Jornadas perigosas rumo à Europa

Milhares de refugiados se arriscam no Mar Mediterrâneo e no Mar Egeu para buscar proteção na Europa

Mulher e criança na janela de um ônibus

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Apenas neste ano, quase 800 mil refugiados chegaram à Europa pelo mar (65% são homens, 20% crianças e 14% mulheres). A vasta maioria deles foge de guerras, perseguições e graves violações de direitos humanos em seus países origem nesta que é considerada a maior crise humanitária desde a Segunda Guerra Mundial.

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Embora o atual cenário tenha sido desencadeado pela guerra civil na Síria – que vitimou mais de 250 mil pessoas desde 2011 e forçou quase 4,2 milhões a deixarem o país -, ele é também impulsionado por instabilidades no Iraque (outro Estado afetado pelo EI) e no Afeganistão e uma ditadura brutal na Eritreia, além de diversos conflitos pelo mundo. Estes quatro países têm alimentado a maior parte do fluxo de refugiados que chegam à Europa.

A maioria parte dos refugiados que chegam ao continente rumam para os países ricos do norte, como Alemanha e Suécia, vistos como mais receptivos. As rotas utilizadas por eles variam, mas maior parte das entradas no continente neste ano ocorreram pela Grécia (quase 650 mil) por meio da fronteira com a Turquia.

Esta rota é dominada por nacionais da Síria, Iraque e Afeganistão, que, em geral, partem para a Turquia por terra. De lá, cruzam o Mar Egeu em botes frágeis até aportarem em pequenas ilhas gregas, como Lesbos e Kos. Segundo a Organização Internacional para Migração (IOM, na sigla em inglês) 527 pessoas morreram afogadas neste curto trajeto apenas em 2015.


A rota mais perigosa, no entanto, é a que parte do norte da África rumo à costa italiana, cruzando o Mar Mediterrâneo. Nesta rota, pessoas da Líbia, Eritreia e de outros países africanos são mais comuns. Em 2015, 2870 indivíduos morreram nesta jornada. Ao todo, 3447 morreram ou desapareceram ao tentar cruzar o Mediterrâneo ou o Mar Egeu neste ano, segundo a IOM.

Parte destas mortes poderia ser evitada, caso houvesse vontade política na UE. Os refugiados poderiam facilmente sair da Turquia e entrar por terra na Bulgária. De lá, seguiriam em segurança para a Sérvia, de onde rumariam para o norte do continente. Mas a Bulgaria optou por lidar com a crise da mesma forma que a Hungria: construiu um muro na fronteira com a Turquia para manter os refugiados do lado de fora.

Na rota atual, uma vez na Grécia, os refugiados devem ser registrados em Atenas, de onde seguem de ônibus para a Idomeni, na fronteira com a Macedônia. De lá, eles passam pela Sérvia, Croácia e Eslovênia, até chegarem nos destinos mais procurados: Áustria, Alemanha e Suécia.

Quanto tempo demora a jornada?

O tempo para chegar na Europa muda conforme a rota e a sorte. Em Idomeni, na Grécia, refugiados relatam terem demorado entre uma semana e um mês para chegar às ilhas gregas.

Esse trajeto é repleto de dificuldades, que variam da necessidade de caminhar por longas distâncias a se arriscar em botes lotados para chegar à Europa. Mas há outros problemas.

O ACNUR, agência da ONU para refugiados, informou ter registrado casos relevantes e “credíveis” de abuso e violência sexual contra mulheres e crianças na trajetória para a Europa. A agencia pediu mais proteção para estes refugiados, considerados particularmente mais vulneráveis.

Segundo a agência da ONU, há relatos de casos de crianças forçadas a terem relações sexuais com traficantes para continuar a sua jornada por não possuem mais dinheiro ou por terem sido roubadas.

Relatórios do Conselho Europeu para Refugiados e Exilados (ECRE, na sigla em inglês) apontam que na região de Presevo, na Sérvia, faltam mecanismos efetivos para identificar refugiados mais vulneráveis, como crianças desacompanhadas – que possuem risco elevado de serem vítimas de tráfico humano. Falta também capacidade para acomodação e registros de refugiados no país, o que já forçou dezenas de refugiados a passarem a noite ao relento.

Conforme o inverno se aproxima na Europa, o cenário pode se tornar crítico. Não há previsão de que o fluxo de refugiados rumando ao continente vá diminuir de forma relevante, logo serão necessárias medidas para prevenir mortes por hipotermia.

* Gabriel Bonis é mestre em Relações Internacionais pela Queen Mary, Universidade de Londres. Especialista em migração forçada, ele atualmente é pesquisador na Grécia, onde estuda a mobilização de moradores e ativistas de Salônica para ajudar refugiados em trânsito pelo país. Em Idomeni, na fronteira grega com a Macedônia, ele pesquisa eventuais violências e violações de direitos humanos enfrentadas por refugiados no trajeto até e pela Europa.

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