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Colombianos vão às ruas em novo dia de protestos pela renúncia de Iván Duque

Protestos que começaram contra a reforma tributária acabaram sendo alvo de forte repressão pelas forças de segurança

Colombianos vão às ruas em novo dia de protestos pela renúncia de Iván Duque
Colombianos vão às ruas em novo dia de protestos pela renúncia de Iván Duque
(Foto: Juan BARRETO / AFP)
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A população colombiana se prepara nesta quarta-feira 4 para o oitavo dia consecutivo de manifestações nas principais cidades do país. Os protestos foram desencadeados pela reforma tributária proposta pelo presidente Duque. A meta dele era arrecadar mais de US$ 5 bilhões em impostos e evitar que a dívida colombiana fragilizasse a pontuação do país junto às agências internacionais de risco.

No entanto, a proposta foi rejeitada pela população, que tomou as ruas. Isso motivou o chefe de Estado a abortar as medidas, mas não amenizou o descontentamento da população. A crise levou à renúncia do então ministro da Fazenda, Alberto Carrasquilla.

A truculência das forças de segurança e os problemas estruturais na economia e na saúde colombianas motivam os protestos. Integrantes do setor de transporte e grupos indígenas se uniram aos manifestantes. A população também exige a retirada da reforma da saúde, que prevê privatizações no setor e limita o acesso a tratamentos, sobretudo para combater o novo coronavírus.

Os manifestantes também exigem a reforma policial, a desmilitarização das ruas e o reconhecimento das centenas de vítimas da repressão nas manifestações. De acordo com a ONG local Temblores, até a noite desta terça-feira 4 foram registrados cerca de 1443 casos de violência policial.

Atualmente milhares de colombianos pedem a renúncia de Iván Duque. Nesta terça-feira 03, o presidente iniciou o diálogo nacional com grupos políticos, sindicatos e com a sociedade civil. A meta é definir soluções urgentes para o descontentamento popular evidenciado pela greve geral desta quarta-feira 5.

Segundo Duque, o diálogo “não deve mediar diferenças ideológicas, mas sim um profundo patriotismo”. Pedindo consenso popular, o presidente destacou a importância de contar com todas as instituições, partidos, atores do setor privado, governadores, prefeitos e líderes da sociedade civil. Para Duque é importante rejeitar e colocar fim a todas as formas de violência.

Ele também adiou seu programa de TV Prevenção e Ação sob a justificativa de priorizar reuniões de trabalho. Assim Iván Duque, que tomou posse em 2018, tenta melhorar sua popularidade – que vem caindo nos últimos dias.

Apoio à violência

Na contramão de Duque, quem tentou ganhar protagonismo político com as manifestações foi o ex-presidente Álvaro Uribe (2002-2010). Mas o tiro saiu pela culatra. Uribe publicou nas redes sociais uma mensagem apoiando “soldados e policiais de usar suas armas para defender sua integridade e defender as pessoas e bens da ação criminosa do terrorismo dos vândalos”. A mensagem foi bloqueada pela rede social sob a justificativa de que ela violava as regras e incitava a violência.

O ex-presidente se referia à ação das forças de segurança em Cali, onde foi registrada maior truculência policial. Para tentar reverter a situação e apaziguar os ânimos dos manifestantes, os ministros do Interior, do Trabalho e integrantes do Conselho da Juventude e Regional estão na cidade, localizada no sudoeste colombiano.

Porém a situação pode ser ainda mais complexa por causa do histórico colombiano dos grupos paramilitares. De acordo com Procuradoria da Colômbia, “as desordens e os atos de vandalismo que aconteceram em Cali nos últimos dias teria uma relação com estruturas do narcotráfico, do ELN (Exército Nacional de Libertação) e com a dissidência das FARC”.

Apesar de estar em vigor uma série de medidas que impedem os deslocamentos para conter a pandemia, a maioria dos protestos foram registrados na capital Bogotá, em Medellín e em Barranquilla.

Os protestos contra o governo de Iván Duque devem continuar. Os problemas são muitos e de base estrutural. O presidente preferiu prestigiar os grandes grupos a manter a simpatia popular. Iván Duque precisa trabalhar em três frentes. A primeira é em torno da economia. O país é um dos mais desiguais da América Latina e do mundo. Críticos apontam que o presidente privilegia o setor privado ancorado no clientelismo político e em detrimento dos mais carentes.

Também é preciso destacar a desconfiança popular em torno das forças de segurança, por isso a pressão para que seja feita uma reforma policial, sobretudo após sessenta anos de conflitos armados no território colombiano. Além disso, há a questão da continuidade e melhor implementação do processo de paz para a superação dos traumas do conflito armado.

ONU, EUA e Shakira

Países, organismos e personalidades internacionais enviaram mensagens de alerta sobre o que acontece na Colômbia. Os Estados Unidos, aliados do governo de Iván Duque, pediram que as forças de ordem colombianas ajam com “máxima moderação” para evitar mais mortes.

A União Europeia pediu “que uso desproporcional da força” fosse evitado. Por sua vez, a ONU se declarou chocada com o que aconteceu em Cali na segunda-feira 03 quando a polícia abriu fogo contra os manifestantes. O ministro da Defesa colombiano, Diego Molano, acusou grupos armados pela violência nos protestos, mas não deu maiores informações sobre a morte de manifestantes.

Shakira e Maluma, estrelas da música pop e de origem colombiana, se pronunciaram contra a violência aos manifestantes. A cantora divulgou em suas redes sociais que “as balas jamais poderão silenciar a voz de quem sofre”. Até mesmo os jogos de futebol da Conmebol que seriam disputados na Colômbia precisaram ser transferidos para o Paraguai. Os jogos acontecem nesta quinta-feira na capital paraguaia.

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