Educação

Alerta vermelho: calor revela dramas de infraestrutura e perturba o dia a dia nas escolas

Em meio a uma alta generalizada nas temperaturas, estudantes e professores enfrentam dias desgastantes e desconforto nas escolas, a grande maioria desprovida de climatização

Créditos: Reprodução Redes Sociais
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Pelo menos 16 unidades da Federação estão sob o alerta vermelho de “grande perigo” para altas temperaturas até esta sexta-feira 17, conforme indicação do Instituto Nacional de Meteorologia.

Estão na lista: Amazonas, Bahia, Espírito Santo, Goiânia, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraná, Piauí, Rio de Janeiro, Rondônia, São Paulo, Tocantins e o Distrito Federal.

O alerta vermelho indica um fenômeno meteorológico muito intenso, com alta chance de causar sérios danos e acidentes, ameaçando a segurança das pessoas.

Esse problema é vivido na pele por muitos professores, educadores e estudantes em escolas sem climatização e com má ventilação, o que prejudica a aprendizagem e a convivência em sala de aula – especialmente na rede pública de ensino.

Na escola Professor Antônio Viana de Souza em Guarulhos, alunos e professores frequentemente passam mal devido às altas temperaturas. As salas, apinhadas por 35 ou 40 alunos, contam apenas com dois ventiladores. Não raro, os equipamentos deixam funcionar devido ao uso intenso.

Restam medidas paliativas, como levar os alunos mais vezes para tomar água. “A gente se sente apagando incêndio”, diz a diretora Ozani Martiniano de Souza. “O razoável seria contarmos com escolas climatizadas.”

Um levantamento oficial do governo de São Paulo, obtido pelo UOL, mostra que apenas 210 das 5,6 mil escolas da rede estadual de São Paulo (ou seja, 3,7%) têm sistema de refrigeração.

O problema é também nacional. Segundo o Censo Escolar de 2022, realizado pelo Inep, cerca de 70% das escolas públicas em todo o Brasil também não são climatizadas.

As maiores redes de ensino, a propósito, são as menos climatizadas, caso de São Paulo, com apenas 10% das salas a contar com essa tecnologia. Em Minas Gerais, o índice cai para 8%. As maiores taxas aparecem em Rondônia, com 85%, e Rio de Janeiro, com 43%.

Ainda assim, as altas temperaturas têm apresentado grandes desafios aos estudantes fluminenses. Na segunda-feira 13, alunos de um colégio municipal na Penha, zona norte da capital, chegaram a abandonar a sala, diante de um calor insuportável.

Alunos saíram da sala de aula por causa do calor. — Foto: TV Globo/Reprodução

A reportagem também identificou nas redes sociais a manifestação de estudantes do Ginásio Experimental Tecnológico de Brás de Pina, na zona norte de São Paulo, ante a falta de condições para frequentarem as aulas. Os alunos pedem por ar-condicionado e água gelada.

Em Porto Murtinho, em Mato Grosso do Sul, a gestão municipal optou por praticar um horário intermediário nas escolas, das 15h às 17h30, para evitar o pico do sol, das 11h às 14h. Na segunda-feira 13, o município teve temperatura máxima de 42,2 graus. A reportagem de CartaCapital perguntou à prefeitura se as escolas contam com alguma estrutura de climatização, mas não obteve resposta.

Parlamentares cobram soluções

Em São Paulo, parlamentares do PSOL exigem há meses respostas do poder público. Em setembro, a deputada federal Luciene Cavalcante (PSOL-SP) encaminhou um requerimento à Comissão de Educação da Câmara sugerindo que o Ministério da Educação elaborasse um plano emergencial.

Na peça, a parlamentar citou dados do projeto Sede de Aprender, desenvolvido pelo Ministério Público de Alagoas, que constatou que 6.881 escolas do País não têm acesso a esgotamento sanitário, 3.211 não contam com abastecimento de água e 7.149 continuam sem água potável.

“As 7.149 unidades escolares do País que não oferecem água potável correspondem a 931.616 alunos privados da necessidade básica de acesso à água própria para o consumo humano”, destacou a deputada.

Ela também oficiou, em parceria com o deputado estadual Carlos Gianazzi (PSOL-SP) e com o vereador Celso Gianazzi (PSOL-SP), órgãos como o Ministério Público, o Tribunal de Contas do Estado e o do município, e a prefeitura de São Paulo, solicitando uma análise sobre a estrutura das escolas diante das altas temperaturas.

