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França: crise da reforma da Previdência reforça extrema direita, mas até eleitores duvidam de vitória

Analistas políticos franceses têm advertido que a aprovação da reforma e a intransigência de Macron favorecem a extrema direita, ao “atropelar” a vontade do povo e impor mais anos de trabalho

Foto por Charly TRIBALLEAU / AFP
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“Nunca vai dar certo”: em um bastião da extrema direita na França, os eleitores do partido Reunião Nacional (RN) reconhecem que a crise da reforma da Previdência que sacode o país beneficia a candidata Marine Le Pen, mas parecem não acreditar em uma vitória nas próximas eleições presidenciais, em 2027.

Em Ercheu, um vilarejo de 750 habitantes no norte do país, os Le Pen – seja o pai, Jean-Marie, ou a filha, Marine – ficam à frente nas eleições presidenciais há mais de 30 anos. Em 2022, Marine Le Pen conquistou 55% dos votos no primeiro turno no município e 75% na segunda votação, da qual Emmanuel Macron saiu vitorioso para um segundo e último mandato.

Em um encontro com eleitores na cidade, nesta sexta-feira (7), o deputado do partido Laurent Jacobelli tentava convencer que “o fim do túnel não está tão longe e os dias felizes da vitória nos aguardam”, porque “o alinhamento dos planetas é o melhor que já houve”.

Analistas políticos franceses têm advertido que a aprovação da reforma e a intransigência de Macron favorecem a extrema direita, ao “atropelar” a vontade do povo e impor mais anos de trabalho para pessoas que, por exercerem profissões braçais ou por terem baixa qualificação, já enfrentam dificuldades para chegar à aposentadoria. Entre eles, muitos já votam na extrema direita ou são suscetíveis a fazê-lo.

Outro deputado do RN, Julien Odoul, acrescentou que o otimismo se deve a “pesquisas extremamente positivas, emocionantes”. Uma sondagem do Ifop-Fiducial desta semana colocou Marine Le Pen no topo das intenções de voto no primeiro turno da próxima eleição presidencial, com 30% dos votos se o pleito fosse hoje, à frente do líder da esquerda radical Jean-Luc Mélenchon, com 22%, e o ex-primeiro-ministro Edouard Philippe, apresentado como potencial sucessor de Macron, com 28%.

Esperança ponderada

Deputada, Marine Le Pen se manteve discreta nos debates acalorados sobre o tema dentro e fora da Assembleia, deixando para a esquerda o papel de incendiar o clima político e das manifestações – que têm registrado sistematicamente atos de violência repudiados pelo eleitorado de extrema direita.

“Vitória em 2027? Já havíamos dito isso em 2022, mas não deu certo”, pondera a eleitora Martine Caron, à AFP. “Muita gente tem medo”, considera, avaliando que talvez seja o momento de experimentar outro nome do partido, como o atual presidente da sigla, Jordan Bardella. “Ele é bom”, afirma.

Didier Delimauges, 57 anos, morador do vilarejo, considera que Bardella “é diferente, um pouco menos duro”. O operador de logística garante que nunca votou na extrema direita, mas foi à reunião de sexta-feira “para ouvir o que seria dito” porque, na sua opinião, o “os dirigentes do RN não foram piores que os outros” na questão das aposentadorias.

Medo de ‘confusão’

David, 48, um ladrilhador que prefere não dar o nome completo, resolveu votar pela primeira vez na extrema direita no ano passado. “O problema que vejo ao meu redor é que as pessoas votam no RN no primeiro turno, mas não no segundo. Elas têm medo que dê confusão nas periferias, que seja uma bagunça.”

François Berthout, eleitor lepenista “desde o início dos anos 80”, também se diz “pouco optimista” quanto a uma futura vitória porque, segundo ele, o partido “ainda é qualificado como de extrema direita”. Ao seu lado, um de seus amigos que não quer ser identificado é mais direto: “O RN nunca vai dar certo, porque [a imprensa] demoniza tudo”, disse, reconhecendo que “sempre tem deslizes” dos representantes do partido. Questionado se pensa em votar em Le Pen” em 2027, ele responde: “Talvez. Mas eu também não posso simplesmente não ir votar”.

Outro potencial eleitor, Xavier Jésu, 64 anos, concentra suas esperanças na nova geração da família: a ex-deputada Marion Maréchal, sobrinha de Marine. “Quero a união das direitas”, disse, acrescentando que, até a próxima eleição, ”faltam ainda quatro anos. É muito tempo”.

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