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Fake news sobre Brigitte Macron ser trans ganha fôlego após decisão judicial ser distorcida por conspiracionistas
A corte, porém, apenas entendeu que a acusação de transgeneridade, por si só, não configura ofensa à honra ou à reputação


A decisão da Justiça francesa de absolver duas mulheres acusadas de espalhar o boato de que Brigitte Macron seria uma mulher trans foi rapidamente instrumentalizada por grupos conspiracionistas como uma suposta “confirmação” da teoria — apesar de a corte não ter reconhecido a veracidade da alegação. A interpretação distorcida da sentença, amplificada por redes sociais, reacendeu ataques transfóbicos contra a primeira-dama da França e expôs os limites da Justiça diante da manipulação da informação.
Em meados de julho, a Corte de Apelação de Paris absolveu Natacha Rey e Amandine Roy, acusadas de difamação por propagarem a teoria de que Brigitte Macron seria uma mulher trans. A decisão, no entanto, não validou a tese. Segundo o advogado especializado em direito da imprensa Christophe Bigot, “essas absolvições não podem, de forma alguma, ser interpretadas como reconhecimento da veracidade dos fatos alegados”.
A corte entendeu que a acusação de transgeneridade, por si só, não configura ofensa à honra ou à reputação. “A Justiça não disse que as rés estavam certas, apenas que o conteúdo das declarações não se enquadra como crime”, explicou Bigot. A corte também rejeitou as acusações de falsificação de documentos e de um suposto “casamento fraudulento” entre Brigitte Macron e seu primeiro marido, considerando que os documentos apresentados pela parte civil desmontam a argumentação das rés.
A única parte do processo em que a corte reconheceu difamação foi a que envolvia a acusação de que Brigitte Macron teria cometido abuso de menor ao iniciar um relacionamento com Emmanuel Macron, então seu aluno. Ainda assim, as rés foram absolvidas com base na boa-fé, já que, segundo a corte, ambas “não são profissionais da informação” e se basearam em reportagens sobre o relacionamento entre o jovem estudante de 16 anos e sua professora de teatro de 39.
Brigitte Macron, seu irmão e o Ministério Público recorreram da decisão à Corte de Cassação.
Casal Macron processa influenciadora nos EUA
Além das ações na França, o casal presidencial também recorreu à Justiça dos Estados Unidos. Brigitte e Emmanuel Macron moveram um processo contra a influenciadora conservadora Candace Owens, que possui milhões de seguidores nas redes sociais X (antigo Twitter) e YouTube. A queixa, com 218 páginas, foi apresentada na Suprema Corte do estado de Delaware e solicita um julgamento com júri, além de indenizações punitivas.
Segundo comunicado divulgado por seus advogados, o casal Macron decidiu entrar com a ação após Owens ignorar repetidos pedidos para retirar do ar declarações falsas e difamatórias feitas em uma série de vídeos e podcasts intitulada Becoming Brigitte, composta por oito episódios.
“A campanha de difamação promovida por Owens foi claramente planejada para nos assediar, causar sofrimento a nós e às nossas famílias, e atrair atenção e notoriedade”, afirmaram Brigitte e Emmanuel Macron. “Demos a ela todas as oportunidades para recuar dessas alegações, mas ela se recusou. Nossa esperança sincera é que este processo judicial restabeleça a verdade e ponha fim, de uma vez por todas, a essa campanha de difamação.”
A ação acusa Owens de usar sua plataforma para espalhar “mentiras devastadoras e comprovadamente falsas” sobre o casal, incluindo alegações de que Brigitte Macron teria nascido homem, que ela e Emmanuel seriam parentes consanguíneos e que o presidente francês teria sido escolhido por um programa de controle mental operado pela CIA.
“Se existe um caso claro de difamação, é este”, afirmou o advogado Tom Clare, que representa o casal presidencial.
Desinformação transfóbica como arma política
A primeira-dama francesa se junta a uma lista de mulheres públicas que já foram alvo de campanhas de desinformação transfóbica, como Michelle Obama, Kamala Harris e Jacinda Ardern.
A estratégia, comum em ambientes digitais polarizados, busca deslegitimar figuras femininas de destaque por meio de ataques à sua identidade de gênero — uma tática que mistura misoginia, transfobia e teorias da conspiração.
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