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Em debate, vice de Milei critica Lula e apela ao negacionismo sobre a ditadura argentina
Abertamente, Victoria Villarruel negou que a ditadura argentina tenha sido responsável pela morte e o desaparecimento de mais de 30 mil pessoas
A dez dias da realização do segundo turno das eleições presidenciais na Argentina, os candidatos à vice-presidência, Augustín Rossi e Victoria Villarruel, protagonizaram um debate marcado por trocas mútuas de acusações, na última quarta-feira 8.
Durante uma hora e meia, Rossi e Villarruel discutiram as suas propostas de campanha em quatro eixos temáticos: 1) Economia e Trabalho; 2) Segurança e Defesa; 3) Saúde, Educação e Políticas Sociais; e 4) Justiça, Direitos Humanos e Transparência.
Em cada um deles, os candidatos a vice ressaltaram as diferenças de propostas entre os presidenciáveis. Villarruel, que é candidata a vice na chapa do ultralibertário Javier Milei, atribuiu ao atual governo argentino a culpa pela situação econômica do país. “Há um milhão e duzentas mais pessoas a mais na pobreza, os aposentados são a válvula de ajuste do governo, neste país não se pode alugar uma casa; estamos pior que 2001 [em referência à histórica crise econômica e social daquele ano]”.
Rossi, que compõe a chapa do atual ministro da Economia, Sergio Massa, acusou Milei de propor “mais endividamento” para a Argentina, por meio da venda de empresas públicas. Segundo Rossi, o plano de dolarização da coalizão La Libertad Avanza é inviável.
No próximo domingo 12, os candidatos Sergio Massa e Javier Milei vão fazer o primeiro e único debate do segundo turno presidencial na Argentina.
Relações diplomáticas e um recado a Lula
Uma das principais marcas da chapa libertária, já destacada em entrevistas de Milei, é a possibilidade de ruptura de relações diplomáticas com países como China e Brasil.
Ontem, por exemplo, em uma entrevista à imprensa peruana, Milei disse que, na hipótese de ser o próximo presidente da Argentina, “não se reuniria com Lula”. “É um corrupto e por isso esteve preso. E é um comunista”, apontou o libertário, indicando como pretende conduzir a política externa do seu eventual governo.
No debate de ontem, Rossi ponderou que considera “uma má decisão de Javier Milei de querer cortar as relações comerciais com Brasil e China”, uma vez que os dois países são “os principais destinos comerciais” da Argentina. Ao ser questionada sobre o tema, Villarruel não chancelou a fala de Milei, mas criticou o presidente brasileiro, a quem destacou como “líder do Foro de São Paulo”. Ela também chamou o embaixador argentino na China, Sabino Narvaja, de “lacaio dos chineses”.
Revisionismo sobre a ditadura
Apesar de ter sido dividido em eixos temáticos e de contar com regras que estabeleciam tempo de fala, os dois candidatos se interromperam em diversas oportunidades. Villarruel acusou Rossi de promover um monólogo, enquanto o vice de Massa destacou, mais de uma vez, o que chamou de tom agressivo da candidata da extrema-direita.
Um dos pontos mais acalorados do debate aconteceu quando ambos trataram dos mortos e desaparecidos na última ditadura argentina, ocorrida entre 1976 e 1983. Abertamente, Villarruel negou que a ditadura argentina tenha sido responsável pela morte e o desaparecimento de mais de 30 mil pessoas.
“Foram 30 mil presos desaparecidos. Deixe de reivindicar a ditadura”, acusou Rossi. “Não foram 30 mil, deixe de mentir”, retrucou Villarruel. “No Parque da Memória [monumento às vítimas da ditadura, em Buenos Aires ] há 8 mil nomes. Onde estão os demais?”, questionou Villarruel, ao final do debate.
Victoria Villarruel é filha de Eduardo Marcelo Villarruel, ex-tenente-coronel do Exército argentino que participou da guerra das Malvinas e fazia parte da vigilância do regime militar. O tio dela, Guillermo Ernesto Villarruel, chegou a ser preso por crimes contra a humanidade.
Com o histórico militar, Villarruel vem resgatando, nesta campanha, uma dos temas mais sensíveis da história política da Argentina. Durante o processo de transição democrática, o país promoveu a punição de militares responsáveis por mortes, torturas e desaparecimentos entre as décadas de 1970 e 1980. Um deles foi Jorge Rafael Videla, o líder da junta militar que governou o país nos tempos autoritários.
Para Villarruel, as vítimas do período não foram apenas os civis contrários à ditadura, mas agentes do próprio regime que enfrentavam a resistência de grupos armados, como a organização de guerrilha urbana Montoneros.
Ao final do debate de ontem, Rossi afirmou que Villarruel trazia “uma discussão sobre o passado”, uma vez que a “Argentina tem um pacto democrático sobre o que significam os direitos humanos”. A candidata, por sua vez, retrucou dizendo que é preciso reconhecer que na Argentina “houve vítimas do terrorismo que não tiveram direitos humanos”.
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