Trump vem impondo à região como um todo. Apenas se alcançar esses objetivos é que Lula de fato poderá clamar vitória e receber os louros que seus apoiadores tentam, desde já, lançar-lhe sobre a cabeça.

Não é pouco, nem é fácil. Além disso, Lula não deve esquecer que a extrema-direita à qual Trump e Bolsonaro pertencem voltará a questionar o sistema eleitoral do Brasil no ano que vem, assim como seguirá fazendo isso também nos EUA, sempre que houver risco de derrota. Portanto, qualquer simpatia circunstancial de Trump por Lula, assim como qualquer ganho comercial na relação bilateral, não pode esconder o fato de que o movimento ao qual o presidente norte-americano pertence é essencialmente avesso ao que Lula representa, e o momento internacional é de choque frontal entre esses dois modelos.

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