Disciplinas

Itamaraty, a casa da arte de negociar

Centenário, o Itamaraty tem a missão de proteger os interesses do País no mundo

Palácio do Itamaraty|
O Palácio do Itamaraty
Apoie Siga-nos no

Em tempos recentes, questões como a espionagem dos Estados Unidos sobre a Presidência brasileira e o asilo diplomático dado ao senador boliviano Roger Pinto Molina na embaixada do País em La Paz, além de sua fuga e da demissão do ministro Antonio Patriota, puseram em foco uma instituição para lá de centenária: o Ministério das Relações Exteriores ou Itamaraty.

Enquanto temas de política exterior são muito populares nos EUA, Europa e Japão, contribuindo para eleger ou ­derrubar chefes de Estado e de governo, no Brasil a questão ainda demanda ­explicações técnicas e limita-se a iniciados e a círculos decisórios palacianos, deixando de explorar espaços relevantes da discussão cotidiana.

[bs_row class=”row”][bs_col class=”col-xs-2″][/bs_col][bs_col class=”col-xs-10 amarelo”]

Leia atividade didática para o Ensino Médio sobre diplomacia

Competências: compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais

Habilidades: analisar o papel da diplomacia como instituição na organização das sociedades

[bs_citem title=”” id=”citem_5422-8f97″ parent=”collapse_e98f-4f2c”]

Por que o país precisa de relações internacionais?

1. Explore a diplomacia em organizações internacionais, como a ONU. Explique que negociar pode ser aprendido e que é uma profissão que depende disso. Pode-se dizer que fulano é mais diplomático que sicrano?

2) Em outros países, como eua e frança, os diplomatas também vêm de uma escola de formação, como no Itamaraty?

3) Cheque semelhanças e diferenças entre negociação, política, burocracia, asilo, refúgio, fronteiras e comércio internacional.

[/bs_citem][bs_button size=”md” type=”info” value=”Leia Mais” href=”#citem_5422-8f97″ parent=”collapse_e98f-4f2c” cor=”amarelo”][/bs_col][/bs_row]

Para entender o Itamaraty é preciso lembrar um personagem de extrema relevância: o “velho” Barão do Rio Branco. José Maria da Silva Paranhos Júnior nasceu em 1845, no Rio de Janeiro, filho de um servidor do Império, o Visconde do Rio Branco. Pequeno, acompanhava o pai em viagens que resolveram questões do Império – a mais relevante foi a negociação final da Guerra do Paraguai.

Leia Mais | Sugestões de Temas de Aula para o Ensino Médio

Estudante do tradicional Colégio Pedro II, Paranhos escrevia em periódicos da época sobre relações exteriores. Uma vez na Faculdade de Direito, em São Paulo, embora tenha sido um aluno mediano e um pouco fora dos padrões comportamentais, estudava mapas, geografia, povos da região e idiomas com precisão matemática e entusiasmo incomum para entender a relação do Brasil com outros países.

Seu mandato como deputado pela longínqua província de Mato Grosso não logrou grande êxito e foi compensado pelo cargo de auxiliar de comércio no escritório brasileiro em Liverpool.

Revezava-se entre Inglaterra e França, na era vitoriana e na belle époque. Sua fluência em línguas, seu trato elegante e sua incrível capacidade de exaurir temas complexos lhe proporcionavam livre trânsito entre os pares.

Daí para resolver duas questões fronteiriças fundamentais para o Brasil, na década final do século XIX, foi um salto. A região de Palmas – ou Missiones – com a Argentina e a do Amapá, com a França, foram dois problemas levados à arbitragem internacional e nos quais o Barão demonstrou todo seu talento diplomático.

Por isso, a jovem república brasileira chamou o “velho” monarquista e abolicionista para servir-lhe. E foi resolvendo a delicadíssima questão do Acre (1902) e outras tantas com países vizinhos que Rio Branco organizou uma das burocracias mais bem estruturadas do País.

No começo, trouxe eminências como Oswaldo Cruz, Clóvis Beviláqua, Santos-Dumont e Euclides da Cunha para formar o centro pensante das relações exteriores.

Destacava-se também ao entrevistar candidatos a diplomatas, que tinham de conhecer português e idiomas estrangeiros, literatura, geografia, história, direito, política e economia, além de se mostrarem versados sobre o mundo contemporâneo.

A essência da seleção segue igual desde a criação do Instituto Rio Branco, em 1946. O candidato a diplomata enfrenta um dos concursos públicos mais difíceis do País.

Aprovado, começa como terceiro secretário e percorre longo caminho em organizações internacionais até galgar o posto máximo de Ministro de Primeira Classe, que possibilita virar embaixador – o que depende de aceite do Congresso Nacional e do país hospedeiro. A partir daí, representa o Brasil no exterior.

Embora muitos imaginem uma profissão cheia de glamour, a realidade é bem mais dura. Veja como é a vida dos nossos recentes representantes no espaço virtual Jovens Diplomatas ou leia o livro Diplomacia Suja, do ex-diplomata britânico Craig Murray, sobre as agruras do cargo em um país como o Uzbequistão.

Aliás, de onde vem a palavra diplomacia?

Conta-se que de “diploma”, espécie de salvo-conduto utilizado, no passado, por pessoas que tinham permissão de passagem em situações de guerra. Por isso a diplomacia é a arte da negociação em tempos difíceis.

Certo britânico, inquirido sobre qual seria o papel do diplomata, sacramentou: “Mentir bem sobre o seu país”. Ele foi demitido, mas talvez tenha sintetizado o papel de uma instituição como o Itamaraty: valorizar o que é bom e deixar de lado o que pode não ser tão bom.

A diplomacia são as estratégias que um país utiliza para fazer os outros renderem-se às suas vontades. No Brasil, seus quadros respeitam hierarquia preconcebida e, por isso, dão conta das diretrizes de política externa, seja qual for o governo.

No caso brasileiro, há de se atentar para o papel do presidente da República: segundo a Constituição, só ele pode formular e executar a política externa.

Nos governos recentes, parte da imprensa indignou-se com viagens presidenciais, desconhecendo o lado legal da questão. Além disso, a diplomacia demanda entendimento entre presidente, ministro das Relações Exteriores e corpo diplomático. Episódios como a fuga do senador boliviano sugerem descompassos nessas relações.

A própria Constituição, em seu artigo 4º, também fixa princípios de relações internacionais, como concessão de asilo político. Com suas liturgias e seus meandros, a diplomacia não pode ficar distante da população.

Livros:
Bath, Sergio. O Que É Diplomacia. Coleção Primeiros Passos. São Paulo: Brasiliense, 1989.
Rodrigues, Gilberto M. A. O Que Wão Relações Internacionais. Coleção Primeiros Passos. São Paulo: Brasiliense, 1995.
Ricupero, Rubens. Rio Branco – O Brasil no mundo. São Paulo: Contraponto, 2012.
Murray, Craig. Diplomacia Suja. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

Filme
Ortiz, Caito e Dornellas, João. O Dia em Que o Brasil Esteve aqui. Documentário, 2005.

Site
Ministério das Relações Exteriores

* Moisés da Silva Marques é Professor de Relações Internacionais da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo

** Publicado originalmente em Carta na Escola 80 

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo