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“Trump é narcisista e perigoso”, diz ex-presidente do Banco Mundial

Robert Zoellick diz por que não quer o bilionário na Casa Branca e por que acredita que Hillary Clinton sairá vencedora

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Robert Zoellick foi presidente do Banco Mundial de 2007 a 2012. Antes disso, trabalhou em vários governos republicanos, inclusive como secretário de Estado adjunto e Representante para Comércio dos EUA. Em entrevista, ele fala de suas diferenças ideológicas com Donald Trump e da ameaça que este representaria se fosse eleito presidente.

Para ele, o candidato republicano é “narcisista” e “orientado pelo ego”. “Tive a sorte de servir a uma variedade de presidentes, sei a importância desse trabalho e não quero Trump no Salão Oval”, afirma.

DW: O senhor, juntamente com muitos líderes republicanos, se opôs fortemente às ideias sobre políticas externa e econômica de Donald Trump, declarando que não poderia votar nele, já que ele “seria o presidente mais irresponsável na história americana”. O senhor mantém essa avaliação sobre Trump?

Robert Zoellick: Sim. Esta é uma eleição particularmente incomum na vivência americana. Por um lado, Hillary Clinton é uma figura estabelecida, que faz uma campanha tradicional seguindo regras do passado. Mas as regras estão em movimento. Donald Trump, por outro lado, defende a visão de que este sistema está fundamentalmente quebrado. Ele prega a mudança e vende a ideia de que ele, como alguém de fora, é a pessoa que pode fazer essa mudança.

E ele usa sua experiência empresarial, mas especialmente – e isso que achei um elemento particularmente preocupante – a noção de que parte do problema é causada pelo “outro”. E o “outro” pode ser mexicano, muçulmano ou outros estrangeiros. Vimos antes na história o que acontece quando países culpam os outros por seus problemas.

Minhas diferenças ideológicas com Trump não envolvem apenas política – seu protecionismo, sua paixão por líderes autoritários e [o presidente russo,] Vladimir Putin. Mas também acho que ele é uma pessoa narcisista, orientada pelo ego e que seria perigoso. Eu tive a sorte de servir a uma variedade de presidentes, sei a importância desse trabalho e não o quero [Trump] no Salão Oval.

DW: Qual é a sua opinião sobre a candidata presidencial democrata Hillary Clinton e a nova investigação sobre emails dela pelo FBI, possivelmente relacionada a uma investigação anterior?

RZ: Ela representa o establishment no lado democrata. Uma das ironias é que se os democratas não tivessem os chamados superdelegados, ela poderia não ter sido nomeada, ela poderia ter perdido para Bernie Sanders. Portanto, este movimento populista é um fenômeno na esquerda e na direita. Isso irá afetá-la se ela for eleita presidente, porque o Partido Democrata não é mais o partido de 1990, quando seu marido era presidente. Você já pode ver que Elizabeth Warren, Bernie Sanders e outros alertam que já existe uma lista negra de pessoas que você não pode nomear.

Essa questão vai ser bastante importante para o futuro, caso ela seja eleita. Porque a questão é se ela vai tentar se mover para o centro e, no processo, tentar realinhar algo dos partidos e cooptar alguns republicanos, já que acredito que ela pegará alguns votos dos republicanos. Mas, ao mesmo tempo, em nosso sistema, ao contrário do sistema parlamentar alemão, você tem que trabalhar com o Congresso. Então, eu pessoalmente acho que ela tem mais personalidade para trabalhar com o Congresso do que o presidente Obama.

DW: Quem o senhor acha que seria um melhor presidente para a Europa e para o mundo e por quê?

RZ: Acho que Trump é perigoso em todas as frentes. E acho que uma presidente Clinton adotará uma política mais firme em relação à Rússia, sem necessariamente ser beligerante. Mas ela se deixou acuar em relação a questões comerciais, o que não acho que seja algo bom para a Europa, os EUA ou outros. Há maneiras de ela encontrar uma solução alternativa a isso, e os primeiros compromissos dela, com representantes de comércio dos EUA, vão ser importantes para sinalizar isso.

Também penso, seja no caso do presidente Obama ou do próximo presidente, que os Estados Unidos e a Alemanha foram um pouco desleixados nesse ponto. Acho que há coisas que os EUA poderiam fazer, por exemplo, quanto às negociações do Brexit, que poderiam ajudar no processo entre a UE e o Reino Unido.

Da mesma forma, acho que, com um país como a Polônia, com o qual os EUA têm laços tradicionalmente fortes – e os poloneses contam com os EUA na questão da segurança – existem maneiras de os EUA serem, talvez, solidários, dizendo aos poloneses que você vai ter que ser mais cooperativo no sistema geral, porque há sinais na Polônia e na Hungria que parecem um pouco com o que havia no período entre guerras.

Os Estados Unidos poderiam ser mais solidários de diferentes maneiras, mas não tenho certeza se uma presidente Clinton e sua equipe seriam criativos nesse sentido. Eles podem estar propensos a deixar a Europa para os europeus. Enquanto os europeus, é claro, têm que ser aqueles que tomam as decisões. Acho que os Estados Unidos poderiam ser solidários e úteis.

DW: O senhor, então, votará em Clinton? Qual é a sua previsão para a eleição?

RZ: 
Eu disse que não vou votar em Trump. Mas nos Estados Unidos a votação é secreta. Eu já dei meu voto, porque devo estar viajando no dia.

Não acho que o mais recente relatório do FBI possa virar o jogo e tranquilamente diria que Hillary Clinton tem cerca de 70% de chance. E parte disso se deve ao colégio eleitoral no sistema americano, no qual se você ganha um estado, você ganha todos os votos desse estado. Se tivesse que fazer uma aposta, eu diria que na quarta-feira estaremos felicitando a presidente Clinton.

DW: O Partido Republicano tem sido dilacerado por Donald Trump nesta campanha. Qual deverá ser o futuro da legenda após a eleição?

RZ: Essa é outra questão bastante incerta. Acho que parte dela depende do desempenho final de Trump. Vejo três facções. Uma delas será de pessoas intimamente associadas a Trump. No caso da derrota dele, esta vai buscar vingança e retaliação, e a continuação do ódio que ele tem representado.

Há outro grupo, associado ao senador Ted Cruz, do Texas, que estará competindo com o candidato à vice-presidência, o governador Mike Pence, de Indiana, e que vai assumir a visão de que Trump está correto e de que o sistema está quebrado e de que precisamos mudar, mas que ele não era conservador o suficiente.

E haverá muitos outros, incluindo uma série de governadores republicanos e o presidente da Câmara, Paul Ryan, que favorecem políticas mais inclusivas, e eles vão adotar posições diferentes. É difícil dizer como isso funcionará. Eu também acho que você poderá ver uma mudança de geração, já que as pessoas procuram novos rostos.

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