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Depois da Copa, Argentina volta a encarar a dura realidade

Alta do custo de vida, retração no consumo e não-pagamento da dívida ameaçam a economia do país vice-campeão do Mundial da Fifa

A presidente Cristina Kirchner e o jogador Leonel Messi, durante a recepção da seleção argentina após o vice-campeonato
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Por Daniel Merolla*

O orgulho dos torcedores argentinos pela honrosa derrota da seleção na Copa do Mundo começou a se esvair nesta segunda-feira 14, com o fim do espetáculo do Mundial e a volta à realidade de uma economia fraca e o perigo de uma moratória da dívida.

Dezenas de milhares de argentinos comemoraram nas ruas a atuação da equipe, que resistiu até o fim e perdeu por 1 a 0 para a poderosa Alemanha. Mas agora, problemas como a inflação alta voltam ao primeiro plano.

“Os temas que preocupam a sociedade não desaparecem durante o Mundial, mas têm um valor menor”, explicou à AFP o sociólogo Ricardo Rouvier, diretor da consultoria que leva o seu nome e professor na Universidade de Lomas de Zamora.

O custo de vida acumulou uma alta oficial de 13,5% nos primeiros cinco meses do ano, chegando a um índice superior a 30% anualmente, segundo consultorias. A retração no consumo, no entanto, pode atenuar esse aumento.

Além disso, a taxa do consumo – um dos principais pilares do modelo econômico da presidente Cristina Kirchner – registrou uma queda acumulada de 7% no primeiro semestre, de acordo com a Confederação Argentina da Empresa Média (CAME, na sigla em espanhol).

Desafio nos tribunais

Os fogos de artifício ainda estouravam nos céus nesta segunda-feira, talvez pela primeira final disputada em 24 anos, desde a Copa de 1990, também vencida pela Alemanha.

Os jogadores foram recebidos nesta segunda no aeroporto de Ezezia, na província de Buenos Aires, por uma multidão de torcedores. “Agora, vão perdendo aos poucos o interesse pela Copa do Mundo”, acrescentou Rouvier, “até que só fique o núcleo duro, do fã de futebol apaixonado pelo seu time”.

Mas o próximo desafio da Argentina será nos tribunais: daqui a 16 dias, vai enfrentar a batalha legal contra os fundos especulativos na Justiça dos Estados Unidos.

Um juiz de Nova York ordenou ao país o pagamento de 100% do efetivo de uma dívida de 1,33 bilhão de dólares a empresas conhecidas no jargão financeiro como “abutres”, por terem comprado títulos em moratória a preços muito baixos e não aceitarem nos tribunais o reescalonamento da dívida.

“O desenrolar das negociações pela dívida argentina é um fator muito decisivo. O preço da soja em baixa é outro problema conjuntural. Mas o principal é o momento recessivo, com os problemas críticos no mercado de trabalho e a inflação”, afirmou à AFP o sociólogo e professor universitário Manuel Mora y Araujo.

Acordo em risco

No dia 30 de julho vence o último prazo para pagar os 532 milhões de dólares aos compradores que aceitaram os acordos de 2005 e 2010, mas o juiz Thomas Griesa bloqueou o pagamento até que os outros credores também sejam atendidos.

O beco em que a Argentina se encontra é que, se a dívida dos fundos “abutres” for paga em 100%, existe uma cláusula que obriga o pagamento do total ao restante dos credores, que haviam negociado uma redução. O valor chegaria a 120 bilhões de dólares, segundo a consultoria Bein y Asociados.

Nesse cenário, a reestruturação apoiada por 93% dos credores para normalizar a gigantesca moratória de quase 100 bilhões de dólares de 2001 desabaria como um castelo de cartas.

“Como está a sociedade? A negociação com os ‘abutres’ é muito delicada, mas a expectativa por ela não se estende a todos, focando-se em setores econômicos, analistas e políticos”, ressaltou Rouvier.

*Publicado originalmente na AFP.

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