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Entenda como países que atraem imigrantes reagem à crise do coronavírus

Ao contrário dos EUA, a maioria dos países prolongou a permanência para permitir que trabalhadores estrangeiros continuem onde estão

Crise do coronavírus em Portugal. Foto: AFP
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Com a crise sanitária causada pelo novo coronavírus, os fluxos migratórios estão praticamente congelados em todo o mundo, principalmente por razões de saúde e administrativas. Fronteiras e consulados estão fechados, mas os governos permanecem tomando medidas a favor ou contra a imigração, como acaba de fazer o presidente americano, Donald Trump, que suspendeu por 60 dias a emissão de vistos permanentes de residência, o chamado Green Card.

Na avaliação de Jean Christophe Dumont, especialista em migrações na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), estabelecer um vínculo entre migração e defesa do emprego, como Trump acaba de fazer, envia um sinal forte que pode estancar o fluxo migratório de maneira duradoura para os Estados Unidos, pelo menos durante o tempo em que a crise econômica durar.

Com exceção da Coreia do Sul e do Japão, que suspenderam as emissões de todos os vistos de residência, a maioria dos países prolongou a duração das autorizações de permanência para permitir que trabalhadores estrangeiros continuem onde estão. Por outro lado, muitos já perderam o emprego, principalmente em setores onde estão muito presentes, como a construção civil ou a hotelaria, completamente paralisados ​​pelas medidas de isolamento e de distanciamento social adotadas para frear a pandemia de coronavírus.

Existem setores, como a saúde, nos quais os estrangeiros são sempre bem-vindos. Depois de deixar o hospital no Reino Unido, parcialmente recuperado do susto que levou com a Covid-19, o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, agradeceu dois enfermeiros que cuidaram dele, o português Luís e a neozeolandesa Jenny. Johnson disse que devia sua vida à atenção dispensada pelos profissionais do hospital St. Thomas, em Londres. Ao perceber a extensão da crise, o governo britânico prolongou por um ano todos os vistos de estrangeiros que trabalham na saúde. E por uma boa razão: cerca de 33% dos médicos em exercício no Reino Unido e 18% das enfermeiras são imigrantes.

A dependência de mão de obra estrangeira também é muito forte na agricultura, tanto no Reino Unido quanto na maioria dos outros países membros da OCDE. Sob a pressão dos fazendeiros americanos, Trump abrandou sua decisão, e afirmou que continuará concedendo vistos temporários de trabalho.

Por outro lado, a Espanha suspendeu as 14.000 autorizações de entrada reservadas aos marroquinos, que costumam participar da colheita de frutas e legumes no país. Já a Alemanha, que inicialmente suspendeu os vistos de trabalho sazonal, autorizou no início de abril a entrada de 40 mil romenos e búlgaros para trabalhar na colheita. Outros 40.000 são esperados no mês de maio. O governo alemão tomou as precauções necessárias, transportando os trabalhadores em voos charters e impondo uma quarentena de 14 dias, antes de transferi-los para os campos.

Na Itália, a fim de atender às necessidades urgentes nessa área, a ministra da Agricultura, Teresa Bellanova, quer a regularização de 200 mil imigrantes sem documentos. Normalmente, segundo a ministra, o país absorve 350 mil trabalhadores sazonais vindos do exterior, mas estão faltando neste ano de 250 mil a 270 mil pessoas nas plantações.

Transferências de dinheiro vitais para os países pobres

À luz do coronavírus, redescobre-se a importância da migração para o tecido econômico dos países anfitriões. Os países de origem também sofrem com a redução das transferências de dinheiro que garantem o sustento de milhares de famílias pobres.

Essas transferências teriam recuado 80% entre o Reino Unido e países do leste da África, segundo levantamento feito pela revista britânica The Economist. Os recursos enviados pelos imigrantes da Itália para a África despencaram 90%. Essa retração violenta provocou o fechamento de várias empresas de serviços financeiros. Os pagamentos realizados por meio de aplicações de smartphone caíram de 15% a 20%, mas ainda é preciso que os interessados possuam uma conta bancária.

Em comparação com a crise financeira de 2008, que registrou uma diminuição das transferências de 5%, desta vez as consequências tendem a ser mais graves. Segundo o Banco Mundial, em 2019, as transferências da mão de obra imigrante para os países de origem movimentaram US$ 715 bilhões. Um montante que deve cair vertiginosamente neste ano. Para retornar ao patamar anterior à crise sanitária serão necessários no mínimo três anos, estima o banco BBVA.

A crise econômica deixará traços duradouros nos fluxos migratórios, principalmente quando vem associada a uma crise no setor de petróleo. É provável que as pontes migratórias entre os países do Oriente Médio e da Ásia ou entre a Rússia e a Ásia Central sejam muito impactadas. É um duplo golpe para os países de origem, porque as dificuldades domésticas serão agravadas pela retração nos embarques de migrantes. Devido ao aumento do desemprego, a maioria dos países anfitriões deve endurecer as condições de entrada, alimentando as tensões sociais nos países mais pobres e a pressão migratória.

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