No Rio, a Comissão de Saúde da Câmara de Vereadores tem analisado a situação das escolas municipais. A rede conta com 1.550 unidades. O presidente da comissão, Paulo Pinheiro (PSOL), informou em conversa com a reportagem que, nas últimas duas semanas, 20 escolas da zona sul da cidade foram fiscalizadas in loco e todas apresentavam problemas de climatização.

“Ou a sala de aula não tinha aparelho de ar-condicionado, ou tinha e não funcionava, ou não tinha ventiladores”, relatou. O vereador disse ainda que uma situação verificada na Escola Municipal José de Alencar, em Laranjeiras, chamou a sua atenção. A unidade possui 14 salas com aparelhos de ar-condicionado do tipo split sem funcionar. Outras oito salas não contam com os aparelhos, apenas com ventiladores.

“Os aparelhos estão instalados lá há dez anos, mas nunca funcionaram, porque o sistema elétrico de sustentação não dá conta. Ou seja, coloca-se o aparelho, mas a gestão municipal não é capaz de fazer seu trabalho de colocar uma infraestrutura, a fiação necessária. Nessas salas, as crianças ficam desesperadas.”

O vereador afirmou ter encaminhado à Secretaria de Educação do município um requerimento para cobrar respostas sobre o caso da escola, além de detalhes sobre quantas unidades da rede possuem climatização.

O que dizem os citados

A Secretaria de Estado de Educação do Rio informou, em nota, que realizou a climatização de 983 unidades escolares em 2022, adquirindo 24 mil aparelhos de ar-condicionado. Destas, 81 unidades não realizaram a instalação em função de adequação de carga elétrica junto às concessionárias. Ainda de acordo com a pasta, há ‘casos isolados’ devido a questões elétricas, mas a secretaria disse estar em contato com a Empresa de Obras Públicas e a Enel para solucionar o problema. A secretaria não informou um prazo para a adequação.

Acrescentou ainda que, atualmente, há um estudo de viabilidade técnica para a aquisição e instalação em mais 250 unidades, totalizando toda a rede de ensino.

Já a Secretaria Municipal de Educação do Rio informou que tem priorizado a ampliação da climatização e que, das 1550 unidades da rede, 90% contam com aparelhos de ar-condicionado. A pasta ainda assumiu que algumas escolas precisam de obras de grande porte para reestruturação completa da rede elétrica para suportar a instalação dos novos aparelhos, mas não detalhou quantas. A Secretaria disse que tem solicitado à Light o aumento de carga para as escolas que precisam deste serviço.

Sobre a EM José de Alencar, a secretaria disse que o trabalho de manutenção da rede elétrica está em andamento, para que então os aparelhos funcionem. Quanto ao Ginásio Experimental Tecnológico de Brás de Pina, a SME informa que todos os bebedouros estão funcionando perfeitamente, com água gelada. No que se refere aos aparelhos de ar condicionado, alguns necessitam de manutenção ou substituição e a unidade escolar já está relacionada para o recebimento de novos aparelhos e também a manutenção da rede elétrica.

A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo informou, em nota, ter viabilizado este ano R$ 70 milhões para a compra de equipamentos de ar-condicionado para as escolas da rede, e empenhado outros R$ 18 milhões para a aquisição de ventiladores. Ressaltou que a instalação dod aparelhos de ar-condicionado se faz a partir da readequação nas redes elétricas das escolas, cujo trabalho vem sendo realizado pela atual gestão da Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE). Segundo a pasta, 400 escolas já foram contempladas com o serviço e outras 80 estão com obras em andamento.

A Secretaria municipal de Educação de São Paulo informou que as unidades escolares da rede possuem autonomia para aquisição de equipamentos para refrigeração de ambiente através da verba do (PTRF) Programa de Transferência de Recursos Financeiros. Apontou ainda que, desde 2020, foram investidos mais de R$1,9 bilhão de PTRF nas unidades educacionais.

Também em manifestação à reportagem, o MEC informou que disponibiliza assistência técnica e financeira aos entes federados por meio do Plano de Ações Articuladas (PAR) para ações de climatização das salas de aula das escolas das redes públicas de ensino, com apoio para a aquisição de ventiladores escolares e aparelhos de ar-condicionado. Acrescentou ainda que os entes federados interessados devem cadastrar sua demanda no PAR e a assistência financeira se dá por meio de recursos do orçamento do MEC/FNDE ou de emendas parlamentares.

Ainda de acordo com o ministério, encontra-se em curso o processo de registro de preços de ventiladores escolares e estão previstas atas para aparelhos de ar-condicionado. Quanto a planos de contingência para período de extremo calor, incluindo a suspensão de aula, o MEC afirmou que tais decisões devem ser desenvolvidos por cada rede de ensino, considerando o princípio constitucional da autonomia federativa e as realidades locais.

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