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Governo britânico anuncia plano unilateral para modificar protocolo da Irlanda do Norte

A União Europeia advertiu que será forçada reagir com todas as medidas disponíveis se o Reino Unido insistir em mudanças unilaterais ao protocolo especial negociado

Governo britânico anuncia plano unilateral para modificar protocolo da Irlanda do Norte
Governo britânico anuncia plano unilateral para modificar protocolo da Irlanda do Norte
Primeiro-ministro britânico Boris Johnson. Foto: AFP
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O governo britânico apresentou nesta terça-feira 17 o plano unilateral de modificação dos controles pós-Brexit, em uma tentativa de pressionar a União Europeia (UE) para obter uma renegociação e acalmar os unionistas da Irlanda do Norte.

Em um discurso muito aguardado na Câmara dos Comuns, a ministra das Relações Exteriores, Liz Truss, anunciou a “intenção” do governo do primeiro-ministro Boris Johnson de apresentar uma legislação nas próximas semanas para estabelecer mudanças ao protocolo” norte-irlandês.

“Nossa preferência continua sendo uma solução negociada com a UE e, paralelamente à legislação que será apresentada, continuamos abertos a novas conversações, se conseguirmos alcançar o mesmo resultado por meio de um acordo negociado”, acrescentou, ao pressionar Bruxelas para que mude de opinião e com a esperança de não provocar uma guerra comercial com os ex-sócios europeus.

A União Europeia advertiu que será forçada reagir com todas as medidas disponíveis se o Reino Unido insistir em mudanças unilaterais ao protocolo especial negociado para a Irlanda do Norte como parte do Brexit.

“Se o Reino Unido decidir seguir avançar com um projeto de lei que desabilite os elementos que constituem o Protocolo, como o governo do Reino Unido anunciou hoje, a UE terá que responder com todas as medidas à sua disposição”, disse o vice-presidente da Comissão Europeia, Maros Sefcovic.

“Uma ação unilateral deste tipo a respeito de um acordo internacionalmente vinculante é prejudicial para a confiança e servirá apenas para tornar mais difícil encontrar soluções”, disse o ministro irlandês das Relações Exteriores, Simon Conveny, que lamentou “profundamente” a decisão de Londres.

Desde o início das negociações do Brexit em 2017, proteger o frágil equilíbrio de forças na Irlanda do Norte, histórica e culturalmente muito unida à vizinha República da Irlanda – país membro da UE – sempre foi o maior obstáculo a ser superado.

E, apesar de o Reino Unido ter saído oficialmente do bloco em fevereiro de 2020 e completamente em janeiro de 2021, o “protocolo” volta agora a provocar tensões não apenas entre Londres e Bruxelas, mas também com as instituições autônomas regionais de Belfast.

O acordo de paz da Sexta-Feira Santa de 1998, que acabou com três décadas de conflito violento entre unionistas protestantes e republicanos católicos norte-irlandeses, determinou que as duas partes devem compartilhar o poder no Executivo regional desta nação britânica de 1,9 milhão de habitantes.

Porém, 12 dias depois da vitória histórica do partido republicano Sinn Fein – ex-braço político do grupo armado IRA e que defende a reunificação da Irlanda – nas eleições legislativas regionais, o partido unionista DUP bloqueia o Parlamento autônomo e se nega a formar o governo até que Londres modifique o protocolo.

Pressionar a UE

Para evitar o retorno de uma fronteira física com a República da Irlanda, inaceitável para os republicanos que poderia colocar em perigo a frágil paz, o protocolo impõe controles alfandegários aos produtos que chegam à região procedentes do restante do Reino Unido.

Os unionista denunciam que isto ameaça seu espaço no país.

Londres, que pede há vários meses à UE uma renegociação profunda do texto, afirma que “nunca sugeriu descartá-lo”, e sim “reformá-lo”.

“A questão é como fazer”, disse o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, após uma reunião na segunda-feira em Belfast com representantes dos cinco partidos regionais para tentar desbloquear a situação.

“Gostaríamos de fazer de forma consensual com os nossos amigos e sócios, reduzindo os problemas”, disse, em referência à UE, “mas para conseguirmos, para ter uma garantia, também temos que obter uma solução legislativa ao mesmo tempo”, enfatizou.

“Sempre tentamos abordar o tema com calma. É uma opinião tanto do primeiro-ministro como da ministra das Relações Exteriores”, disse o porta-voz de Downing Street antes do discurso de Truss na Câmara dos Comuns.

A UE, que já afirmou estar disposta a fazer “ajustes” ao protocolo mas não a renegociá-lo, destaca que este foi negociado e assinado pelas duas partes e parar de aplicá-lo unilateralmente seria uma ruptura “inaceitável” da confiança mútua, além de uma violação do direito internacional.

E os unionistas do DUP, aparentemente pouco convencidos, repetiram na segunda-feira que não permitirão que a líder do Sin Feinn na Irlanda do Norte, Michelle O’Neill, assuma o posto de primeira-ministra regional até que Londres passe das palavras aos atos, com a aprovação da mudança legislativa, algo que pode demorar meses.

O governo dos Estados Unidos, que atuou como fiador do acordo da Sexta-feira Santa, expressou preocupação com as sugestões de que o Reino Unido poderia suprimir unilateralmente a aplicação do texto concebido para garantir a paz.

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