Educação

O balanço dos ataques a escolas brasileiras nos últimos 21 anos, segundo estudos da Unicamp

18 casos aconteceram entre fevereiro de 2022 e maio deste ano. Pesquisadoras chamam a atenção para o impacto da liberação de armas e o poder de cooptação em fóruns extremistas

Policia militar atende a chamado em escola estadual em Cambé. Foto: Reprodução / redes sociais
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As escolas brasileiras foram alvo de 30 ataques cometidos por estudantes e ex-estudantes nos últimos 21 anos, segundo um levantamento realizado por grupos de estudos da Unicamp. Os dados não contabilizam o atentado a tiros ocorrido em uma escola estadual de Cambé, no Paraná, que matou dois adolescentes na última segunda-feira 19.

O monitoramento mostra que a ampla maioria dos casos ocorreu em escolas públicas: 13 estaduais, sendo uma militarizada; 12 municipais (uma militarizada); e seis unidades particulares. Os ataques levaram 36 pessoas à morte.

Dos 30 ataques, 18 aconteceram entre fevereiro de 2022 e maio de 2023. Em 14 casos, foram utilizadas armas de fogo, enquanto 13 registraram o uso de facas. O terceiro artefato na lista é o coquetel molotov, presente em nove episódios de violência.

No caso das armas de fogo, seis jovens tinham os equipamentos em casa, cinco compraram de terceiros e três são de origem desconhecida. Os ataques atingiram um total de 89 vítimas, incluindo 59 feridos.

O estudo faz uma correlação direta entre os casos, a letalidade e a maior disponibilidade de armas de fogo em circulação. Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública e do Instituto Sou da Paz mostram que o número de licenças para o uso de armas de fogo aumentou 473% nos últimos quatro anos.

Também são considerados como fatores de crescimento dos casos a cultura de violência, caso de discursos sociais que encorajam direta ou indiretamente atos agressivos e violentos.

Quem são os autores dos ataques?

As pesquisadoras Telma Vinha e Cleo Garcia, integrantes do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral, ligado a instituições como Unicamp e Unesp, avaliam não haver fatores que determinem o motivo de os ataques acontecerem em uma unidade escolar específica.

As autoras do estudo evidenciam, por exemplo, que as escolas alvo dos ataques não estão em regiões muito vulneráveis: 13 delas tinham perfil socioeconômico considerado alto, oito se encaixavam no critério médio-alto e seis apresentavam o perfil médio. Dois casos aconteceram em escolas de nível socioeconômico médio-baixo e dois em unidades de perfil baixo.

O estudo também traça um perfil predominante entre os autores dos ataques. A maioria é de jovens, do sexo masculino e brancos (com exceção do caso de Realengo). Entre os jovens, são comuns a busca por reconhecimento, a tendência ao ‘isolamento social’ e a concepção de valores opressores como misoginia, homofobia, racismo e ideias de supremacia branca.

Os casos também revelam que as escolas são vistas como lugares de sofrimento pelos autores dos ataques, tendo como possíveis gatilhos situações de bullying ou castigo nas unidades, como suspensão. As pesquisadoras também tratam do poder de cooptação desses jovens por jogos e chats online, que acabam servindo a eles como um espaço de escuta e acolhimento. Em 15 dos ataques às escolas, as pesquisadoras identificam indícios de radicalização online – o primeiro expoente é o ataque em uma escola de Realengo, em janeiro de 2011.

Propostas

No estudo, as pesquisadoras defendem maior controle das armas de fogo e das munições; a aprovação de projetos de lei que promovam maior regulação e responsabilização das plataformas por onde circula a incitação ao ódio; um monitoramento de redes e comunidades de interação; e a construção de protocolos de prevenção adequados aos diferentes tipos de cidades e escolas.

Também apresentam orientações para que o Brasil participe de fóruns globais contra o extremismo e o terrorismo online e endossam a formação de observatórios de convivência, violência e enfrentamento às desigualdades.

No âmbito escolar, a defesa é pela contratação de psicólogos, em consonância com a Lei Federal 13.935/2019, a dispor sobre a prestação de serviços de psicologia e de serviço social nas redes públicas de educação básica, e pelo fortalecimento de uma atuação conjunta entre educação e áreas como saúde, assistência social, direitos humanos e justiça.

Além disso, recomenda-se que as escolas atuem em prol da promoção do bem-estar e da convivência democrática, desenvolvendo projetos que pautem temáticas étnico-racias, gênero, convivência online, cooptação e funcionamento dos fóruns e comunidades extremistas, além de promover a cultura do diálogo, com ferramentas de participação e mediação de conflitos.

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