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Lula pede ‘bom senso’ em dia de tensão que envolve Venezuela e Guiana; entenda o que está em jogo

O presidente disse ser necessário ‘trabalhar com muita disposição de melhorar a vida do povo, não ficar inventando história’

Mural sobre referendo na Venezuela marcado para 3 de dezembro de 2023. Foto: Federico Parra/AFP
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O presidente Lula (PT) pediu “bom senso” neste domingo 3, em meio a um novo foco de tensão na América do Sul. Nas próximas horas, a Venezuela promoverá um referendo por meio do qual sua população decidirá se apoia a incrporação da região de Essequibo, hoje controlada pela Guiana.

Antes de embarcar para a Alemanha, em seu giro internacional marcado pela ida à COP28, nos Emirados Árabes Unidos, Lula disse que a América do Sul não precisa de “confusão”.

“Não se pode ficar pensando em briga. Espero que o bom senso prevaleça, do lado da Venezuela e do lada Guiana”, disse o presidente. “A humanidade deveria ter medo de guerra. Só faz guerra quando falta bom senso. Vale mais a pena uma conversa do que uma guerra.”

Ele também afirmou ser necessário “trabalhar com muita disposição de melhorar a vida do povo, e não ficar pensando em briga, não ficar inventando história”.

Na sexta-feira 1º, a Corte Internacional de Justiça determinou, sem fazer referência explícita ao referendo, que a Venezuela deve “se abster de qualquer ação que modifique a situação atualmente em vigor no território em disputa”. Caracas, porém, rejeita a jurisdição do máximo órgão judicial da ONU.

Quais consequências pode ter a consulta? Confira quatro pontos-chave para entender o conflito.

A disputa

Chamado de Guiana Essequiba na Venezuela, o território de 160 mil km² é administrado pela Guiana, apesar da antiga reivindicação venezuelana. Possui depósitos de petróleo e minerais, bacias hidrográficas ricas e as famosas cataratas Kaieteur.

Localizada a oeste do rio Essequibo, a região representa mais de 70% do território da Guiana e seus 125 mil habitantes – pouco mais de 15% dos 800 mil de todo o país – falam inglês.

Georgetown defende uma fronteira definida em 1899 por um tribunal de arbitragem e agora recorre à Corte Internacional de Justiça para validá-la.

Caracas, por sua vez, argumenta que o rio é a fronteira natural, como foi em 1777, quando era Capitania Geral do império espanhol. Apela ao Acordo de Genebra, assinado em 1966, antes da independência da Guiana do Reino Unido, que anula a decisão anterior e estabelece as bases para uma solução negociada.

O referendo

O referendo consultivo, não vinculante, apresenta cinco perguntas que abrangem desde o reconhecimento da jurisdição da CIJ – que a Venezuela nega, embora tenha aceitado a contragosto comparecer ao tribunal para se defender – até a criação de uma província venezuelana naquela área e a concessão de nacionalidade aos seus habitantes.

Não é um voto de autodeterminação: os essequibanos têm documentos guianenses.

O “sim” deve vencer de forma avassaladora, sem oposição, e embora a consulta não tenha consequências legais, as autoridades esperam que ela reforce a reivindicação territorial.

“Está surgindo a união de todos os venezuelanos em um grande consenso: defender a Venezuela”, disse o presidente Nicolás Maduro na quarta-feira em um evento político.

“Há um elemento de política interna com a hipermidiatização” da campanha pelo referendo, a um ano das eleições presidenciais, dizem fontes diplomáticas à agência AFP. “Mas é igualmente uma demanda histórica que transcende os partidos.”

A Guiana considera que o referendo é uma “violação das leis internacionais”.

O petróleo

A Guiana anunciou uma importante descoberta de petróleo no Essequibo, que adiciona pelo menos 10 bilhões de barris às reservas do país, tornando-as maiores que as do Kuwait.

Maduro chamou seu colega guianense, Irfaan Ali, de “escravo” da gigante petrolífera americana ExxonMobil.

O referendo foi convocado depois que, em agosto, Georgetown abriu uma licitação para poços de petróleo na área, provocando a ira de seu vizinho.

Guerra?

O lema “O Essequibo é nosso” aparece sempre na televisão e enche os muros nas ruas. Muitos analistas estabelecem paralelos com a Argentina e as Malvinas.

A Guiana, no entanto, insiste em que não cederá “uma palha de grama” à Venezuela, inspirada em uma música da banda The Tradewinds, que fala em “não recuar, não ceder nem uma montanha” quando “forasteiros falam em invadir”.

O tom está subindo. A Venezuela constrói uma pista militar perto da fronteira, e a Guiana propõe estabelecer bases de aliados estrangeiros na área.

Pode acabar em conflito? “É um cenário”, diz à agência AFP Josmar Fernández, especialista em resolução de conflitos. “Quando se fala em território, estamos falando também de um compromisso em que estão impregnados sentimentos nacionalistas”, embora “a Venezuela tenha se caracterizado tradicionalmente pela negociação”.

Maduro fala em “diplomacia de paz”. Ali pede “bom senso”.

(Com informações da AFP)

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