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Ascensão da direita na França dá tom para presidenciais

Frente Nacional como terceira força e rejeição ao Partido Socialista, de François Hollande, em pleito regional servem de parâmetro para disputa à presidência em 2017

Nicolas Sarkozy, da UMP, prometeu acabar com o "mais arcaico modelo socialista da Europa"
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Por Elizabeth Bryant, de Paris (rc)

Para o ex-presidente da França, Nicolas Sarkozy, os resultados das eleições departamentais deste domingo 29 confirmam o seu retorno à cena política – e três anos após uma despedida aparentemente definitiva. Mas, para observadores, mais significativa ainda é ascensão da Frente Nacional, de extrema direita, à terceira força do país, que há tempos é marcado por um bipartidarismo.

“Saímos de um sistema bipartidário rumo a um panorama com três partidos, com a inclusão da Frente Nacional”, observa o analista político Philippe Moreau Defarges, do Instituto Francês de Relações Internacionais. “O resultado atual não é tão importante. Mais significativo é que a Frente Nacional pode agora ser considerada como parte do panorama político.”

A União por um Movimento Popular (UMP), de Sarkozy, conquistou a maioria no Legislativo de pelo menos 66 departamentos (um terço do total), onde terá direito de formar governo. Apesar de não ter conquistado nenhum dos departamentos, a Frente Nacional teve dezenas de candidatos eleitos e atraiu um em cada quatro votos durante o primeiro turno.

O resultado é um golpe duro para os socialistas, que perderam metade de seus departamentos, controlando a partir de agora apenas 31 deles. Além disso, os governistas perderam para os direitistas o comando de várias regiões consideradas essenciais, incluindo Corrèze, do presidente François Hollande, e Essonne, um departamento próximo a Paris que é base política do primeiro-ministro Manuel Valls.

Reconhecendo o que chamou de “revés”, Valls prometeu continuar com o plano do governo de reavivar a combalida economia do país e afirmou que novas medidas serão anunciadas para incentivar a criação de postos de trabalho.

Para o analista Étienne Schweisguth, do Centro de Estudos Europeus, o resultado reflete um padrão histórico do eleitorado francês de “punir o partido governante” através do voto na oposição.

Ele afirma que ainda mais preocupante para a esquerda é o futuro. “Pessoalmente, acho que a situação de Hollande parece desesperadora”, opina. “Não vejo como ele conseguirá vencer as eleições em 2017. Ele, porém, parece acreditar que sim.”

De acordo com Schweisguth, a tática de Hollande era eliminar todos os rivais à sua esquerda – estratégia que, afirma, estava fadada ao fracasso.

O grande vencedor no domingo foi o principal adversário de Hollande, o ex-presidente Sarkozy, que aparenta ter consolidado sua liderança dentro da UMP. No discurso da vitória, ele atacou com voracidade o governo socialista, que, segundo afirmou, “encarna a derrota em todos os níveis”.

“Foram as mentiras, a impotência, que foram punidas”, declarou Sarkozy em um discurso agressivo onde prometeu “acabar com o mais arcaico modelo socialista da Europa” com a possível volta da direita ao poder.

Enquanto outros possíveis candidatos conservadores – entre eles os ex-primeiros-ministros Alain Juppé e François Filon – ainda refletem sobre concorrer ou não à presidência, Sarkozy parece ser o “mais qualificado para unir a direita e conduzi-la à vitória nas eleições”, observa Schweisguth.

“Na minha opinião, o único fator que poderia impedi-lo de se eleger em 2017 seria algum obstáculo judicial”, acrescenta o especialista, lembrando os escândalos que continuam a assombrar a figura do ex-presidente.

As eleições locais fortalecem a líder da extrema direita, Marine Le Pen, que também cogita uma candidatura à presidência. “Estamos no limiar da mudança”, declarou, eufórica, ao jornal Le Monde, após a divulgação dos resultados no último domingo. “Testemunhamos a maior reconfiguração do cenário político nos últimos 40 anos.”

Schweisguth credita parcialmente o sucesso da legenda de Le Pen a uma campanha cuidadosamente orientada para agradar o grande eleitorado, como ao rejeitar o legado antissemita da Frente Nacional. A líder da extrema direita conseguiu, segundo o analista, “destravar” alguns sentimentos nos eleitores franceses, levando a sigla a atingir recordes de popularidade no país.

“Sua outra grande inovação política foi utilizar a Europa e a globalização como sendo a fonte dos problemas econômicos franceses”, diz o analista do Centro de Estudos Europeus, ressaltando que Le Pen proporcionou “unidade a seu discurso político” ao apontar que todos os problemas do país vêm de fora.

Moreau Defarges acrescenta que a demonstração de força da Frente Nacional nas eleições departamentais poderá forçar mudanças na política convencional francesa. “É possível que venhamos a testemunhar uma reordenação do cenário político com a inclusão de uma terceira via, um caminho intermediário, que atraia moderados da direita e da esquerda”, afirma.

O especialista do Instituto Francês de Relações Internacionais prevê que os dois lados deverão tentar assimilar algumas das mensagens populistas e antieuropeias da Frente Nacional, na tentativa de conquistar um eleitorado que se sente ignorado pelos partidos tradicionais.

Le Pen A ultradireitista Marine Le Pen comemora o que chamou de “a maior reconfiguração do cenário político nos últimos 40 anos”

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