Mundo

cadastre-se e leia

A eleita

A cantora Taylor Swift vira assunto central na disputa entre Donald Trump e Joe Biden

A verdadeira rival dos republicanos – Imagem: Milen Camp-Patrick
Apoie Siga-nos no

A atual campanha para as eleições presidenciais nos Estados Unidos, sem qualquer história clara para contar e com um desânimo predominante numa revanche entre candidatos ao redor dos 80 anos, decidiu-se recentemente pela cantora Taylor Swift – e o apoio que ela poderá dar ou não a um candidato – como sua obsessão definidora.

Por um lado, as expectativas no campo da reeleição do presidente Joe Biden eram de que a superestrela de 34 anos exerceria sua influência sobre dezenas de milhares de swifties a favor dele. Por outro, republicanos furiosos que em princípio tentaram criticar a compositora e envolvê-la em teorias da conspiração pensaram melhor na estratégia. Segundo informou a revista Rolling Stone, aliados de Donald Trump prometeram iniciar uma “guerra santa” contra Swift se ela se aliasse aos democratas na eleição de novembro. Alguns teorizaram que a Liga Nacional de Futebol dos Estados Unidos, a NFL, estaria a manipular jogos a favor do namorado da cantora, Travis Kelce, do time Kansas City Chiefs, para aumentar as esperanças de apoio a Biden.

O apresentador Jesse Watters, da Fox News, afirmou que a canção de sucesso Shake It Off (Livre-se Disso) foi transformada em instrumento de operações psicológicas há quatro anos. O Pentágono respondeu: “Quanto a essa teoria da conspiração, vamos nos livrar dela”.

O ex-presidente republicano tem obsessão pela estrela pop

Nem todos os republicanos aceitam, porém, os ataques a Swift. “Não sei por que essa obsessão”, disse a candidata presidencial Nikki Haley à CNN. “Taylor Swift pode ter um namorado. Taylor Swift é uma boa artista. Levei minha filha aos shows dela. Ter uma teoria da conspiração sobre tudo isso é bizarro. Ninguém sabe quem ela vai apoiar, mas não consigo acreditar que isso esteja dominando a nossa política nacional.”

Enquanto muitos estão preocupados se Swift poderá cruzar nove fusos horários para voltar de um show da “Eras Tour” em Tóquio para ver seu namorado jogar no Super Bowl do Kansas ­City Chiefs contra o San Francisco 49ers, em Las Vegas (ela poderá), a intensidade das questões políticas em torno da estrela pop reflete a natureza febril das eleições daqui a dez meses.

Sem dúvida, a artista poderia oferecer aos políticos lições sobre mensagens baseadas em valores, entendimento do público e construção de conexões verdadeiras com fãs ou eleitores. Dias atrás, Trump afirmou ser mais popular do que ela, mesmo se as narrativas basea­das em valores que ele apresenta estejam muitas vezes mais ligadas à vitimização do que à capacitação.

Trump e Biden, velhos brancos, têm dificuldade para atrair os eleitores mais jovens. Enquanto isso, mais da metade dos norte-americanos, de todos os gêneros, cores e credos, se declaram fãs de Taylor Swift – Imagem: Kent Nishimura/AFP e David Beker/AFP

Uma pesquisa realizada no ano passado pela Morning Consult descobriu que 53% dos adultos norte-americanos são fãs de Swift, quase o mesmo número de homens que de mulheres, de republicanos e de democratas, incluindo integrantes das gerações baby boom, do milênio, geração X e jovens adultos da geração Z. Em outras palavras, um eleitorado que pode decidir o rumo de uma campanha nacional.

As recentes primárias republicanas em New Hampshire indicaram a fraqueza de Trump com as mulheres, que são a maioria dos fãs de Swift. Mas pesquisas recentes também mostraram que as porcentagens de Biden e o apoio entre os jovens eleitores caíram, e agora ele está empatado com Trump na faixa de 18 a 34 anos. “Eles não são loucos por Biden”, diz Hank Sheinkopf, consultor do Partido Democrata. “Se forem votar, pode ser para se opor a Trump e sem intensidade alguma. Mas, se você está tendo dificuldades com os mais jovens e precisa fazer alguma coisa, que melhor maneira de resolver o problema, ou ao menos mostrar que é sensível a ele, do que trazer Taylor Swift?”

