A Semana (23 a 29 de janeiro)

Obituário/A morte do Arcano O astrólogo Olavo de Carvalho era a alegoria de uma época Dos tempos bicudos de astrólogo de jornais à glória de ser reconhecido como guru do bolsonarismo, Olavo de Carvalho escolheu a mistificação e o embuste como modos de sobrevivência. Foi um longo

Do início ao fim, guru de uma seita de fanáticos - Imagem: Vivi Zanatta/Folhapress

Apoie Siga-nos no

Obituário/A morte do Arcano

O astrólogo Olavo de Carvalho era a alegoria de uma época

Dos tempos bicudos de astrólogo de jornais à glória de ser reconhecido como guru do bolsonarismo, Olavo de Carvalho escolheu a mistificação e o embuste como modos de sobrevivência. Foi um longo caminho de aprendizagem. Nos anos 1980, Olavo testou o atalho da religião. Liderou no Brasil a seita Tradição, fundada no Reino Unido e alvo de investigação da Polícia Federal por extorsão e contrabando, entre outros crimes. Em seguida, formou a sua própria congregação, inspirada no esoterismo islâmico. A experiência durou pouco. Infelizmente para o nosso personagem errante, fundar igrejas ainda não havia se tornado um negócio lucrativo. Na década seguinte, Olavo decidiu pregar em outras paragens. Em 1996, seu livro O Imbecil Coletivo, crítica rasa e desconexa da cultura brasileira, recebeu elogios de Paulo Francis e levou o economista Roberto Campos a definir o autor como “filósofo de grande erudição”. A coluna na extinta revista Época, então dirigida pelo jornalista Augusto Nunes, deu-lhe alguma projeção e virou a semente de uma praga que se alastraria pela mídia: bárbaros, em geral incultos e medíocres, contratados para investir contra os marcos civilizatórios sob o manto do combate ao “politicamente correto”. O “original” Olavo, cercado por imitadores baratos, surfou a onda. Vieram novos livros, o canal no YouTube, os cursos online, a fama de pensador e a aproximação com o clã Bolsonaro. O “filósofo” inspirou a guerra cultural levada a cabo aos trancos e barrancos pela tropa bolsonarista instalada em Brasília. Sua influência no governo diminuiu, no entanto, ao longo do mandato. Nos últimos tempos, andava ressentido e mandava recados da cabana em Richmond, no estado americano da Virgínia. Viveu até o fim tomado por um delírio de grandeza, mas não teve tempo de aprimorar o olavismo, arcabouço teórico com o qual pretendia superar os gregos e os modernos e iluminar o mundo, alicerçado em insultos, palavrões e obsessão fálica (traço em comum com o ex-capitão). Na melhor das hipóteses, passará à história como uma nota de rodapé, alegoria de um período tão tenebroso quanto folclórico. Aos 74 anos, deixa mulher, oito filhos, 18 netos, algumas armas, dívidas e um rebanho desamparado.

O último a sair apague a luz

Para proteger e incentivar discussões produtivas, os comentários são exclusivos para assinantes de CartaCapital.

Já é assinante? Faça login
ASSINE CARTACAPITAL Seja assinante! Aproveite conteúdos exclusivos e tenha acesso total ao site.
Os comentários não representam a opinião da revista. A responsabilidade é do autor da mensagem.

1 comentário

PAULO SERGIO CORDEIRO SANTOS 31 de janeiro de 2022 01h03
Faleceu o guru de Bolsonaro e todo o seu clã, além dos beócios do momento, onde foi decretado luto oficial de um dia, mas a mãe do presidente também falecida não teve o mesmo luto, logo em seguida o ex capitão pôs-se a jogar em uma lotérica. Com o seu falecimento alguns até comemoraram a sua partida. Por mais que um ser seja abjeto e odioso, não costumo comemorar a morte de ninguém, não quero me igualar aos canalhas que soltam fogos quando falece alguém da esquerda. Prefiro a indiferença. Senti muito a recente partida da grande Elza Soares, essa nos cativou com sua biografia e exemplo.

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.