Centenas de milhares de palestinos retornaram neste sábado (11) à Cidade de Gaza devastada, enquanto o Hamas advertiu que a próxima fase do plano de paz do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, será mais difícil que a primeira.
O enviado de Trump para o Oriente Médio, Steve Witkoff, prometeu às famílias dos reféns israelenses que seus entes queridos estarão de volta na segunda-feira, e Brad Cooper, o principal comandante militar dos Estados Unidos para o Oriente Médio, visitou Gaza um dia após o início do cessar-fogo.
Está previsto que Israel e o Hamas realizem uma troca de reféns e prisioneiros, dois anos após o ataque do grupo islamista palestino em 7 de outubro de 2023, que desencadeou a ofensiva israelense em Gaza, na qual morreram mais de 67 mil palestinos.
Mas, após o intercâmbio de prisioneiros e a retirada parcial de Israel, os mediadores do conflito liderados pelos Estados Unidos terão de garantir uma solução política de longo prazo que leve o Hamas a entregar suas armas e renunciar ao governo na Faixa de Gaza.
Em uma entrevista à AFP no Catar, Husam Badran, membro do comitê político do Hamas, advertiu que “a segunda fase do plano de Trump, como se depreende claramente de seus próprios pontos, implica que as negociações sejam mais complexas e difíceis”.
Badran afirmou ainda que o Hamas não participará da assinatura formal do acordo de paz de Gaza no Egito, onde líderes internacionais se reunirão na segunda-feira para discutir a implementação da primeira fase do cessar-fogo.
O Hamas também resiste ao desarmamento previsto no plano de paz de Trump. “A proposta de entregar as armas está fora de questão e não é negociável”, disse à AFP um alto dirigente do movimento palestino sob condição de anonimato.
Badran afirmou que, embora o grupo não queira guerra, se Israel voltar a atacar o povo palestino, “as forças de resistência, sem dúvida, (…) usarão todas as suas capacidades para repelir essa agressão”.
Força multinacional
Segundo o plano de Trump, à medida que o Exército israelense se retirar de Gaza, será substituído por uma força multinacional composta por Egito, Catar, Turquia e Emirados Árabes Unidos, coordenada por um centro de comando dirigido pelos Estados Unidos em Israel.
O almirante Brad Cooper, chefe do Comando Central dos Estados Unidos (Centcom), o enviado especial Steve Witkoff e o genro de Trump, Jared Kushner, visitaram Gaza neste sábado para planejar a próxima fase da trégua junto com o chefe do Exército israelense, Eyal Zamir.
Witkoff, Kushner e a filha de Trump, Ivanka, seguiram depois para Tel Aviv para participar de uma vigília com as famílias dos reféns israelenses que ainda estão cativos em Gaza. Uma grande multidão os recebeu com aplausos e gritos de “Obrigado, Trump!”. “Sua coragem comoveu o mundo”, declarou Witkoff às famílias, prometendo que os reféns “voltarão para casa”.
Einav Zangauker, cuja filho Matan é um dos cerca de 20 reféns que se acredita estarem vivos, prometeu que as famílias continuarão “gritando e lutando até que todos estejam de volta”.
O Hamas tem até segunda-feira ao meio-dia para entregar os 47 reféns israelenses restantes, vivos e mortos, dos 251 sequestrados há dois anos.
Em troca, Israel libertará 250 prisioneiros — entre eles alguns que cumprem prisão perpétua por ataques mortais contra israelenses — e 1.700 gazenses detidos pelo exército desde o início da guerra. O serviço penitenciário israelense informou neste sábado que transferiu os 250 prisioneiros palestinos para as prisões de Ofer, na Cisjordânia ocupada, e Ketziot, no deserto de Neguev, no sul de Israel, antes da entrega.
“Fiquei de pé diante dela e chorei”
Um responsável da Defesa Civil de Gaza, organização de primeiros socorros que opera sob a autoridade do governo do Hamas, informou neste sábado que mais de 500 mil pessoas retornaram à Cidade de Gaza desde o início do cessar-fogo.
“Andamos durante horas”, contou à AFP Raja Salmi, de 52 anos. Quando finalmente chegou ao seu bairro, descobriu que sua casa havia se reduzido a um monte de escombros. “Fiquei de pé diante dela e chorei. Todas as minhas lembranças não passam de pó”, disse. Na cidade onde, segundo a ONU, viviam cerca de um milhão de pessoas, muitos edifícios estão destruídos.
O Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (Ocha) afirmou que Israel deu luz verde para a entrega de 170 mil toneladas de ajuda, caso o cessar-fogo seja mantido.
Homens, mulheres e crianças vagavam por ruas cheias de escombros, em busca do que restava de seus lares. Embora alguns tenham retornado em veículos, a maioria caminhou, carregando seus pertences em sacolas amarradas aos ombros.Sami Musa, de 28 anos, voltou apenas para examinar o estado da casa de sua família. “Graças a Deus (…) descobri que nossa casa ainda está de pé”, disse Musa à AFP. “Não parecia a Cidade de Gaza, e sim uma cidade fantasma”, acrescentou.
A guerra começou após o ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023, que resultou na morte de 1.219 pessoas em Israel, em sua maioria civis, segundo um levantamento da AFP baseado em números oficiais israelenses. A ofensiva israelense lançada em Gaza em resposta ao ataque matou pelo menos 67.682 pessoas, de acordo com o Ministério da Saúde do território controlado pelo Hamas, números considerados críveis pela ONU.