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‘Agora é guerra civil’, dizem manifestantes no Peru; 46 morreram em meio a protestos

Os enormes atos continuarão, avisou nesta segunda o ministro do Interior, Vicente Romero

Protesto em Lima, no Peru, em 23 de janeiro. Foto: Ernesto Benavides/AFP
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“Agora é guerra civil!”, exclamavam centenas de manifestantes que marchavam em Lima, nesta segunda-feira 23, pedindo a renúncia da presidente do Peru, Dina Boluarte, em meio a protestos que já causaram 46 mortes.

“Não somos um, agora somos dois, agora somos todos, em uma só voz”, diziam andinos que saíram de Puno, Cusco e Andahuaylas, durante uma mobilização à tarde sob um sol escaldante na capital.

A marcha percorreu pacificamente várias quadras entre as praças Dois de Maio e Bolognesi, até ser dispersada pela polícia de choque com gás lacrimogêneo. Os manifestantes tentavam se reagrupar para continuar o protesto entre uma forte presença policial.

“Precisamos urgentemente que Dina renuncie. Por sua culpa estamos uma semana aqui sofrendo, vamos reivindicar até os últimos dias para que ela renuncie”, declarou à AFP Edmunda Ccanaguira, uma indígena de 60 anos que chegou há uma semana de Sicuani, Cusco.

“Ela não escuta o povo, por sua culpa estamos nas ruas, uma semana sem alimento, sem dormir. Por culpa de Dina Boluarte estamos aqui.”

Ministro: protestos seguirão

Os enormes protestos que abalam o Peru continuarão, avisou mais cedo o ministro do Interior, Vicente Romero, às vésperas de uma “marcha nacional” em Lima e outras cidades.

“Os protestos sociais ainda vão seguir, estamos trabalhando intensamente com o ministro da Defesa para solucioná-los”, declarou o titular de Interior à estatal TV Perú.

A autoridade defendeu a repressão policial, questionada por grupos civis da sociedade, alegando haver profissionalismo e respeito aos direitos humanos.

“Neste momento, estamos vivendo um dos níveis de violência mais altos de todos os últimos tempos depois dos anos 80. No entanto, creio que as capacidades mostradas por nossa polícia têm sido espetaculares”, afirmou Romero.

“Capacitamos mais de 5 mil homens, sobretudo em direitos humanos”, prosseguiu. Em 2018, as polícias francesa e espanhola formaram corpos antimotim peruanos.

A União Europeia levantou no sábado a voz sobre a crise e lamentou “o grande número de vítimas fatais”.

Bruxelas pediu ao governo e à oposição que “tomem medidas urgentes para restaurar a calma”.

Liberados da Universidade

A polícia peruana esteve no centro das críticas pela entrada violenta – sem fiscais – na Universidade Nacional de San Marcos, em Lima, para deter manifestantes que vinham de regiões andinas e dormiam lá. Dos 193 detidos, 192 foram liberados na noite de domingo.

O Escritório do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos instou pela preservação da “legalidade e pela proporcionalidade da intervenção, além de garantias do devido processo”.

Uma marcha nacional foi convocada para esta terça-feira pela Confederação Geral de Trabalhadores do Peru, sob o lema “fim da repressão criminosa”.

A principal central sindical do país exige também o fechamento do Congresso e a instalação de uma Assembleia Constituinte.

“O povo nacional vem desenvolvendo as lutas democráticas cívicas, pacíficas. Rejeitamos qualquer ato de violência e qualquer ato que vá contra entidade pública ou privada. Os que estão gerando o caos e destruição são pessoas infiltradas do governo”, declarou o secretário-geral da CGTP, Gerónimo López.

O ministro do Interior apontou que “há reivindicações que o governo tem de atender”, mas denuncia a presença de vândalos entre os manifestantes.

Machu Picchu segue fechada

Segundo as autoridades de Transportes, nesta segunda-feira, 74 piquetes bloqueavam a passagem em estradas de 10 das 25 regiões peruanas que pedem a renúncia de Boluarte.

Em Ica, 350 quilômetros ao sul de Lima, um grupo de pessoas atacou e incendiou propriedades agrícolas de empresas exportadoras, de acordo com imagens da televisão.

Os aeroportos de Arequipa e Juliaca, em Puno, seguem fechados sob custódia militar para evitar que seja tomado de assalto.

O serviço ferroviário entre Cusco e Machu Picchu, joia do turismo do Peru, está suspenso pelo fechamento até segunda ordem da famosa cidadela inca, por motivos de segurança.

“A cidadela está fechada até que essa questão seja resolvida. A via férrea está interrompida, não há como os turistas chegarem. Agora só estamos seguindo com a manutenção e a conservação do patrimônio, que não deve parar”, explicou à AFP Zenobio Valencia, chefe do Parque Arqueológico Machu Picchu.

Os protestos foram desencadeados pela deposição e pela prisão do presidente esquerdista Pedro Castillo em 7 de dezembro, quando ele tentou dissolver o Parlamento – controlado pela direita -, que estava a ponto de tirá-lo do poder por suposta corrupção.

A crise social também é um reflexo da enorme brecha entre a capital e as empobrecidas províncias que apoiaram Castillo, de ascendência indígena, nas eleições de 2021, e viram sua vitória como uma vingança pelo que consideram o desprezo do poder centralizado de Lima.

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