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Distúrbios expõem falhas na política de integração na Suécia

Tido como modelo, país vê insatisfação de imigrantes vir à tona na forma de violentos protestos em Estocolmo. Para especialistas, crise pode ajudar governo a repensar forma de integrar estrangeiros

Polícia da Suécia aborda, na noite de 25 de maio, homem mascarado em Malarhojden, subúrbio de Estocolmo, um dos vários onde ocorreram os distúrbios na semana passada
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A Suécia é com frequência apresentada – muitas vezes por seus próprios governantes – como modelo de justiça e de uma bem-sucedida integração social. Na última semana, no entanto, vem sendo o país dos pneus, carros e escolas queimados – numa aparente dissonância entre pretensão e realidade.

Os protestos iniciados no distrito de Husby, no subúrbio de Estocolmo, agitaram a vida da aparentemente pacata Estocolmo. Em torno de 12 mil pessoas vivem no distrito, dos quais 85% são imigrantes ou filhos de estrangeiros. Ali, mais de um terço dos jovens de entre 20 e 25 anos de idade estão desempregados.

“Na Suécia, nem tudo que reluz é ouro”, diz Tobias Etzold, especialista em países nórdicos do Instituto de Relações Internacionais e de Segurança (SWP), de Berlim. “Mesmo um país-modelo como a Suécia, com uma política eficiente de bem-estar social e uma população relativamente rica, não está imune à crise econômica e financeira europeia.”

Consequência indireta da crise Após a crise de 2008, o governo sueco se viu forçado a implementar medidas de austeridade. Apesar dos problemas econômicos terem sido resolvidos rapidamente através de reformas, a parcela mais vulnerável da população acabou sofrendo as consequências. Ao mesmo tempo em que promovia reduções nos impostos dos mais ricos, diz Etztold, o governo cortou benefícios aos desempregados e subsídios ao setor de saúde.

“Essas medidas levaram a uma crescente divisão social entre ricos e pobres”, explica Almut Möller, do Conselho Alemão para Relações Exteriores (DGAP).

As consequências são mais visíveis em subúrbios como Husby, construídos nos anos 60 e 70 no intuito de prover habitações de baixo custo à população. Inicialmente, cidadãos suecos de baixa renda foram morar nesses locais, mas, com o tempo, imigrantes passaram a ser maioria.

“A Suécia tem uma política liberal de imigração e, hoje em dia, a proporção de imigrantes no país é bastante alta”, afirma Möller. Quando o desemprego aumenta em áreas onde as pessoas têm menos acesso à educação e maior dificuldade para encontrar trabalho, destaca o especialista, o desconforto é maior. “O índice de desemprego entre os jovens, de 24%, está bem acima da média da União Europeia”, lembra.

Chance de melhorar situação O estompim para os distúrbios foi a morte de um imigrante de 69 anos de idade, causada pela polícia, que alega ter agido em legítima defesa. “Se esse incidente não tivesse ocorrido, dificilmente a situação se agravaria dessa forma”, opina o sociólogo Martin Diewald, da Universidade de Bielefeld, na Alemanha. “Eventos como esse trazem frequentemente à tona uma propensão latente à violência.”

“Em um grupo que se vê – não injustamente – vítima de discriminação, a violência acaba por emergir quando um ato desses acontece, o que para eles é considerado como uma agressão”, completa Diewald. “Isso serve como um indicador sensível de sua vulnerabilidade, uma vez que eles não têm direitos”.

A polícia afirma que os protestos estão cada vez mais sob controle. Etzold analisa que, a longo prazo, os atos de rebeldia podem acabar trazendo melhoras às condições de vida nos subúrbios. “Os políticos, que há muito tempo eram negligentes com os problemas dessas regiões, foram pegos de surpresa com a onda de violência. A situação poderá levar à uma maior conscientização de que o governo precisa fazer mais para essa parcela da população.”

Etzold é enfático ao afirmar que o aclamado programa de integração sueco fracassou. Para ele, o governo terá que gastar mais em educação, além de proporcionar a abertura de oportunidades no mercado de trabalho. Esse seria o único caminho para a Suécia reconquistar sua reputação de país-modelo. Por enquanto, afirma Etzold, o modelo atual “é mais clichê do que realidade”.

Autoria Christian Ignatzi (rc)
Edição Rafael Plaisant
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