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Jerusalém, uma cidade sob tensão

Desde o ataque a uma sinagoga, em novembro, a cidade vive a expectativa de novos atos de violência. Palestinos e israelenses contam as dificuldades de viver sob essa tensão

Turistas tiram fotos da vista panorâmica de Jerusalém em 27 de novembro de 2014
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No centro de Jerusalém Ocidental, a vida prossegue quase normalmente, mas as tensões que abalaram a cidade nas últimas semanas ainda estão no ar. Gilbert Glanz, um israelense de Jerusalém, caminha para uma reunião de pais na escola em que seus filhos estudam, no lado ocidental da cidade. Nas últimas semanas, ele se preocupa com a segurança.

“Tenho flashes de memória do passado, de como a situação era anos atrás”, afirma. “Agora, ando armado e me asseguro de que os portões estejam fechados após levar minhas crianças à escola. Também deixamos de ir à noite a áreas mais movimentadas.”

Desde o ataque a uma sinagoga em meados de novembro, quando quatro rabinos e um policial foram mortos por dois palestinos, as tensões em Jerusalém estão perto de atingir o ponto máximo.

Antes desse incidente, dois ataques a passageiros em estações de metrô em Jerusalém causaram a morte de ao menos três israelenses. Além disso, a tentativa de assassinato de Yehuda Glick, uma religiosa fundamentalista judia de extrema direita, levou ao fechamento temporário e sem precedentes da mesquita de Al Aqsa, na Cidade Velha, um local sagrado para palestinos e muçulmanos.

“O problema é que nunca se sabe quando virão os ataques. Não é algo organizado por um grupo político, da forma como conhecemos. Pode ser qualquer um, pode acontecer em qualquer lugar”, diz Glanz.

As autoridades israelenses aumentaram as medidas de segurança e relaxaram as restrições aos oficiais reservistas, permitindo que portem armas. Kinnaret Milgrom, uma jovem mãe israelense que aguarda seu filho em frente ao portão da escola, diz não acreditar que novas medidas de segurança possam acalmar a situação, uma vez que ninguém está olhando para as causas do problema.

“Não acho que [o problema] irá passar. Acho que a maioria dos residentes de Jerusalém Ocidental não sabe como é a situação para os palestinos na parte oeste da cidade”, afirma. “Eles [os palestinos] deveriam ser considerados cidadãos plenos e receber direitos iguais. Isso seria o melhor para todos. O momento atual é muito assustador, não os culpo por estarem irritados. Isso faz com que seja muito difícil proteger minhas crianças, porque não sei do que tenho que protegê-las”, diz Milgrom.

Pela cidade, as tensões tiveram impactos diversos. Os restaurantes e as lojas em Jerusalém Ocidental continuam lotados, mas as regiões ocupadas na parte oeste e leste da cidade parecem mais divididas do que nunca. Em alguns dias, balões brancos de observação operados pelas autoridades israelenses podem ser vistos sobrevoando Jerusalém Oriental e a Cidade Velha.

Com exceção do último ataque mortal à sinagoga de Har Nof, a maioria das brigas entre palestinos e israelenses ocorreram na divisa entre o leste ocupado e o oeste. A linha de metrô que passa por essa divisa já foi vandalizada.

Blocos de concreto foram colocados sobre as plataformas para impedir que carros atropelem passageiros que aguardam o embarque. Há uma sensação de ansiedade, mas também de raiva, entre alguns dos passageiros israelenses.

“Claro que tenho medo, sempre penso duas vezes antes de usar o metrô, mas não tenho outra escolha”, afirma uma passageira israelense, que preferiu não se identificar. “Acho que o governo deveria reagir com mais firmeza”, acrescentou. “Não é possível que os árabes continuem a nos aterrorizar.”

Kamal Abu Saloum, um jovem palestino de Jerusalém, de 26 anos, pode ver a mesquita Al Aqsa de sua casa, na parte externa da muralha da Cidade Velha, próxima ao bairro de Silwan. Pai de duas crianças pequenas, ele tenta explicar a situação.

“Acho que há muita frustração entre os jovens. As pessoas se sentem sufocadas. Existe a questão da mesquita de Al Aqsa, onde não nos permitem ir rezar quando quisermos, ou os postos de controle [do Exército de Israel], onde as pessoas são humilhadas ou insultadas. Não quero atirar pedras nem ferir ninguém, mas as pessoas estão muito frustradas.”

O jovem costumava trabalhar como faxineiro em diferentes empresas israelenses, no lado ocidental da cidade, mas não se sente mais seguro para atravessar a cidade e ir ao trabalho, temendo ser atacado por extremistas judeus. “Há muitas opiniões extremas e muito ódio entre as pessoas”, conta Abu Saloum.

Seus sentimentos são compartilhados em Salah El Eddin, a movimentada rua de compras no coração da Jerusalém Oriental. Amal El Dweik, uma palestina de Jerusalém que vai às compras com seus filhos, conta que há um grande mal estar entre as pessoas, em razão dos acontecimentos. Há sempre o medo de ataques motivados por vingança. “Meu filho já nem gosta mais de sair para comprar algo nas lojas, de medo que alguns colonos judeus possam insultá-lo ou atacá-lo.”

Nunca houve muita interação entre as duas partes da cidade – os israelenses raramente vão ao lado leste em razão das preocupações com a segurança. Mas, ultimamente, israelenses e palestinos de Jerusalém parecem estar mais divididos do que nunca.

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