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Guerra na Ucrânia completa três meses e forças russas se concentram na conquista do leste do país

Para especialistas, Moscou passou de uma tentativa de invasão completa da Ucrânia, no início da guerra, a um objetivo de conquista parcial do território

Soldado ucraniano examina um veículo de infantaria russo destruído após combate em Kharkiv (Foto: Sergey BOBOK/AFP)
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Depois de Mariupol, no sudeste, e Kherson, no sul, a Ucrânia pode perder localidades do leste, mas continua resistindo. A guerra completa três meses nesta terça-feira (24), com poucas esperanças de que as tropas ucranianas consigam manter a totalidade da região do Donbass.

As forças da Ucrânia enfrentam dificuldades no leste, especialmente na região de Lugansk, onde a Rússia afirma que está no ponto de ter o controle total. Severodonetsk, ponto crucial na batalha pelo Donbass, é bombardeada sem trégua, “24 horas por dia”, afirma o governador da região de Lugansk, Sergei Gaidai.

Muitos especialistas comparam a situação de Severodonetsk a Mariupol, com um cenário apocalíptico após várias semanas de cerco. Os bairros da cidade viraram pilhas de escombros, com edifícios destruídos por mísseis.

“Utilizam a tática de terra arrasada, com a destruição deliberada da cidade, bombardeios aéreos, lança-foguetes múltiplos, morteiros ou tanques que disparam contra os edifícios”, diz o Gaidai.

Segundo o governador, na tentativa de tomar pontos importantes do leste, “todas as forças russas estão concentradas nas regiões de Lugansk e Donetsk”. Moscou desloca unidades da região de Kharkiv, no norte, soldados que participaram no cerco de Mariupol, no sudeste, milícias das repúblicas separatistas de Donetsk e Lugansk, tropas chechenas e unidades mobilizadas na Sibéria e no extremo oriente russo, indicou.

Primeiro Severodonetsk, depois Lyssychansk

Acompanhada por membros das forças separatistas pró-russas, a enviada especial da RFI à Lugansk, Anissa El Jabri, presenciou a movimentação das tropas em Roubijne, a alguns quilômetros de Severodonetsk. No local, circulam apenas caminhões militares, todos eles com a inscrição Z, indicando a “operação especial” russa.

“A tomada do controle das cidades será nesta ordem: primeiro Severodonetsk, depois Lyssychansk. Em seguida, Kramatosk et Sloviansk”, diz um comandante pró-russo, em entrevista à RFI em Roubijne. “Acontecerá em breve, eu acho. Para ser mais preciso, em algumas semanas, no máximo”, garante.

Raros são os civis que circulam pelas ruas de Roubijne. Quando as caixas de ajuda humanitária de uma ONG russa chegam, as pessoas deixam rapidamente os porões e abrigos, afirmando estarem completamente desconectados do mundo. A única fonte de informação, segundo um habitante, são alguns soldados “que deixam escapar uma ou duas palavra de vez em quando”, afirma um morador.

“Não sabemos de nada. A rádio e a TV não funcionam, não temos internet. Não estamos sabendo de nada sobre o que acontece em Mariupol ou Lysychansk”, diz sua esposa. “Penso que em todas as cidades deve ser a mesma coisa. Eles tomaram Roubijne e devem estar em Severodonetsk porque querem que o Donbass faça parte da Rússia. Não temos nada de bom para esperar”, reitera.

Técnica da época soviética

Para Julien Théron, professor de conflito e segurança internacional na Sciences Po de Paris, a conquista de Severodonetsk e Lyssychansk é importante porque elas se localizam “na ponta do território ucraniano”. Ele explica que a Rússia utiliza uma técnica “clássica” desde a época soviética de “dominar territórios em forma de triângulos”.

“As forças russas tentaram fechar um grande triângulo entre Kharkiv e Zaporijia. A Rússia quer cercar zonas onde estão os soldados ucranianos. E esse avanço [em Severodonetsk e Lyssychansk] é um combate frontal na ponta do triângulo”, explica.

Já o especialista em geopolítica Ulrich Bounat aponta que Moscou passou de uma tentativa de invasão completa da Ucrânia, no início da guerra, a um objetivo de conquista parcial do território. “Por isso os esforços da Rússia estão concentrados nesta zona, enquanto as forças ucranianas resistem também. O poder os bombardeios russos é tão importante que, devastando as cidades, eles avançam, mas de forma ainda lenta”, observa.

Para ambos os especialistas, a conquista da região pela Rússia ainda não deve ser considerada certa. “Podemos perceber que nos vários batalhões de defesa territorial, civis treinados pelo exército ucraniano estão bem preparados e engajados no front. Boa parte da população mergulhou no centro dos combates e essa é uma estratégia de sucesso. Há avanços russos, claro, mas isso não é um presságio de vitória por enquanto”, avalia.

 

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