Educação

Reitores eleitos e não empossados negociam mudança na lei sobre nomeação em universidades

Ideia é eliminar listas tríplices e garantir escolha do mais votado; líder da minoria na Câmara diz que conversará com Baleia Rossi

José Arnóbio, do IFRN (o segundo da direita para a esquerda), está à frente de articulação por mudança na lei. Em dezembro, juntou-se a outros seis reitores eleitos em mobilização em frente ao MEC. Foto: Reprodução/Maurício Gariba Jr.
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Reitores eleitos e não empossados conversam sobre uma articulação para mudar a lei que rege a nomeação dos dirigentes das universidades públicas. A ideia é pressionar os candidatos às presidências da Câmara dos Deputados e do Senado para que se comprometam com a autonomia dessas instituições, no momento em que o presidente Jair Bolsonaro é acusado de promover intervenções e desrespeitar votações internas em pelo menos 14 universidades públicas.

 

As intervenções nas universidades pautaram o Supremo Tribunal Federal em 2020, mas a votação ficou inconclusa. Ainda que se complete, o Judiciário dificilmente oferecerá a segurança de uma mudança feita pelo Legislativo. Isso porque a lei não obriga o presidente da República a nomear como reitor o candidato mais votado. Segundo o Decreto nº 1916/1996, que trata da escolha desses dirigentes, o reitor e o vice-reitor são nomeados pelo chefe do Palácio do Planalto, “escolhidos dentre os indicados em listas tríplices elaboradas pelo colegiado máximo da instituição”.

É com base na lei que Bolsonaro se justifica ao escolher, por exemplo, o segundo ou o terceiro colocado em uma votação, em vez do primeiro. É sabido que a conduta do presidente rompe com um acordo tácito mantido há anos, em que o Executivo respeitava a votação e nomeava o vencedor nas urnas. No entanto, na letra da legislação, o presidente é obrigado, somente, a escolher um dos três nomes da lista tríplice.

Os reitores propõem, portanto, eliminar a lista tríplice da lei, para garantir a nomeação do candidato mais votado. A ideia de negociar com o Legislativo sobre o assunto foi lançada – e teria sido bem recebida – em reunião de 12 de janeiro entre reitores eleitos e não empossados. A articulação viria em momento estratégico, já que deputados e senadores disputam as presidências do Congresso, e os principais competidores cumprem uma agenda de campanha para arrecadar votos de parlamentares. A eleição no Legislativo ocorre em 1º de fevereiro.

À frente dessa articulação está o professor José Arnóbio de Araújo Filho, que havia vencido as eleições para a reitoria do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) em 2019, mas ficou impedido de ocupar o cargo por decisão do então ministro da Educação, Abraham Weintraub. Ele conseguiu viabilizar sua posse somente em dezembro de 2020, por meio de decisão judicial. Segundo Arnóbio, já houve diálogos com a oposição no Congresso e com a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior. Ele avalia ainda a possibilidade de se encontrar com os candidatos a presidente da Câmara, Baleia Rossi (MDB-SP) e Arthur Lira (PP-AL).

Um dos projetos de lei com passos mais avançados sobre o tema no Congresso é o PL 4998/2019, do deputado José Guimarães (PT-CE), líder da minoria na Câmara. Segundo o petista, o tema pode ser tratado em uma reunião com Baleia Rossi, prevista para 27 de janeiro. Rossi é apoiado pelo PT na eleição da Câmara. A ideia é pedir a ele a aceleração da tramitação do texto, que já foi recebido pela Comissão de Educação da Casa em 2019 e tem assinaturas suficientes para um requerimento que pede regime de urgência.

“O candidato que eu apoio, o Baleia Rossi, tem vários compromissos, e o principal deles é fazer valer a Constituição. E a Constituição é a regra suprema que rege as relações políticas e de poder na sociedade brasileira. Portanto, a nossa expectativa é de que o Baleia incorpore essa demanda que envolve o conjunto das nossas universidades”, afirmou o deputado a CartaCapital.

O texto de Guimarães, que altera o Artigo 16 da Lei 5540/1968, torna obrigatória não somente a nomeação a partir de votação “uninominal”, mas também o peso de 70% para os professores em relação às demais categorias na contagem da eleição.

Já a deputada Maria do Rosário (PT-RS), autora de outro projeto de lei sobre o mesmo tema, o PL 255/2019, decidiu não inserir regulação sobre percentual em seu texto. Para a parlamentar, o ato feriria a soberania das instituições de ensino. Arnóbio diz já ter conversado com a petista sobre a necessidade de pressionar os candidatos à presidência da Câmara pela pauta.

“Se um projeto de lei da Câmara definisse os percentuais, nós estaríamos intervindo em instituições autônomas”, opinou. “Elas têm um órgão regulador que define o percentual de participação de cada segmento, que é o conselho de cada universidade. Então, o [meu] PL acaba com a lista tríplice, a decisão é uninominal, e os percentuais são definidos nos conselhos universitários”.

A articulação dessa negociação é um dos primeiros passos da mobilização dos reitores neste ano. Em 2020, docentes eleitos e não empossados fizeram protestos e encontros no Congresso, no STF e no Ministério da Educação, mas ainda não houve respostas desses órgãos sobre as demandas apresentadas. Em carta publicada em 4 de dezembro, eleitos em 14 universidades e três institutos federais disseram que o descumprimento da escolha da comunidade acadêmica representa afronta aos princípios democráticos.

“A intervenção nas instituições federais de ensino e a indicação de reitores biônicos remontam aos tempos da ditadura militar e não são aceitáveis no Estado Democrático de Direito”, escreveram.

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