A Argentina tem uma trajetória singular no campo das democracias sul-americanas. Com uma transição por colapso – vista, naquele momento, com reticências por cientistas políticos –, o país teve diversos governos exitosos no que diz respeito a uma lógica de construção democrática. O primeiro diferenciou-se por colocar, no centro das suas ações, o julgamento das graves violações dos direitos humanos ocorridas na ditadura. Desde os primeiros anos de redemocratização, o descontrole da economia esteve em pauta. Esse parece ser um bom resumo da democracia argentina: sucesso político e fracasso econômico. A eleição de 2023, com o primeiro turno previsto para 22 de outubro, pode significar o fim dessa trajetória no que diz respeito ao sucesso democrático.
Os primeiros governos argentinos após a democratização foram marcados por dois fenômenos: a ausência de uma nova Constituição e um ciclo perverso entre governos peronistas e não peronistas que impediu os presidentes não peronistas de completarem seus mandatos. O primeiro governo peronista exitoso, o de Carlos Menem, criou condições para uma solução efetiva para o primeiro problema ao incorporar, na revisão constitucional de 1994, os principais tratados de direitos dos quais o país era signatário. Abriu-se, então, uma via para a ampliação de direitos, como a adoção de filhos por casais gays e o aborto. O segundo elemento, a continuidade da tensão entre peronistas e não peronistas, resolveu-se apenas neste século, em 2019, quando Mauricio Macri completou seu mandato. Estabilizou-se, aí, um dos principais déficits da democratização argentina.
Para proteger e incentivar discussões produtivas, os comentários são exclusivos para assinantes de CartaCapital.
Já é assinante? Faça login