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José Sócrates: “É lamentável que a União Europeia não condene o ataque dos EUA ao Irã”

Ex-primeiro ministro de Portugal considera a morte do general iraniano Qasem Soleimani um ato covarde de selvageria

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O ataque dos Estados Unidos contra o Irã, ocorrido no Iraque na sexta-feira 03, colocou o mundo em alerta para o aprofundamento da crise entre as duas nações. Os americanos justificam o ataque que matou um dos líderes iranianos, o general Qasem Soleimani, dizendo que sofriam ameaças do militar. Já o Irã promete vingança ao Estado norte americano, sem revelar como pretende agir.

Nessa disputa, alguns países já se posicionaram em defesa dos iranianos, caso da China e da Rússia, mas várias outras nações e blocos, como a União Europeia (UE), se limitaram apenas em pedir paz e diplomacia. No caso da UE, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, não condenou categoricamente o ataque americano e se limitou a dizer que “uma escalada [de violência] deve ser evitada a todo custo”.

Para o ex-primeiro ministro português José Sócrates, esta não deveria ter sido a postura do bloco. “É um grave problema. Foi uma violação do direito internacional gravíssima. Mataram um dirigente de um país que consideravam inimigo. Trata-se de um ato de selvageria. Como que é o mundo reage a isso?”, questionou, em entrevista exclusiva à CartaCapital.

“Se a Europa não condena a ação de um país que mata um signatário de um outro, ela está, no fundo, normalizando a situação, abrindo um precedente gravíssimo. Isso é abrir as portas do inferno. É jogar no lixo décadas de construção de um direito internacional que todos aceitaram, inclusive os EUA”, acrescentou Sócrates.

O ex-primeiro ministro também criticou a posição da Organização das Nações Unidas (ONU), que se limitou a pedir moderação aos líderes. “A ONU deveria considerar ilegal este ato, mas ainda não o fez. É preciso condenar este ato unilateral de selvageria, de matar um líder de um outro país, violando todas as regras internacionais”, pediu.

Consequências econômicas

Com o ataque aéreo, o preço do petróleo subiu para seu maior nível em mais de três meses. O tipo Brent fechou em alta de 3,6%, maior valor desde meados de setembro, quando instalações petrolíferas da Arábia Saudita sofreram ataques. O Iraque, segundo maior produtor da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), exporta cerca de 3,4 milhões de barris de petróleo bruto por dia.

Sócrates vê a crise entre os países como algo perigoso para a economia global, em especial para a União Europeia, que importa muito petróleo. Mesmo assim, ele considera que o bloco deveria ter se posicionado com mais firmeza. “De qualquer forma, isso é pouco significativo. O fato em si já afetará o clima geral de estabilidade do mundo e a economia sofrerá”, analisa.

Para o político, no entanto, os maiores prejudicados com o ataque serão os próprios americanos. “Eles deram um tiro de canhão na sua própria credibilidade. Eles precisam assumir o erro e serem responsabilizados”, defende. “Não é só o presidente Trump quem tomou a decisão, diversas instâncias que autorizaram o ataque. Espero que isso não comece uma guerra e torço para que todos saibam medir os passos que vão dar a partir de agora. Tudo isso é um agravo.”

Guerra ao terror

Durante a conversa com CartaCapital, José Sócrates deu detalhes sobre seu novo livro, cujo tema será a guerra ao terror e a utilização de drones em ataques militares, prática que começou durante o governo Barack Obama e tem se intensificado.

Para o ex-primeiro ministro português, essa nova ofensiva americana com aviões não tripulados é “infame e covarde”. “Esse novo tipo de arma tem uma característica diferente: ela permite que você não se exponha. Permite matar quem quer que seja sem ser visto”, explica.

“No fundo, trata-se de uma execução extrajudicial ilegal, feita de uma forma covarde, à distância, sem que o adversário se exponha. Uma luta feita com a proteção de uma das partes”, analisa Sócrates, que acredita que o combate ao terror, que teve início a partir do ataque às torres gêmeas de Nova Iorque, fracassou e tem desestabilizado a democracia no planeta.

“Hoje, há mais terrorismo do que há 18 anos, e ele é mais disperso e global do que antes. Além disso, também temos mais refugiados do que nunca. Isso cria e aprofunda crises políticas e afeta a democracia de diversos países”, explica. “A guerra contra o terror é uma guerra que não deu certo. O combate ao terrorismo é mais danoso às democracias do que o próprio terrorismo.”

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