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Após enormes protestos, Índia revoga leis de reforma agrícola

Quase dois terços da população indiana sobrevive da agricultura, setor que sempre foi um campo minado pela classe política

Agricultores em Singhu comemoram a revogação das leis de reforma agrícola que provocaram quase um ano de enormes protestos de agricultores em todo o país (Foto: Xavier Galiana / AFP)
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A Índia iniciará a revogação de três leis de reforma agrícola que deflagraram protestos multitudinários de de agricultores por quase um ano – anunciou o primeiro-ministro Narendra Modi nesta sexta-feira 19, em uma reviravolta em sua política.

“Decidimos revogar as três leis agrícolas. Começaremos o processo constitucional para revogar as três leis na sessão parlamentar que começa no final do mês”, disse Modi, em um discurso à nação.

“Peço a todos os agricultores que participam do protesto (…) que voltem para suas casas, para seus entes queridos, para as fazendas e famílias”, acrescentou o premiê, pedindo para “começar do zero e avançar”.

Milhares de agricultores, muitos deles do estado de Punjab, ao norte, estavam acampados desde novembro de 2020 na periferia da capital do país, Nova Délhi, neste que foi um dos maiores desafios para o governo de Modi.

Quase dois terços da população de 1,3 bilhão de indianos devem sua subsistência à agricultura, um setor que sempre foi um campo minado pela classe política.

“O que eu fiz, fiz pelos agricultores. O que eu faço, faço pelo país”, declarou Modi, de 71 anos.

“Quero garantir a vocês que vou trabalhar mais duro para que seus sonhos possam se tornar realidade, para que os sonhos do país se tornem realidade”, prometeu.

Eleições cruciais

Esta mudança brusca de orientação por parte do governo Modi se dá antes da realização de eleições nos estados de Punyab e Uttar Pradesh, o mais populoso do país com 220 milhões de habitantes.

O editor da revista Caravan, Hartosh Singh Bal, disse à AFP que essas leis estavam mortas e apenas “o ego de Modi se interpunha no caminho do governo para revogá-las”.

Gautam Chikermane, vice-presidente do “think tank” Observer Research Foundation, baseado em Nova Délhi, acredita, no entanto, que se trata da “pior decisão de Modi”.

“É um dia negro (sic) na história das reformas econômicas da Índia”, disse ele à AFP, argumentando que o setor agrícola está “condenado à própria sorte” para os próximos 25 anos.

Já Amarinder Singh, ex-governador de Punjab, celebrou o anúncio de Modi como “uma notícia fantástica”.

“Obrigado ao primeiro-ministro Narendra Modi por ter concordado com os pedidos de todos os punjabis e por ter revogado as três leis negras (sic)”, tuitou.

Desconfiança

Nos acampamentos de agricultores nos arredores da capital, algumas pessoas comemoram, mas outras mantêm cautela.

“Não confiamos nele. Até que ponha tudo por escrito, não vamos embora”, disse à AFP Mohan Singh, um agricultor de 52 anos de Punyab, acampado no local desde maio.

O nacionalista Modi defendeu essas reformas pela necessidade de ajustar um setor que é muito ineficiente. Foram aprovadas em setembro de 2020 com o objetivo de desregulamentar o mercado agrícola.

Com isso, os agricultores estariam autorizados a vender seus produtos para compradores de sua escolha, e não em mercados controlados pelo Estado. Há décadas, órgãos estaduais estabelecem os preços mínimos das safras.

Muitos deles acreditam, porém, que essa liberalização de preços poderia forçá-los a vender seus produtos mais baratos para grandes empresas, ficando à mercê destas corporações.

Várias tentativas de negociação com as autoridades foram realizadas, mas sempre falharam, levando às manifestações em massa.

Os protestos sofreram uma guinada violenta em janeiro, quando um desfile de tratores em Nova Délhi se transformou em uma ofensiva que terminou na morte de um agricultor e deixou centenas de policiais feridos.

No mês passado, oito pessoas morreram em distúrbios no estado de Uttar Pradesh, no norte do país.

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