Economia

Tributo unificado, assunto que une presidenciáveis

Imposto sobre Valor Agregado (IVA) unifica diversos tributos e favorece tanto produtores como consumidores. Mas há resistência de estados e municípios

Tributos são cobrados em cada etapa produtiva e na venda, encarecendo o valor final
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Pelo menos sete candidatos à presidência – Álvaro Dias, Ciro Gomes, Geraldo Alckmin, Henrique Meirelles, João Amoêdo, Luiz Inácio Lula da Silva e Marina Silva – defendem a implementação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) ou de similar, unificando diversos tributos federais, estaduais e municipais para evitar a tributação em cascata. O IVA já é adotado em vários países do mundo, como os da União Europeia e parceiros do Brasil no Mercosul.

As propostas dos presidenciáveis vêm ao encontro das reclamações constantes de trabalhadores, empresas e investidores de que a regulação tributária no Brasil é complexa e muito burocrática. Segundo especialistas, o IVA poderia servir como solução para parte dos problemas do sistema tributário do país.

“Tributar bens e serviços sobre valor adicionado já é uma tendência mundial. Infelizmente, o Brasil está muito atrasado em termos de tributação”, diz a economista Vilma Pinto, da FGV/IBRE. “A criação de um IVA pode resolver problemas da nossa atual estrutura tributária e, se bem desenhada, tem como características a simplicidade, transparência, equidade e neutralidade.”

Para o tributarista Rodrigo Brunelli, do escritório Ulhôa Canto Advogados, com a unificação de tributos, os contribuintes teriam apenas uma legislação federal para cumprir, e não um emaranhado de normas federais, estaduais e municipais. “Hoje está claro que a complexidade tributária é um dos empecilhos ao desenvolvimento do país.”

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Atualmente, impostos sobre a produção e comercialização têm um efeito cascata: tributos como o PIS/Cofins são cumulativos e cobrados em cada etapa produtiva e na venda ao consumidor, encarecendo o valor final da mercadoria. Por exemplo: uma fábrica vende um produto para um varejista por 100 reais e, este, para o consumidor final por 200 reais.

Se a alíquota conjunta do PIS/Cofins for 3,65%, a fábrica paga R$ 3,65 e, o varejista, 7,30 reais de imposto, perfazendo o total de 10,95 reais. Diz-se que a incidência do tributo sobre a segunda operação é “em cascata” por o produto já ter sido previamente tributado. Dependendo da quantidade de etapas de produção, a mercadoria será taxada várias vezes, até chegar ao consumidor final.

Na proposta de reforma tributária que começou a tramitar no Congresso há 14 anos, os impostos ISS, ICMS, IPI, PIS, Cofins, Cide, salário-educação, IOF e Pasep seriam extintos e substituídos pelo IVA, que seria o único tributo sobre produtos que vão tendo valor adicionado ao longo da cadeia de produção, evitando, assim, a tributação em cascata.

Entre as possíveis formas de cobrança do IVA estão a tributação sobre a produção ou sobre a venda para o consumidor final: no primeiro caso, o produtor recolhe todo o imposto sobre o preço presumido de venda (200 reais) e não há mais recolhimento de impostos ao longo da cadeia de produção; ou não há nenhum recolhimento ao longo da cadeia e apenas o varejista recolhe o imposto sobre 200 reais ao vender o produto. Assim, neste exemplo, o imposto pago seria de 7,30 reais em vez dos 10,95 reais.

Países da Europa e Argentina já têm o IVA

Embora o IVA seja cobrado em toda a União Europeia, cada país fixa as suas próprias taxas, que geralmente não podem ser inferiores a 15%. Existem também algumas taxas especiais, como a reduzida (não pode ser inferior a 5%), a super-reduzida (inferior a 5%) e a zero, que podem ser aplicadas na venda de determinados bens e serviços.

Na Espanha, por exemplo, serviços como manutenção e adaptação de veículos para pessoas com deficiência estão sujeitos à taxa super-reduzida de 4%. Já as exportações europeias para países que não pertencem à UE não estão sujeitas ao IVA. Neste caso, o imposto é pago no país em que o produto é vendido.

“As vantagens do IVA são a facilidade de aplicação do tributo quando há uma infraestrutura apropriada, como sistemas eletrônicos de caixas; e de direcionar encargos sobre produtos básicos e mercadorias de luxo para aliviar as famílias mais pobres”, argumenta o economista Timm Boenke, da Universidade Livre de Berlim. “E, ainda, o controle do consumo, com maiores taxas sobre produtos como cigarros e álcool.”

Os países do Mercosul (Argentina, Uruguai e Paraguai) já usam o IVA. Na Argentina, por exemplo, o tributo foi instituído em 1973 e também não tem caráter cumulativo. A alíquota geral é de 21%. A máxima, de 27%, tributa, por exemplo, a eletricidade, telefonia e água encanada. A alíquota reduzida de 10,5% incide, por exemplo, sobre frutas, verduras e carne.

Obstáculos para aprovação no Brasil

O relator da reforma tributária, o deputado federal paranaense Luiz Carlos Hauly, disse recentemente para a Agência Câmara que articula para que a proposta seja votada este ano, após a eleição. Porém, para ela ir a plenário, é necessário parar a intervenção no Rio de Janeiro, já que a Constituição não pode ser modificada enquanto ela ocorrer.

Outro obstáculo é o receio de estados, do Distrito Federal e de municípios de perderem arrecadação com a instituição de um IVA nacional. Com a mudança, eles perderiam poder político, já que, com uma arrecadação centralizada pela União, o poder das demais partes de utilizar os tributos de suas respectivas competências como instrumentos de atração de investimentos ficaria muito mais limitado.

“Há o risco de a União, por qualquer motivo, demorar para repassar os valores cabíveis aos estados, Distrito Federal e municípios”, diz Brunelli. “Além disso, uma das premissas da reforma é que ela não pode implicar perda de arrecadação, o que é uma das grandes preocupações dos estados e municípios. A ideia é simplificar os tributos e diminuir as desigualdades com as desonerações e diferenças de alíquota, mas não reduzir a carga tributária.”

A implementação de um imposto único acabaria com as diferenças das alíquotas de ICMS e, assim, com a guerra fiscal entre os estados para atrair investimentos de grandes empresas. Diversas multinacionais já se aproveitaram dessa guerra fiscal e se instalaram em estados onde receberam os melhores benefícios e as menores alíquotas de impostos.

“Com alíquota padronizada e um tributo unificado, será necessário estudar formas de incentivo econômico, uma vez que o incentivo fiscal, importante instrumento de atração de investimento de estados e municípios, ficará muito limitado”, diz Brunelli.

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