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Governo Maduro completa um ano de crises

Eleito em 15 de abril de 2013, Maduro é cada vez mais pressionado pela oposição, mas não dá sinais de que vá recuar. Por Renan Truffi

Governo Maduro completa um ano de crises
Governo Maduro completa um ano de crises
Apesar das crises, presidente venezuelano topou dialogar com a oposição e não dá sinais de que vai deixar o poder
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Um ano depois de vencer as eleições presidenciais da Venezuela, Nicolás Maduro, designado por Hugo Chávez como seu sucessor político, tem no período à frente do Palácio Miraflores uma coleção de crises. Algumas delas foram iniciadas antes mesmo de Maduro assumir a cadeira deixada pelo “comandante”, mas a mais grave teve início nos últimos meses. No aniversário de seu primeiro ano no cargo, Maduro se vê em meio a uma negociação, mediada pelo Vaticano e pela União das Nações Sul-Americanas (Unasul), na qual a oposição questiona a legitimidade de seu mandato.

Os problemas para o presidente venezuelano começaram assim que ele foi declarado eleito. Na época, o período de tensão foi criado pela oposição, que questionou o resultado das urnas. Grupos simpáticos ao opositor Henrique Capriles Radonski (que teve 49,07% dos votos, contra 50,66% de Maduro) foram às ruas contra o presidente recém-eleito pedindo uma recontagem dos votos. Os atos deixaram oito mortos, entre opositores e simpatizantes do governo. O episódio foi só uma prévia dos conflitos que viriam a tomar conta do noticiário internacional a respeito do governo chavista.

A insatisfação de uma oposição que não aceitou a derrota, combinada com uma situação econômica crítica, pela qual passa o país, deu a tônica dos meses seguintes. Isso porque a Venezuela enfrenta escassez de produtos básicos, como frango, leite e papel higiênico; inflação de 54,3 % no acumulado de um ano e uma das piores taxas de homicídio do mundo, com de 53,7 mortes a cada 100 mil habitantes. Para piorar, o dólar no mercado paralelo chega a ser comercializado a mais de 50 bolívares.

É neste cenário que Maduro tenta dar uma cara ao seu governo. Em meio às crises, o presidente venezuelano conseguiu implantar poucas medidas de grande impacto em seus primeiros 12 meses. E as poucas respostas a esses problemas só saíram depois que Assembleia Nacional aprovou, em novembro, uma Lei Habilitante que aumentou os poderes de Maduro para legislar sobre temas econômicos por um ano.

A partir da nova lei, Maduro decretou a polêmica Lei Orgânica de Preços Justos, que limita o lucro de atores das cadeias de comercialização no país em 30%. O objetivo, segundo o governo, é garantir o desenvolvimento “justo, equitativo, produtivo e soberano” da economia nacional, protegendo a renda dos cidadãos, o acesso das pessoas aos bens e serviços para a satisfação de suas necessidades. Em meio a declarações embaraçosas, como quando disse que o rosto de Chávez apareceu em um túnel do metrô de Caracas, Maduro ainda fez ofertas diretas de dólar a importadores e comprou alimentos de países como Uruguai, Argentina e Colômbia para tentar barrar o desabastecimento.

Apesar de todos os problemas, o governo conseguiu, impor uma derrota a cerca de 30 legendas nas eleições municipais de dezembro, quando o chavismo foi vitorioso em 77% das cidades. Uma das explicações para o sucesso nas urnas é a herança deixada em 15 anos de governo Chávez. Durante o período, a Venezuela alcançou o posto de país com distribuição de renda mais igualitária da América Latina. Em 2012, o coeficiente Gini – que varia entre 0 (mais igualitário) a 1 (mais desigual) – foi de 0,39 na Venezuela. No Brasil, esse índice naquele ano foi de 0,51. Segundo dados da Unesco, a taxa de alfabetização, que em 1991 era de 89,8%, em 2010 era de 95,5%. Em relação aos jovens frequentando o ensino médio, houve um salto de 57% em 1999 para 83% em 2010.

Sem perspectiva de novas eleições, após uma nova derrota, Capriles optou por uma via conciliadora, buscando diálogo com Maduro, chegando até a apertar a mão de seu rival em público, o que foi visto com maus olhos pelos setores mais radicais da oposição, como o comandado por Leopoldo López. A moderação foi a oportunidade que López precisou para tomar o lugar de Capriles e se tornar protagonista do pedido de renúncia de Maduro, o que ocorreu poucos meses depois.

A tentativa de estupro de uma estudante da Universidad de los Andes, no estado de Táchira, foi o estopim de uma das primeiras manifestações estudantis contra o governo da Venezuela no início de fevereiro. Os protestos por melhor segurança pública se espalharam entre os estudantes dos estados de Mérida, Caracas, Zulia e Coro. O acontecimento foi catalisado pela oposição encabeçada por López. Essas insatisfações se converteram em protestos violentos e choques com a Polícia Nacional, que deixaram um saldo, por enquanto, de 37 pessoas mortas, 559 feridas e 168 presas por atos violentos.

Desde então, a crise gira em torno desses atos. Maduro, entretanto, ironiza o papel dos opositores. Ele diz que espera que a Venezuela tenha um dia uma oposição sem ligações com Washington, nos Estados Unidos, e mantém o discurso enfático contra seus rivais. “Amanhã completamos um ano da vitória heroica do povo nas eleições”, disse Maduro na segunda-feira 14. “Em um ano essa mesma oligarquia lançou uma guerra econômica contínua e permanente, contrabando, inflação induzida, sabotagem econômica, guerra elétrica e psicológica e agora barricadas. Barricadas fascistas”, disse Maduro. Aparentemente, o primeiro ano da crise dará o tom de todo o mandato de Maduro no Miraflores.

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