Mundo

“Estado Islâmico” é um insulto à fé, dizem líderes muçulmanos

Os imames pedem que o governo britânico e outros parem de usar o termo, que segundo eles dá credibilidade a uma organização terrorista

Integrante do Estado Islâmico em meio a escombros após a aparentemente derrubada de um avião do regime Assad por parte do grupo radical, em Raqqa, na Síria, em 2018
Apoie Siga-nos no

Por Daniel Boffey

O primeiro-ministro britânico e a mídia deveriam parar de legitimar o grupo terrorista que assola a Síria e o Iraque ao descrevê-lo como “Estado Islâmico”, afirma uma coalizão de líderes religiosos e organizações que representam os muçulmanos britânicos. O uso do título preferido pelos jihadistas, segundo eles, credibilidade aos militantes sunitas e insulta a fé islâmica.

Os signatários de uma carta enviada a David Cameron, entre eles o presidente da Sociedade Islâmica da Grã-Bretanha, Sughra Ahmed, admitem que os muçulmanos do Reino Unido precisam fazer mais para impedir que seus jovens sejam enganados a participar do “ódio e veneno” do grupo. “Devemos aproveitar qualquer oportunidade para continuar dizendo em alto e bom som que ‘não é em nosso nome’ e ‘não é por nossa fé'”, escreveram.

Os autores da carta também pedem que o primeiro-ministro britânico reformule sua linguagem. Cameron, assim como outros importantes políticos, referiu-se diversas vezes ao “Estado Islâmico”, inclusive durante um debate na Câmara dos Comuns este mês.

Os signatários, como Mohammed Abbasi, da Associação de Muçulmanos Britânicos, e Amjad Malik QC, presidente da Associação de Advogados Muçulmanos, escreveram: “Não acreditamos que o grupo terrorista responsável deva receber a credencial e a estatura que deseja chamando a si mesmos de Estado Islâmico. Não é islâmico nem é um Estado.”

“O grupo não tem estatura junto aos fiéis muçulmanos, nem entre a comunidade internacional de nações. Ele claramente nunca aceitará as obrigações que qualquer Estado legítimo tem, incluindo a responsabilidade de proteger os cidadãos e respeitar os direitos humanos. Por isso acreditamos que a mídia, a sociedade civil e os governos devem se recusar a legitimar essas fantasias ridículas de ‘califado’, aceitando ou propagando esse nome. Propomos que Estado Não Islâmico seria um nome preciso para descrever esse grupo e sua agenda — e começaremos a chamá-lo assim.”

A intervenção marca a intensificação de uma campanha de proeminentes muçulmanos britânicos para impedir que os jovens em busca de aventura se unam aos militantes. Ela se segue a uma recente decisão de líderes muçulmanos de emitir uma fatwa condenando os jihadistas britânicos.

Seis importantes estudiosos islâmicos endossaram a fatwa no mês passado, descrevendo os britânicos aliados às células do Estado Islâmico como “hereges” e proibindo os supostos jihadistas de unir-se ao grupo “opressivo e tirânico” no Iraque e na Síria. Teme-se que até 500 britânicos tenham viajado à Síria ou ao Iraque desde 2011 para unir-se ao grupo e seus afiliados.

Em uma carta vista pelo Observer, os signatários acrescentam: “Acreditamos que enviaria uma mensagem poderosa na Grã-Bretanha e ao redor do mundo se o senhor, como nosso primeiro-ministro, se somasse a nós para conduzir um debate nacional em busca de uma maneira alternativa adequada de referir-se a esse grupo e contestar ainda mais sua legitimidade e influência.

“Isso poderia ser especialmente poderoso porque todos no país e no exterior podem ver que o senhor está sendo solicitado a fazê-lo pelos próprios muçulmanos britânicos, que querem deixar claro por que esse grupo é rejeitado com veemência.

“Temos certeza de que a maioria dos muçulmanos britânicos concordaria que ‘Estado Não Islâmico’ é um rótulo consideravelmente mais adequado para esse grupo venenoso — e esperamos que nossos concidadãos se unam a nós.

“Sabemos que esse seria um pequeno passo simbólico e que todos devemos trabalhar juntos para construir a inclusão e a integração na sociedade britânica que repeliria essas ideias venenosas.”

Dilwar Hussain, do grupo beneficente Novos Horizontes no Islamismo Britânico, que trabalha pela reforma do pensamento muçulmano, e um dos 18 signatários da carta a Cameron, disse que também é importante para os muçulmanos britânicos serem vistos falando contra as opiniões extremistas de homens como Anjem Choudary, que foi entrevistado pelo Observer na semana passada.

Choudary, um ex-advogado ligado a muitos britânicos que combateram na Síria e que reconhece o líder do EI, Abu Bakr al-Baghdadi, como “o califa de todos os muçulmanos e o príncipe dos fiéis”, afirmou que a política externa de Washington é a culpada pela decapitação do jornalista americano James Foley.

Hussain, que já foi membro da Comissão para a Igualdade Racial, disse: “O risco é que para um público insuspeito damos a impressão de que suas opiniões realmente têm algum peso entre a maioria dos muçulmanos britânicos. Choudary organiza reuniões frequentadas por um punhado de pessoas. Suas opiniões foram redondamente condenadas por líderes muçulmanos, imames e cidadãos de todo o país.”

“Ele diz que preferia viver lá, nesse chamado califado. Deveria fazê-lo. Mas o que queremos deixar muito claro é que os muçulmanos que gostam de viver aqui na Grã-Bretanha não reconhecem suas opiniões ou as do EI. Ele não é nós, e não é nossa religião.”

Leia mais em Guardian.co.uk

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo