Economia

Reforma agrária é “uma dívida” que o Brasil tem com os camponeses, diz economista

O economista Sergio Pereira Leite, apresentou em Paris os resultados de sua pesquisa sobre a questão agrária no Brasil

Foto: Repórter Brasil
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O financiamento da agricultura e o impacto de investimentos estrangeiros no setor agrário brasileiro foi tema de uma conferência no Instituto de Ciências Políticas de Paris (Sciences-Po). O economista e professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Sérgio Pereira Leite, apresentou resultados de uma pesquisa que chama a atenção para as consequências das novas técnicas de apropriação da terra, que reforçam as desigualdades presentes desde a ditadura militar.

A questão agrária é um tema que há décadas divide no Brasil. De um lado estão aqueles que afirmam que as dinâmicas de concentração de terras em vigor contribuem para o progresso do país e, do outro, estão os que defendem que os latifúndios apenas reforçaram a desigualdade e a pobreza dos que trabalham na terra.

Sérgio Pereira Leite, que estuda o tema há anos e está em Paris como pesquisador convidado da Universidade Sorbonne Nouvelle, apresentou alguns resultados de suas pesquisas recentes sobre o assunto. Ele lembra que a questão não é recente, pois é fruto de um processo de modernização implementado nas décadas de 1960 e 70, durante o regime militar, quando se apostava no crescimento da produtividade sem haver uma reflexão em termos de democratização da terra.

E, apesar de alguns avanços, como o estabelecimento do direito à União de desapropriar terrar particulares para fins de reforma agrária, inscrito na Constituição de 1988, os últimos anos foram marcados por um retrocesso.

“Houve iniciativas muito importantes, como a criação de assentamentos rurais nos programas de reforma agrária de algum tempo atrás. Mas no período recente essas iniciativas diminuíram tremendamente”, aponta o economista. “Eu acho que essa é uma dívida importante que o Brasil tem com esses cidadãos camponeses, especialmente sem terra” lança o pesquisador.

“Há um nível de desigualdade que não toca apenas no problema da estrutura fundiárias, mas também numa questão de raça e gênero”, explica. Baseado em dados coletados nos últimos anos, Pereira Leite ressalta que atualmente no Brasil há uma concentração de homens brancos à frente dos latifúndios, enquanto negros, pardos, e poucas mulheres estão principalmente nas pequenas propriedades. “Este modelo extremamente concentrado não favorece um desenvolvimento mais democrático, nem mesmo sustentável”.

Investimentos internacionais 

“O Brasil, historicamente, é um país com uma das maiores concentrações de terra no globo”, detalha o economista. E é também “o 5° país com maior procura por terras ao redor do planeta”, frisa o pesquisador, lembrando que essas áreas são buscadas principalmente para a produção de commodities.

Porém, se antes apenas os grandes players internacionais da alimentação atuavam no setor agrário, agora investidores vindos de todos os horizontes se interessam pelas terras brasileiras. Uma das pesquisas atuais de Pereira Leite aponta a presença de fundos de pensão norte-americanos entre os investidores na agricultura brasileira. “O interessante dessa nova ‘corrida por terras’ é que ela mobilizou atores, como George Soros, por exemplo, que não é um especialista na questão agrícola, ou ainda fundos, como o Google, que buscam na terra um ativo de valorização financeira”, resume o economista.

“Os dados oficiais no Brasil indicam algo ao redor de 3 milhões de hectares de terra estão sob o controle de estrangeiros. Eu acho esse dado subdimensionado. A minha estimativa, com base em pesquisas que estamos realizando, é que essa cifra é três vezes maior, ou mais. Pois em vários casos a propriedade dessas áreas não está no nome da holding financeira internacional, mas sim de uma empresa ‘nacional’, criada com essa finalidade de adquirir aquele imóvel rural”, avalia.

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