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Festival barra orquestra alemã liderada por israelense
Organizadores de evento belga argumentaram que maestro da Orquestra Filarmônica de Munique não tem posicionamento claro sobre a guerra em Gaza. Governo alemão diz que cancelamento é ‘puro antissemitismo’


Os organizadores do festival belga de música clássica Flanders Festival Ghent decidiram cancelar a apresentação prevista de uma das principais orquestras alemãs, a Orquestra Filarmônica de Munique, alegando preocupação com a postura do maestro israelense Lahav Shani em relação à guerra em Gaza.
A equipe afirmou que não poderia garantir clareza sobre a posição de Shani em relação ao que classificou como “regime genocida” de Israel. “Optamos por nos abster de colaborar com parceiros que não se distanciaram de forma inequívoca desse regime”, disse o comunicado publicado na quarta-feira 10, embora tenham assumido que Shani “se pronunciou a favor da paz e reconciliação várias vezes no passado.”
Shani, que deve assumir oficialmente como maestro da orquestra alemã na temporada 2026/27, atualmente é diretor musical da premiada Orquestra Filarmônica de Israel. Mesmo antes de assumir a posição oficialmente, ele seria o condutor da apresentação prevista para acontecer em 18 de setembro na cidade belga de Gent.
“Dada a desumanidade da situação atual, que também está provocando reações emocionais em nossa própria sociedade, acreditamos que não é desejável permitir que este concerto aconteça. Optamos por manter a serenidade de nosso festival e proteger a experiência do concerto para nossos visitantes e músicos”, concluiu o texto. O festival belga de música clássica acontece desde 1958 e costuma atrair 50 mil pessoas a Gent.
Segundo o jornal alemão Zeit, Shani não tem ligações públicas com o governo israelense e já conduziu a West-Eastern Divan – uma orquestra com base na Espanha que agrega músicos de países do Oriente Médio, incluindo israelenses e palestinos.
Em entrevista recuperada pelo jornal britânico The Guardian, Shani diz ter orgulho de representar a cultura israelense, mas se posicionou como um embaixador do Estado de Israel e não do governo.
Alemanha chama decisão de antissemita
O ministro da Cultura da Alemanha, Wolfram Weimer, classificou a decisão como uma “vergonha para a Europa” e acusou o festival de realizar “um boicote cultural” disfarçado de crítica a Israel. “Isso é puro antissemitismo e um ataque aos fundamentos da nossa cultura”, disse ele.
Weimer afirmou que cancelar a participação de orquestras alemãs e artistas judeus não pode se tornar aceitável e é um “precedente perigoso”.
“Os espaços culturais europeus não podem se tornar lugares onde antissemitas ditam os programas. A Alemanha não aceitará isso”, acrescentou.
O embaixador de Israel na Alemanha, Ron Prosor, também classificou o ato como “antissemitismo puro”. O primeiro-ministro belga, o nacionalista Bart De Wever, se distanciou da decisão, que chamou de “excessiva”.
“Símbolo da cultura alemã”
Weimer ainda elogiou a Filarmônica de Munique como “um símbolo da cultura alemã e de qualidade mundial.”
“Aqueles que negam a ela e ao seu futuro maestro um espaço não prejudicam Israel, mas a Europa”, disse ele.
“A Alemanha está inequivocamente ao lado da Filarmônica de Munique e de Lahav Shani. Nossa mensagem é clara: não deixaremos que nossa orquestra ou nossos artistas judeus sejam marginalizados.”
A orquestra e a cidade de Munique também criticaram a decisão do festival, chamando-a de uma punição coletiva aos artistas israelenses e afirmando que excluir pessoas de espaços culturais por sua origem ou religião é “um ataque aos valores fundamentais europeus e democráticos.”
Em março de 2022, a própria orquestra afastou o maestro russo Valery Gergiev do cargo de maestro principal após ele não condenar a invasão da Ucrânia por Moscou.
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