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Fragmentação partidária ameaça o futuro da Grécia

Desde o retorno da democracia, o país nunca teve tantos partidos pequenos. Eles indicam a busca por renovação, mas favoreceram a ascensão de radicais

Bandeiras da Grécia e da União Europeia tremulam no porto de Samos em 20 de janeiro. No domingo 25, gregos vão novamente às urnas
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No momento, Spiros Danellis é um convidado bem-vindo nos programas de rádio e televisão da Grécia. O arquiteto natural de Creta está se candidatando como deputado pelo To Potami (O Rio), partido cotado como possível surpresa nas eleições legislativas antecipadas, marcadas para 25 de janeiro.

A legenda social-democrata foi fundada pelo jornalista Stavros Theodorakis, pouco antes do pleito para o Parlamento Europeu de 2014, no qual conquistou 6,6% dos votos. Danellis planeja agora uma jogada política, contando que o To Potami vá se afirmar como terceira facção mais forte nas próximas eleições parlamentares. Em seguida, ele assumiria responsabilidades no governo, de preferência como parceiro minoritário numa coalizão pró-europeia.

O plano pode dar certo. É fato que, segundo as pesquisas de opinião, o partido deverá conquistar menos eleitores do que na eleição europeia passada. Porém, no panorama partidário grego há atualmente tantas legendas que um novato com cerca de 5% dos votos realmente pode alcançar o terceiro lugar.

“Os antigos partidos populares estão fortemente fragmentados, sobretudo no centro-esquerda, que teve de assumir uma responsabilidade muito maior pela irrupção da crise de endividamento”, esclareceu Spiros Danellis em entrevista à DW.

O político sabe do que está falando: nas eleições da União Europeia de 2009, ele entrou para o Parlamento representando o socialista Pasok, na época, onipotente. Aí vieram a crise da dívida grega e cinco anos de recessão.

Hoje, Danellis prefere estar do lado adversário, enquanto seu antigo partido vai dando sinais de dissolução. O líder socialista da época, Georgios Papandreou, encabeça, por sua vez, seu próprio Movimento dos Socialistas Democráticos, que provavelmente não ficará aquém do mínimo de 3% dos votos, necessário ao ingresso no Parlamento.

Após o início da crise da dívida, os partidos políticos cometeram muitos erros, afirma Danellis, não excluindo o Pasok, seu próprio de então. Acima de tudo, não se conseguiu executar as reformas necessárias e combater a política de clientelismo generalizada, e isso decepcionou muitos eleitores.

A meta do To Potami é justamente preencher essa lacuna. “Queremos mudar tudo, mas sem destroçar o nosso país no processo”, é seu slogan principal. Seus críticos acusam o grupo de – apesar de ostentar políticos pró-europeus e rostos novos – não ter um programa eleitoral concreto.

Theodorakis rebate a acusação. “Somos um movimento que ainda não evoluiu em partido; não temos nem mesmo um central partidária de verdade. Mas estamos trabalhando para isso”, declarou durante uma manifestação no fim do ano passado.

Os eleitores estão definitivamente à procura de uma alternativa, afirma Giorgos Tzogopoulos, do think-tank Eliamep, sediado em Atenas. É hora de novos rostos e novas ideias, e esse é um dos motivos da formação de tantos partidos fragmentários. Mas também há outros motivos, menos positivos.

“Primeiro, a crise econômica deu impulso ao populismo: um exemplo típico é o partido populista de direita Gregos Independentes (ANEL), atualmente representado no Parlamento por 13 deputados. Em segundo lugar, muitos políticos não querem trabalhar com seus colegas, eles preferem se isolar ou fundam um novo partido, que também tentam dominar.”

Como exemplo eloquente dessa especificidade da vida política da Grécia, Tzogopoulos cita o pleito legislativo de 2012. Na época, os partidários do liberalismo econômico tentaram fechar conjuntamente um programa eleitoral, no que fracassaram redondamente. Ao fim, cada líder liberal foi enfrentar as urnas com seu próprio partido.

Grécia Mulher passa na frente do Parlamento grego em 13 de janeiro. O país vive uma grave crise de representação e o neonazista Aurora Dourada pode se beneficiar

Entre eles estavam a ex-ministra do Exterior Dora Bakoyannis; o teuto-grego Jorgo Chatzimarkakis, anteriormente pertencente ao Partido Liberal Democrático (FDP) da Alemanha; e o publicitário Thanos Tzimeros. Como era esperado, nenhum deles conseguiu alcançar a marca dos 3%.

Enquanto conservadores e esquerda oposicionista disputam a vitória eleitoral, o To Potami, os socialistas, os comunistas e, notadamente, o Aurora Dourada (Chrysí Avgí), de extrema direita, competem pelo decisivo terceiro lugar na apreciação do eleitorado.

Decisivo, pois o terceiro grupamento mais forte será inevitavelmente indicado como potencial parceiro de coalizão. De acordo com a Constituição grega, poderá até mesmo ser encarregado da formação do governo, caso fracassem os próprios esforços dos dois outros partidos maiores para conquistar parceiros de coalizão após a eleição.

Em decorrência da crise econômica, o Aurora Dourada ganhou força e nas pesquisas de opinião aparece logo atrás do To Potami. Isso, embora todos os líderes partidários se encontrem em prisão preventiva, aguardando processo por “filiação a organização criminosa”. Uma possibilidade é os radicais de direita abocanharem a terceira posição e em algum momento serem encarregados de constituir o governo.

“Esse seria o pior desastre político imaginável”, adverte Spiros Danellis. “Imagine o chefe preso do Auro Dourada sendo escoltado pela polícia até o palácio presidencial, para receber o contrato de formação de governo. Este poderia até ser bem sucedido, mas só o efeito simbólico já seria gravíssimo.”

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