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Confusão no funeral de Soleimani deixa mais de 50 mortos no Irã

Milhares de iranianos pedem vingança aós um ataque dos EUA matar o general Qasem Soleimani

Confusão no funeral de Soleimani deixa mais de 50 mortos no Irã
Confusão no funeral de Soleimani deixa mais de 50 mortos no Irã
Funeral do general Qassem Soleimani. Foto: Prakash SINGH / AFP
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*Atualizada às 12h30

Mais de 50 pessoas morreram, e cerca de 212 ficaram feridas, em um tumulto registrado nesta terça-feira 7, em Kerman, ao sudeste do Irã, onde é celebrado o funeral do general Qassem Soleimani, acompanhado por milhares de iranianos, segundo um novo balanço oficial.

De acordo com o chefe do Instituto Médico Legal de Kerman, Abbas Amian, “mais de 50 pessoas morreram”.

Os pedidos de calma se multiplicaram nesta segunda-feira em um contexto de enfrentamento verbal entre Washington e Teerã, onde uma maré humana enlutada exigiu vingança pela morte de Soleimani, assassinado pelos Estados Unidos com um drone em Bagdá.

Depois que o líder dos EUA, Donald Trump, ameaçou no sábado atacar 52 locais no Irã, o presidente iraniano, Hassan Rohani, emitiu um alerta na segunda-feira: “Nunca ameace a nação iraniana”.

O secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, ao fim de uma reunião extraordinária, pediu para Teerã evitar “mais violência e provocações”.

Os ministros das Relações Exteriores da UE devem realizar uma reunião sobre a crise, e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, pediu “o caminho da moderação”.

Já o chefe da diplomacia francesa, Jean-Yves Le Drian, disse que Teerã precisa “renunciar a represálias” contra Washington.

Em um fria e ensolarada manhã, uma maré humana invadiu as avenidas Enghelab (“Revolução”, em persa), Azadi (“Liberdade”) e seu entorno, com bandeiras vermelhas (a cor do sangue dos “mártires”), ou iranianas, mas também libanesas e iraquianas.

Visivelmente emocionado, o aiatolá Khamenei pronunciou uma breve oração em árabe diante dos caixões do general Soleimani, do iraquiano Abu Mehdi al-Muhandis (número dois da coalizão paramilitar pró-iraniana Hashd al-Shaabi) e de outros quatro iranianos mortos no mesmo ataque.

Estimada em “vários milhões” pela televisão iraniana, a multidão gritou “Morte aos Estados Unidos”, “Morte a Israel”. Foram queimadas as bandeiras dos dois países. Homens e mulheres choravam pedindo vingança.

Resposta ‘devastadora’

“Trump estúpido, um símbolo de estupidez e brinquedo nas mãos do sionismo (Israel), não acha que, com o martírio de meu pai, tudo acabou”, alertou Zeinab, filha de Qassem Soleimani, cujo discurso emocionou a multidão.

“Nossa resposta deve ser devastadora. Precisamos atacar todas as bases militares dos EUA na região (…), tudo o que estiver ao alcance de nossos mísseis”, disse um iraniano de 61 anos que se identificou como Afjami.

Da capital iraniana, o caixão de Soleimani foi levado de avião para a cidade sagrada xiita de Qom para uma cerimônia. O general será enterrado na terça-feira em Kerman (sudeste), sua cidade natal.

Teerã prometeu uma resposta “militar”, uma “vingança dura” que atingirá “o lugar certo na hora certa”.

Embora a comunidade internacional multiplique seus pedidos de “desescalada”, “prudência” e “moderação”, Trump reiterou no domingo que se o Irã “fizer alguma coisa, haverá grandes represálias”.

Trump também ameaçou impor sanções “muito fortes” contra o Iraque, depois que o parlamento iraquiano votou uma resolução pedindo a retirada dos cerca de 5.200 militares dos EUA naquele território.

O Exército dos EUA anunciou na segunda-feira que “respeita [esta] decisão soberana” e que “reorganizará” as forças da coalizão anti-jihadistas com o objetivo de “retirar-se do Iraque de maneira segura e eficaz”.

Mas horas depois, o chefe de Estado-Maior dos EUA, Mark Milley, afirmou que este anúncio era o rascunho de uma carta que não deveria ter sido divulgada.

“Não há qualquer decisão de abandonar o Iraque (…). Não adotamos a decisão de sair do Iraque. Ponto”, garantiu o secretário americano de Defesa, Mark Esper.

A morte de Soleimani ocorreu após um ataque sem precedentes na embaixada dos Estados Unidos em Bagdá por manifestantes pró-iranianos.

Em Bagdá, o líder xiita iraquiano Moqtada Sadr ameaçou Trump com um novo “Vietnã”.

Questão nuclear é prioritária

Nesta convulsão, o Irã anunciou no domingo uma nova redução de seus compromissos contidos no acordo de 2015 sobre seu programa nuclear, em resposta à retirada unilateral dos Estados Unidos em maio de 2018 do pacto e ao restabelecimento das sanções econômicas contra Teerã.

O Irã detalhou que se desliga de qualquer limite “ao número de centrifugadoras” de urânio, mas disse que continuará a se submeter “como antes” a inspeções nucleares do Organismo Internacional de Energia Atômica (OIEA), contempladas no acordo.

O OIEA, com sede em Viena, disse estar “ciente do anúncio iraniano” e enfatizou que seus “inspetores continuam seus atividades de vigilância” no Irã.

França, Grã-Bretanha e Alemanha pediram para o Irã retirar “todas (as suas) medidas não conformes” do pacto. A Rússia pediu para os países signatários do acordo garantirem sua aplicação com “prioridade”. A Arábia Saudita, aliado dos EUA, pediu calma.

“O Irã nunca terá a arma nuclear!”, reagiu Trump, cujo país retirou-se unilateralmente do acordo em 2018.

Enquanto isso, os preços do petróleo continuam a subir e as bolsas mundiais se estremecem. O ouro alcançou nesta segunda seu preço mais alto desde meados de 2013.

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