Economia
O que fazer com os transgênicos?
É preciso analisar o tema de forma serena


Tudo ou nada. Oito ou oitenta. O céu e o inferno. Tom Jobim ou Bonde do Tigrão.
A geleia geral morena e sestrosa costuma reservar pequeno espaço para meios-termos. No Fla-Flu tupiniquim ninguém lembra o simpático Olaria da Rua Bariri, no Rio de Janeiro; o destemido Juventus da Rua Javari, na Mooca paulistana; ou saindo do não mais badalado circuito Elizabeth Arden, um glorioso Nacional de Patos, da Paraíba.
Mesmo sem termos lido Era dos Extremos (Eric Hobsbawn – 1917/2012) ou nela progredido o que devíamos e podíamos, praticamos aqui pensamentos extremados.
O fato se confirma nas ainda poucas colunas aqui deixadas.
Se você escreve que em pouco mais de 30 anos construiu-se no Brasil um cabedal agropecuário importante, infere-se um ruralista nos moldes do deputado federal Ronaldo Caiado (DEM-GO).
Se você alerta para a pouca repercussão de assassinatos em conflitos rurais, é taxado de retrógrado querendo promover a refundação das Ligas Camponesas, da década de 1950.
É provável que esse seja o comportamento sobre o tema de hoje: sementes transgênicas, fertilizantes químicos e agrotóxicos, na obtenção de produtividade agrícola.
Tá vendo? A ambientalista aí na plateia já se abespinhou. O produtor de mel orgânico também. De seu escritório, o representante da eufemisticamente autointitulada indústria de defesa vegetal correu ao teclado para tacar impropérios no colunista.
Calma. Não façamos desse território uma Faixa de Gaza.
Não há dúvidas de que os perrengues ambientais e sanitários trazidos ao planeta por tecnologias desenvolvidas para aumentar a produção agrícola extrapolaram os limites.
Embora pesquisa, indústria e agricultores defendam esses processos, e os julguem necessários para gerar alimentos suficientes para atender à demanda mundial, descontrolados, eles deixaram prejuízos enormes à preservação da vida.
Nem mesmo os excedentes de produção serviram para minorar a fome em várias regiões pobres, pois têm sido perdidos e mal distribuídos nas etapas produtivas e distributivas.
Ao longo do tempo, tais constatações serviram para estimular, a partir da década de 1980, uma reação contrária, liderada pelos movimentos ambientalistas, que foram se fortalecendo e trazendo entre seus propósitos a purificação orgânica dos manejos e insumos agrícolas.
A agricultura orgânica, enfim. Juntos vieram os extremos.
Apesar de assim serem divulgados em folhas e telas cotidianas, os alimentos produzidos organicamente não são caros porque caros são seus insumos.
Pelo contrário, caros são os organismos geneticamente modificados – com o pagamento de pesados royalties para a indústria – os fertilizantes químicos – 70% no Brasil importados de semioligopólios – e os agrotóxicos – dominados por seis conglomerados transnacionais.
Trata-se, porém, de uma produção ainda de baixos níveis de produtividade, pequena escala e alvos comerciais em pequenos nichos de mercado. Isto os faz menos acessíveis.
Até aqui, a agricultura orgânica tem crescido atendendo os mercados externos, sobretudo, EUA e Europa, regiões de maiores poder aquisitivo e consciência de consumo saudável.
Com a crise, suas demandas que cresciam à base de 10% ao ano, caíram para 3 a 4%, vistas como consumo supérfluo, o primeiro, pois, a ser cortado.
No ano passado, o Brasil exportou 130 milhões de dólares. Valor ínfimo perto do que exporta o agronegócio. Em 2013, dificilmente repetirá a marca.
Como vários outros setores exportadores, afetado por redução de encomendas e câmbio, o setor de orgânicos voltou-se para o mercado interno. Está descobrindo que ele quase inexiste. Quando olha no espelho não enxerga mais do que feirinhas para descolados, bancas de frutas e verduras em shopping center de elite, lojas alternativas, e ilusão de um grande potencial.
Apenas com a produção orgânica, e isto pode doer, seria impossível alimentar o mundo.
Então estamos definitivamente condenados a perder a saúde e a devastar o meio ambiente para produzir alimentos?
Esse é um caso que entre o zero e o dez, o medíocre seis e meio pode ser uma ótima alternativa.
Basta amenizar os estragos. Voltarei ao assunto.
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