Mundo

Brasil chega ao Fórum de Davos com poucas promessas cumpridas

Paulo Guedes, João Doria e Luciano Huck serão as caras do país em evento que terá o meio ambiente como pauta central

Foto: Benedikt von Loebell/World Economic Forum
Apoie Siga-nos no

Vinte e dois dias após sua posse como presidente, em 2019, Jair Bolsonaro fazia um apressado discurso de seis minutos no Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça. No curto espaço de tempo, convidou a plateia a visitar a Amazônia e disse que sua missão seria compatibilizar a preservação ambiental ao desenvolvimento econômico do país. “Somos o país que mais preserva o meio ambiente”, exaltava, em sua primeira aparição internacional como presidente. O novo chefe do Palácio do Planalto prometeu ainda dinamizar as suas relações internacionais com o chanceler Ernesto Araújo, combater a corrupção com o ministro Sergio Moro, reduzir a pobreza e instituir reformas econômicas com Paulo Guedes, a fim de atrair investidores.

Em um ano de gestão, o que o mundo viu? A devastação ambiental aumentou, Bolsonaro distribuiu agressões gratuitas a presidentes e até contra uma primeira-dama, o governo brasileiro ajoelhou-se à política externa dos Estados Unidos, o ministro da Justiça foi alvo de escândalos pelos vazamentos do site The Intercept Brasil, a informalidade no mercado de trabalho bateu recorde. Sobram, portanto, poucas promessas cumpridas a serem propagandeadas na edição do Fórum de 2020, que teve abertura na segunda-feira 20 e se estende até sexta-feira 24.

Enaltecer o aprofundamento das reformas econômicas, portanto, é a tarefa do ministro Paulo Guedes, que vai representar o Brasil no evento no lugar de Bolsonaro. Com discurso marcado para esta terça-feira 21, Guedes deve se concentrar em convencer a comunidade internacional de que o país está mais interessante para investidores, com a aprovação da reforma da Previdência, o avanço nas privatizações de empresas estatais, entre outras medidas econômicas. Para atrair o olhar dos empresários, o ministro deve exaltar ainda as articulações pelo acordo entre o Mercosul e a União Europeia e a possível entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Em sua agenda, estão previstas participações em painéis sobre o futuro da indústria e sobre as perspectivas para a América Latina. Não se sabe se Guedes usará um desses espaços para explicar o desastre do governo em cumprir suas responsabilidades ambientais. Também fica a dúvida se haverá alguma postura em amenizar a mensagem de horrores que o Brasil passou ao mundo após um membro do governo homenagear o nazismo em pleno vídeo institucional.

Doutor em Relações Internacionais e professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), Leonardo Ramos avalia que a escolha de Bolsonaro em enviar Guedes pode expressar, de alguma maneira, que o valor que deu ao fórum em 2019 diminuiu neste ano. Afinal, o caos ambiental do governo parece corresponder pouco às expectativas desta edição do evento, voltada prioritariamente para debates sobre sustentabilidade. Em 14 de janeiro, por exemplo, o Brasil recebeu menção especial no relatório da Human Rights Watch, que apontou a área ambiental como a mais preocupante.

“A ida do Guedes como representante destaca que, daquilo que foi falado um ano atrás, o ponto central é o econômico. É o Brasil se tornar atrativo para o capital internacional. A vantagem da ida do Guedes para o governo é de que fica menor o risco de uma patacoada no discurso, típica do Bolsonaro. Por outro lado, se der certo, o Bolsonaro, enquanto sujeito, não vai capitalizar pessoalmente porque não estará lá”, examina o pesquisador.

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), também se fará presente em Davos para discursar em um encontro com governadores sobre o mercado imobiliário, com a presença do ex-vice-presidente dos Estados Unidos Al Gore. O tucano também deve participar do seminário “América Latina: Reformas para o Crescimento e Inclusão”, com palestras do presidente da Colômbia, Ivan Duque, e do presidente do Equador, Lenín Moreno. Guedes também deve falar no espaço.

Doria diz que seu objetivo na Suíça será atrair investidores. De fato, é disso que se gaba ao lembrar que palestrou nos dois anos anteriores e trouxe de volta aportes de 7 bilhões da asiática Bracell na edição de 2018. Mas, para Ramos, faz parte de suas intenções fortalecer seu networking com a comunidade internacional, numa possível trilha em direção às eleições presidenciais de 2022.

Tentativa semelhante é a do apresentador da TV Globo Luciano Huck, que ensaia, cada vez menos comedidamente, sua?feature=oembed" frameborder="0" allowfullscreen> pretensão eleitoral para a presidência da República. É a segunda vez que Huck vai ao fórum. Em 15 de janeiro, publicou no site do evento um longo texto sobre os retrocessos ambientais no Brasil. Na visão de Ramos, tudo parece uma investida para que a elite internacional o enxergue menos com o figurino de animador de auditório e se convença da plausibilidade de sua atuação como liderança política.

O ministro Paulo Guedes representará o presidente Jair Bolsonaro em fórum na Suíça. (Foto: Isac Nóbrega/PR)

“Ele toca exatamente em questões que Bolsonaro tocou em Davos no ano passado e que não foram solucionadas, como o meio ambiente, o combate à corrupção e o aumento de distribuição de renda. Uma vez que Huck tem tentado se projetar como presidenciável, o primeiro passo é tentar convencer as elites domésticas e internacionais de que ele não é um azarão, nem um oportunista, mas sim, de que é uma figura a ser levada a sério”, opina o pesquisador.

Será uma edição especial, pois o encontro completa 50 anos em 2020. O Fórum Econômico Mundial foi criado como uma fundação sem fins lucrativos em 1971, pelo alemão Klaus Schwab. De acordo com a agência Bloomberg, 100 bilionários são esperados neste ano. Entre eles, 33 são dos Estados Unidos, 19 da Índia e 7 da Rússia. Eles concentram, juntos, cerca de 500 bilhões de dólares. O CEO da JP Morgan, Jamie Dimon, o CEO da Blackstone Group, Stephen Schwarman, e o fundador da Huawei, Ren Zhengfei, são alguns dos magnatas aguardados.

Também confirmaram presença o presidente da França, Emmanuel Macron, a chanceler alemã, Angela Merkel, o premiê britânico, Boris Johnson, e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Esta edição do fórum deve contar com a participação de outros 50 chefes de Estado. Ao todo, são três mil pessoas aguardadas.

A lista seleta de participantes será pautada por sete temas principais, abordados por sete reuniões diferentes: “Como salvar o planeta”, “Sociedade e futuro do trabalho”, “Tecnologia para o bem”, “Economias mais justas”, “Melhores negócios”, “Futuros saudáveis”, “Geopolítica mundial”. Uma das expectativas para o encontro é de que, além da pauta ambiental, sejam debatidos também os rumos do comércio internacional, como as relações entre Estados Unidos e China, que acabam de assinar a primeira fase de um acordo de trégua.

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.

Leia também

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo