Educação
Brasil tem 630 mil crianças na fila de espera por creches, demanda que recairá sobre futuros prefeitos
Levantamento inédito revela gargalos na oferta da etapa, com quase 45% dos municípios brasileiros amargando filas de espera; pré-escola também enfrenta problemas


O Brasil possui um total de 632.763 mil crianças na fila de espera por uma vaga em creche, etapa da educação infantil destinada ao atendimento dos zero aos 3 anos de idade – ou que tenham 4 anos, se completados após 31 de março. O montante está distribuído em 2.445 municípios (44%), o que equivale a quase metade do País.
Os dados constam no levantamento Retrato da Educação Infantil no Brasil, divulgado na terça-feira 27, e produzido pelo Gabinete de Articulação para a Efetividade da Política da Educação no Brasil (Gaepe-Brasil), em parceria com o Ministério da Educação.
Dos municípios com fila de espera, 88% reconhecem a falta de vagas. Outros 24% sinalizam o desejo das famílias de transferir seus filhos para outra unidade, e 13% relatam que os responsáveis não realizaram a matrícula.
Ainda que a creche não seja considerada uma etapa obrigatória da educação básica, a Constituição Federal de 1988 e uma decisão do Supremo Tribunal Federal de 2022 garantem o direito das famílias à oferta de vagas, sendo esse um dever do Poder Público.
Beatriz Abuchaim, gerente de políticas públicas da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, uma das apoiadoras do estudo, ressaltou a importância dos dados e destacou que a maioria dos municípios ainda carece de um sistema organizado para medir a demanda por vagas, o que leva à subnotificação. Apenas 38% dos municípios utilizam listas impressas para monitorar a fila, e só 11% contam com sistemas unificados de controle.
Segundo ela, “a demanda real é provavelmente maior”. O Pnad Educação 2023, por exemplo, identificou 2,3 milhões de crianças por problemas de acesso às creches, entre eles a falta de vagas.
O desafio represado certamente recairá sobre os novos prefeitos, a serem escolhidos a partir de outubro, já que cabe às prefeituras garantir educação infantil, creches e pré-escola, bem como o ensino fundamental. O levantamento revela, contudo, que 1.972 municípios, ou 35%, não possuem planos de expansão de vagas.
Abuchaim também destaca que o problema é mais grave para as crianças em situação de vulnerabilidade social, que são as que menos acessam essas vagas.
Para resolver essa questão, não basta construir novas creches, observa a especialista. É preciso também considerar a reforma de prédios existentes e a abertura de turmas em escolas de ensino fundamental. Ela enfatiza a necessidade de orçamento adequado e de critérios de priorização, como atender famílias em vulnerabilidade, inscritas em programas de transferência de renda, com crianças com deficiência ou mães vítimas de violência doméstica.
Uma lei sancionada em maio de 2024 pelo presidente Lula (Lei nº 14.851/2024) exige que os entes federados criem mecanismos para identificar, divulgar e atender a demanda por vagas em creches. A legislação também estipula que os estados e municípios devem executar uma busca ativa das crianças fora da escola e planejar a expansão de vagas com apoio de recursos federais.
Abuchaim defende que garantir o acesso à creche não só ajuda as famílias, liberando os pais para o trabalho e quebrando ciclos de pobreza, como também promove o desenvolvimento integral das crianças, que recebem alimentação, cuidados e estímulos pedagógicos adequados.
Além disso, ela argumenta que a educação de qualidade desde a primeira infância ajuda o Brasil a alcançar suas metas educacionais, como a alfabetização na idade certa. “Crianças devidamente estimuladas desde pequenas desenvolvem habilidades muito mais sólidas para o mundo oralizado e letrado”, afirma.
País também não universalizou a pré-escola
O levantamento também revela problemas com a pré-escola, etapa obrigatória para crianças de 4 a 5 anos. Mais de 78 mil crianças não frequentam a etapa escolar no País, sendo mais de 39 mil por falta de vagas. Novamente, o cenário é de subnotificação, com o Pnad apontando cerca de 441 mil crianças fora da escola, o que representa 7% da população nessa faixa etária.
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