De acordo com David Allan, professor de marketing da Universidade Saint Joseph’s, na Filadélfia, que dá um curso focado em Swift, os republicanos terão de saber navegar. “Eles precisam ter cuidado com Taylor, porque ela é extremamente popular entre as mulheres de todas as faixas e alguns homens. Você não quer parecer malvado, porque isso só vai unir os fãs dela”, afirma. Por outro lado, atacar Swift poderia trazer ­suas próprias recompensas contraintuitivas, de guerra cultural e de classes. “Você saberá que ela está tendo algum efeito se a Fox News a atacar”, diz Allan. “Para Trump, ter Taylor Swift contra lhe dá algo para falar.”

Os swifities, fãs da cantora, teriam o condão de decidir as eleições nos EUA?

Uma lição importante vem das ­Dixie Chicks, hoje apenas Chicks, que destruí­ram suas carreiras antes da guerra do Iraque, quando a cantora ­Natalie ­Maines disse num show em Londres que tinham vergonha de o presidente ­George Bush ser do Texas. No documentário de Swift, Miss Americana, seu pai temia que uma posição política declarada ­pudesse colocá-la na mesma posição que as ­Chicks. Mas agora se acredita que Swift seja importante demais para ser comercialmente vulnerável.

Como disse o boletim da indústria musical Hits Daily Double, “seu domínio do mercado, por todos os ângulos concebíveis, é de alto nível. Mas ela parece ficar maior e dominar todas as áreas em que entra: os álbuns regravados, a turnê enorme, o sucesso do filme da turnê, os jogos da NFL, onde sua mera presença muda o centro de gravidade”.

Quer Swift apoie Biden, quer não, acrescenta Allan, “está chegando aquele ponto dos anos 60 em que se Bob Dylan ou Joni Mitchell não falassem sobre a Guerra do Vietnã ficariam prejudicados em relação a seus fãs. Se ela não fizer alguma coisa, mesmo que seja apenas para tentar aumentar a participação, vai prejudicar sua autenticidade”. Em setembro, a Vote.org relatou mais de 35 mil novos registros políticos, um salto de 23% em relação ao ano passado, depois que Swift incentivou seus 280 milhões de seguidores no Instagram a se registrar.

Nos anos 60, Frank Sinatra e Sammy Davis Jr. foram cabos eleitorais de Kennedy – Imagem: CBS

Swift, que foi politicamente cautelosa até que apoiou o candidato democrata ao Senado pelo Tennessee, Phil ­Bredesen, em 2018 (ele perdeu), e depois Biden em 2020, não demonstrou qualquer interesse em ser adotada por facções políticas. Um longo ensaio no New York Times, segundo o qual ela era mais do que apenas amiga dos homossexuais, foi criticado por fazer suposições exageradas.

É comum os candidatos norte-americanos procurarem o apoio do mundo do espetáculo. “A tradição remonta a 60 anos ao menos, quando John F. ­Kennedy trouxe Frank Sinatra, Sammy Davis Jr., Judy Garland e outros para lhe darem apoio, e estrelas da música country se manifestaram principalmente pelos republicanos”, observa ­Sheinkopf. Outros endossos musicais incluem The Allman Brothers Band e Lynyrd Skynyrd para Jimmy Carter. Músicos como ­Madonna, Bruce Springsteen e Lady Gaga não conseguiram, no entanto, levar Hillary ­Clinton até a linha de chegada em 2016, e não fez mal a Trump usar como canção de despedida o hino gay YMCA, do Village People, que as multidões apreciam muito.

Talvez Swift nem precise apoiar ­Biden formalmente, acrescenta Sheinkopf. “Mesmo divulgar isso como boato faz com que Biden pareça menos ter 81 anos e mais como se estivesse a ouvir os jovens, seus desejos subculturais e o que eles pensam sobre as coisas.” O professor acrescenta: “Ela será uma tomadora de decisões e uma figura ainda maior na vida americana e internacional. Sua personalidade pública torna-se tão importante quanto sua música, e isso significa que ela ganhará muito mais dinheiro”. •

Publicado na edição n° 1297 de CartaCapital, em 14 de fevereiro de 2024.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A eleita’

Leia essa matéria gratuitamente

Tenha acesso a conteúdos exclusivos, faça parte da newsletter gratuita de CartaCapital, salve suas matérias e artigos favoritos para ler quando quiser e leia esta matéria na integra. Cadastre-se!

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Leia também

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo