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Opinião

Educação precisa de professor

Propostas educacionais tendem a reduzir papel docente e desviar a atenção de problemas reais da docência: autonomia, formação e condições de trabalho

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Por Anna Helena Altenfelder, Silvia Carvalho e Tereza Perez

Nos últimos 20 anos, o Brasil avançou na garantia do direito de crianças, adolescentes e jovens a uma vaga na escola, mas ainda estamos longe de assegurar que todos permaneçam em sala de aula e aprendam como deveriam. É preciso não interromper essa trajetória para podermos colher os frutos no futuro. Em resposta à insatisfação com a demora nessa melhoria, governos e candidatos frequentemente têm apostado em soluções “milagrosas” ou para poucos. Isso quando não responsabilizam os profissionais da educação – em especial os professores – pelos resultados aquém dos desejados.

Nesta segunda-feira, em que é celebrado o Dia dos Professores no Brasil, mais do que manifestações vazias de apreço, gostaríamos de conclamar a sociedade como um todo e os candidatos aos governos federal e estaduais, em especial, a repensarem seus posicionamentos ao longo do ano e a debaterem como garantir autonomia, formação e condições de trabalho aos 2,2 milhões de professores do país que lecionam da creche ao ensino médio, passando pela Educação de Jovens e Adultos.

Afinal, é consenso que o professor tem um papel fundamental na aprendizagem de crianças, adolescente e jovens. Entra governo, sai governo, a responsabilidade de garantir o direito à educação na prática e no dia a dia continua sendo do professor. É ele quem decide sobre a condução do tempo em sala de aula, sobre as metodologias e didáticas mais adequadas e que toma decisões com impacto direto no aprendizado dos estudantes. Não há tentativa de aumento do controle capaz de mudar essa realidade, pois ela é da natureza do fazer educativo e parte constituinte de seu dever de ofício.

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Se quisermos cobrar do professor que se responsabilize pelas decisões pedagógicas que toma a cada minuto de seu fazer cotidiano, precisamos também garantir a ele a liberdade e as condições para exercer o seu papel. Afinal, é ele que lida também com as faltas de condições materiais de trabalho, com o desrespeito, a violência e a desvalorização dos seus saberes por aqueles que têm dado ênfase a falsos dilemas.

Não faltam exemplos de desvalorização do papel docente em todos os âmbitos. As ações de governos, empresas, universidades e organizações do terceiro setor visando melhorar indicadores de aprendizagem frequentemente têm resvalado na produção de materiais prontos, tecnologias importadas de contextos muito diferentes dos da educação, cursos com conteúdos generalistas e manuais de passo-a-passo, que colocam docentes no lugar de meros executores. É ruim, mas fica ainda pior: há inclusive quem busque impedi-los de exercer o seu papel, criando um rol de conhecimentos que não poderiam ser discutidos em sala de aula, sob pena de multa e até prisão.

Parece-nos contraditório que pretendamos formar alunos com autonomia, que valorizem o conhecimento e tenham habilidades crítico-analíticas, quando não garantimos isso sequer para os profissionais responsáveis por sua educação. Essa falta de valorização dos saberes docentes e de escuta, seja nos processos de formação, seja na definição e implementação de políticas públicas, termina por alijá-los de seu próprio fazer profissional e por afastá-los do diálogo com outros setores da sociedade.

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É preciso reverter essa lógica. Se quiserem avançar na qualidade da educação, os próximos governos precisam criar condições para que os profissionais da educação estabeleçam relações com o seu contexto de trabalho e participem da construção coletiva de conhecimentos e de respostas para sua comunidade escolar. Isso requer estabilidade nas equipes escolares, salários e planos de carreira adequados e o uso qualificado do tempo reservado ao trabalho colaborativo, com a garantia 1/3 da carga horária fora da sala de aula, como previsto na Lei do Piso Nacional do Magistério.

Sem fortalecer o papel docente, deixamos os alunos expostos a uma loteria: alguns encontrarão professores que, mesmo sem as condições adequadas, trabalharão além do que recebem para cumprir seu compromisso pessoal com seus alunos; outros terão um futuro incerto. Mas não podemos deixar ninguém para trás, nenhuma criança a menos na escola, nenhuma criança sem aprender. Para tanto, o professor é imprescindível e não podemos abandoná-lo à própria sorte.

Anna Helena Altenfelder, presidente do Conselho de Administração do CENPEC
Silvia Carvalho, coordenadora executiva do Instituto Avisa Lá
Tereza Perez, diretora-presidente da Comunidade Educativa CEDAC

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