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Gaza: ONU denuncia uso da fome como arma contra palestinos e alerta para desaparecimentos forçados
Israel, que acusa o grupo islâmico palestino Hamas de saquear ajuda fornecida pela ONU, impôs um bloqueio total à Faixa de Gaza entre março e maio


Especialistas independentes da ONU manifestaram preocupação, nesta quinta-feira 28, diante de relatos de desaparecimentos forçados de palestinos em situação de fome que buscavam alimentos em pontos de distribuição operados pela Fundação Humanitária de Gaza (GHF, na sigla em inglês). Eles afirmam que o exército israelense estaria diretamente envolvido nos desaparecimentos e pedem que Israel pare de cometer “crime hediondo”.
Em comunicado conjunto, sete especialistas disseram ter recebido informações de que várias pessoas, incluindo uma criança, teriam desaparecido após se dirigirem a centros de distribuição de ajuda em Rafah, no sul da Faixa de Gaza.
“Relatos de desaparecimentos forçados de civis famintos que buscam seu direito básico à alimentação não são apenas chocantes, como equivalem a tortura”, afirmaram os especialistas, que atuam sob mandato do Conselho de Direitos Humanos da ONU.
“O uso de comida como instrumento para promover desaparecimentos em massa e intencionais precisa acabar imediatamente”, declararam.
Os autores do comunicado são cinco membros do Grupo de Trabalho da ONU sobre Desaparecimentos Forçados ou Involuntários, Francesca Albanese – relatora especial da ONU para os direitos nos territórios palestinos –, e Michael Fakhri – relator especial sobre o direito à alimentação.
O documento assinado por eles afirma que as forças israelenses estariam se recusando a fornecer informações sobre o paradeiro de pessoas sob custódia, o que configura violação do direito internacional.
“A omissão em reconhecer a privação de liberdade por agentes estatais e a recusa em admitir a detenção caracterizam um desaparecimento forçado”, denunciam.
Fundação Humanitária de Gaza nega desaparecimentos
A GHF, por sua vez, afirmou que não há evidências de desaparecimentos forçados em seus pontos de distribuição. “Operamos em uma zona de guerra onde há denúncias graves contra todos os envolvidos fora de nossos centros. Mas dentro das instalações da GHF, não há evidência de desaparecimentos forçados”, respondeu a fundação à AFP, sobre o comunicado dos especialistas.
Israel, que acusa o grupo islâmico palestino Hamas de saquear ajuda fornecida pela ONU, impôs um bloqueio total à Faixa de Gaza entre março e maio. Após o início da flexibilização das restrições, foi criada a GHF – uma organização privada apoiada por Israel e pelos Estados Unidos – para distribuir ajuda e substituir o repasse de alimentos feito pela ONU.
Hoje, a GHF dispõe de apenas quatro centros de distribuição de alimentos em zonas militarizadas. Antes, eram 400 sob o sistema da ONU. Palestinos precisam se expor a riscos e percorrer longas distâncias para chegar aos locais.
O Escritório de Direitos Humanos da ONU informou na semana passada que 1.857 palestinos foram mortos enquanto buscavam ajuda desde o fim de maio, sendo 1.021 nas proximidades dos centros da GHF.
Pontos de distribuição representam riscos
Na semana passada, a ONU declarou estado de fome na Cidade de Gaza, atribuindo a situação à “obstrução sistemática” da entrega de ajuda humanitária por parte de Israel. Os especialistas destacaram que bombardeios aéreos e disparos diários nas proximidades dos centros lotados de distribuição causaram mortes em massa.
“A Fundação Humanitária de Gaza tem a obrigação de garantir locais seguros para distribuição e contratou empresas privadas de segurança militar para esse fim”, afirmaram.
Agora, os especialistas alertam que os pontos de distribuição representam riscos adicionais para pessoas em situação de vulnerabilidade, que podem ser forçadas a desaparecer.
Os especialistas, por fim, pediram às autoridades israelenses que “coloquem fim a esse crime hediondo” contra uma população já extremamente vulnerável.
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